quarta-feira, 4 de junho de 2014

As lições do Rei de Espanha, por SAR, O Senhor D. Duarte de Bragança


duartepio

Recordo o papel do Rei no regresso a Espanha de Santiago Carrilho, um gesto fundamental para a reconciliação e a ultrapassagem dos traumas da guerra civil.

A abdicação do Rei de Espanha foi muito mais comentada na imprensa mundial do que as recentes abdicações do Rei da Bélgica e da Rainha da Holanda, o que é compreensível. Mas os comentadores insistiram muito mais nos seus problemas familiares e pessoais em vez de realçar o que ele conseguiu para Espanha. E isso é o que deveria importar: é para servir a sua Pátria que serve um Rei.

Obviamente que seria melhor que todos os Chefes de Estado, e especialmente os Reis, dessem só bons exemplos para os seus compatriotas, mas são humanos e como tal também têm pecados…
Um dos pontos altos do reinado foi a transição da chamada “ditadura franquista” para a actual democracia, que correu pacificamente, sem perturbações económicas ou sociais importantes, exceptuando o conhecido golpe militar no Parlamento, que falhou graças à intervenção do Rei.
A mesma transição na República Portuguesa começou com canções e muita fraternidade em Abril de 1974, mas rapidamente degenerou no caos político e na paralisia da nossa economia, que sofreu um atraso de vários anos. Nas então Províncias Ultramarinas, a incompetência de alguns e os interesses ideológicos e políticos contraditórios de outros, provocaram o êxodo de mais de um milhão de pessoas e guerras de muitos anos com inúmeras vítimas. Tudo isso poderia ter sido evitado com uma transição “à espanhola”. Seria de esperar que os portugueses percebessem estes factos e que soubessem assumir os erros.
Graças ao Rei D. João Carlos, foi possível ao antigo presidente do Partido Comunista, Santiago Carrillo, regressar a Espanha, apesar de ele ter sido responsável pelo fuzilamento de inúmeros prisioneiros políticos. A Espanha conseguiu nessa altura resolver finalmente os traumas da Guerra Civil, deixados pela experiência de uma época em que ambos os lados cometeram barbaridades. Não podemos esquecer que no começo da república espanhola muitos sacerdotes e freiras foram assassinados, centenas de igrejas incendiadas e, por outro lado, após a derrota dos republicanos, muitos dos ex-combatentes vencidos foram fuzilados. Feridas tão profundas na memória de um Povo são muito difíceis de ultrapassar.
Em cada época histórica os reis representaram os seus valores mais importantes. Reis guerreiros na Idade Média, reis promotores das ciências e das artes na  Renascença, etc. E qual é aparentemente o valor mais importante no Ocidente hoje? É a Democracia. Os reis actuais são grandes defensores da Democracia – podemos dizer, como disseram políticos suecos e holandeses, que “são os melhores defensores da República “. Mesmo os príncipes contraem casamentos muito democráticos, com vantagens e, por vezes, com alguns inconvenientes…
Outro notável serviço prestado pelo Rei a Espanha foi a aproximação com os países da América Latina, onde se tornou muito popular. Passou-se o mesmo com o mundo árabe. Nos Estados Unidos é, provavelmente, o Chefe de Estado estrangeiro mais popular. O mérito é dele, mas sem o prestígio da Monarquia, nem ele nem ninguém teria conseguido realizar essa obra.
Desejo ao Príncipe Felipe o maior sucesso nesta difícil missão que o aguarda e que, com a Graça de Deus (que será pedida no seu coroamento), consiga contribuir para a felicidade de todos os espanhóis.
Fonte: Observador

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