Comecemos por dizer que não estamos contra que se comemore o dia; cada um que o festeje à sua vontade.
Aliás, todos os dias são dias de comemorar qualquer coisa. Já nem chegam os dias para tanta evocação, vamos ter de passar a utilizar também as noites…
A única comemoração (creio) para a qual ainda se não se dedicou um dia (quem será que “decreta” estes dias?) é o Homem. Sobretudo se for branco, cristão e hétero…
O que entendemos é que não se deve comemorar a data como feriado nacional.
Impõe-se uma pequena incursão histórica.
Em 1864 é criada a primeira Associação Internacional dos trabalhadores, em Londres, a que se chamou, mais tarde, a “Primeira Internacional Socialista”. As divisões ideológicas determinaram a sua extinção ao fim de sete anos. Uma das suas principais reivindicações era a de a jornada diária de trabalho passar a ser de 10 horas.
As reivindicações desta “primeira internacional” repercutiram-se no IV Congresso da “American Federation of Labour”, em 1884. Mas todas as negociações havidas com as entidades patronais lançaram a revolta nos principais núcleos industriais do país.
Tal estado de espírito levou a que a 1 de Maio de 1886, fosse convocada uma greve geral, que teve a adesão de entre 350.000 a um milhão de pessoas (os autores dividem-se).
Porquê a um de Maio? Pois porque era a data em que a maioria das empresas iniciava o seu “ano financeiro” e se dava início ou término aos contratos de trabalho.
A repressão a esta greve foi violenta e especialmente dura na cidade de Chicago. Nesta cidade, ao quarto dia de manifestações, explodiu uma bomba e as refregas subsequentes causaram a morte de vários manifestantes e polícias. Deste incidente resultou a prisão de oito líderes do movimento grevista. Quatro deles foram enforcados e os restantes quatro condenados a prisão perpétua (um deles suicidou-se).
A luta não parou e pressões oriundas de vários sectores levaram à constituição de um novo júri, em 1888, que determinou a anulação do anterior julgamento, ordenando a absolvição dos réus e a libertação dos três que estavam presos. Reconheceu-se ainda, que a bomba tinha sido colocada pela própria polícia!
Em 1890 o Congresso Americano votou a lei que estabeleceu que a jornada diária de trabalho passaria a ter oito horas.
Todos estes eventos tiveram repercussão na Europa, com a “Segunda Internacional Socialista, criada em Paris, em 14 de Julho de 1889, por insistência de Frederic Engels, a proclamar o 1º de Maio, o Dia do Trabalhador, em memória dos que morreram em Chicago.
Só a 23 de Abril de 1919, o Senado Francês ratificou a jornada de oito horas e proclamou o 1º de Maio, feriado naquele ano.
Em 1920, a então União Soviética, adoptou a data como feriado nacional sendo seguida por alguns países.
Os EUA nunca reconheceram o 1º de Maio como dia do trabalhador e comemoram o “Dia do Trabalho” (Labour Day) a 3 de Setembro, data relacionada com o período das colheitas e o fim do Verão (e, já agora, para evitar associar a festa do trabalho a qualquer movimento socialista). O mesmo é válido para o Canadá, tomando aí a designação do “Dia das Oito Horas”.
Com isto dito vejamos porque não nos parece fazer sentido ter uma data destas como feriado nacional, em Portugal. E a primeira é já esta: é que a data de nacional não tem nada e não tem qualquer ligação ao nosso país. É, aliás, uma data e um evento de cariz internacionalista. Um internacionalismo de cariz ideológico, socialista, anarquista e comunista.
Em Portugal a decisão da Comuna de Paris em tornar o 1º de Maio feriado teve alguma repercussão, fomentando a luta operária por melhores condições de vida. Estão contabilizadas 559 greves entre 1852 e 1910 (entre 9 a 10 greves por ano, em média), sem que houvesse propriamente o que hoje se apelida de sindicatos. O cúmulo destas reivindicações pode considerar-se a manifestação que juntou em Lisboa cerca de 40.000 pessoas, no dia 1 de Maio de 1900. Sem embargo o número de aderentes às “novas ideias” sempre foi diminuto, até porque a industrialização era incipiente (Portugal falhou grandemente as duas primeiras “revoluções industriais, pois andou “entretido” em guerras civis…).
A I República nunca deixou comemorar o 1º de Maio (e até reprimiu violentamente as greves) o que se prolongou pela Ditadura Militar até que, em 1933, se deu uma espécie de nacionalização dos Grémios, Casas do Povo e dos Pescadores e Sindicatos, dentro da organização Corporativa instituída e, tanto a greve como o “lockout”, foram proibidos, sendo os problemas laborais resolvidos através de concertação (aliás, como deve ser, sendo a greve passível de ser usada apenas em casos extremos).
Ou seja a Comemoração do “Dia do trabalhador” não tem qualquer tradição em Portugal nem faz parte da matriz cultural dos Portugueses.
A implantação do feriado do 1º de Maio só ocorreu após o Decreto – Lei 175/74 de 27 de Abril, da Junta de Salvação Nacional, apenas dois dias após o golpe de estado então ocorrido. O que não deixa de ser revelador.
Como revelador é – a vários títulos – que em 1975, através do Dec. Lei nº 210-A/75, de 18 de Abril, se tenha renomeado o feriado de 25/4 como “Dia de Portugal”; ora o Dia de Portugal era assinalado a 10 de Junho, e só voltou a sê-lo três anos depois, em 1977, entretanto rebaptizado de “Dia de Camões e Dia das Comunidades. Só em 1978, o 25/4, foi renomeado “Dia da Liberdade” e o 10/6 passou a “Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas”. E as Forças Armadas Portuguesas só passaram a participar nestas comemorações, novamente, no primeiro mandato de Cavaco Silva como PR, em 2006…
Convém não esquecer estas coisas e os seus responsáveis.
A actual Constituição da República (CR), que inicialmente nos impunha um caminho para a “utopia” do Socialismo (na prática a arte de retirar a quem trabalha para dar a quem não quer fazer nada…) - e que agora apenas é referido no seu “preâmbulo” – tem consignado um enquadramento legal dos “direitos dos trabalhadores” (que agora passaram a designar-se, socialmente, por “colaboradores”…) completamente desajustado relativamente a outras entidades e aos deveres correlativos. Para já não falar na deficiente separação entre a liberdade intrínseca dos sindicatos relativamente à Política e às correias de transmissão dos Partidos e a facilidade como podem usar a greve para luta política e paralisação de sectores do país e prejudicar as populações. Para além de incentivar a greve e proibir o “lockout”.
Podemos assim verificar que à semelhança de muitos outras realidades da evolução da Humanidade, as relações de trabalho foram fazendo o seu caminho, com recuos e avanços, lágrimas e alegrias. Não é por isso, por exemplo, que o fim da escravatura, ou a invenção da máquina a vapor, têm um feriado.
A comemoração do dia do trabalhador nasceu no seio de uma sociedade capitalista algo selvagem, mas que rapidamente se tornou numa comemoração de carácter marxista, anarquista e comunista. Não representa a totalidade da população trabalhadora. É ideológica. Além disso é veículo e faz apelo, à “guerra de classes” divisora da sociedade e originadora de ódios e conflitos permanentes.
O Trabalho contribui (e tem de contribuir) para a Economia, as Finanças e a vida social como um todo. Ora não se pode ter empresas a funcionar sem o trabalho e o capital. Temos que gerar harmonia, não dissensão. O que diz respeito a todos e não apenas a alguns.
O próprio termo “trabalhadores” é enganador, pois não seremos todos nós trabalhadores? Há uns que trabalham e outros não? Um banqueiro não trabalha?
Os únicos que em boa verdade não podem ser englobados no termo são os militares e os religiosos, pois prestam “serviço”. À Pátria, uns, a Deus, os outros. Um modo superlativo de “trabalho” e por isso tratado de modo diferente. Realidade que tem sido subvertida e destruída, mas isso é outra história (ou talvez não…).
Há patrões que tentam explorar os trabalhadores? Há, e não são poucos; em vez de “empresários” comportam-se como “donos”? Também; e muitas outras atitudes negativas existem. O mesmo acontecendo do lado dos colaboradores, perdão, trabalhadores: quantos são calaceiros, metem baixas fraudulentas, exorbitam, são enganadores? Pois é, mas tudo isso tem a ver com a natureza humana e com o Bem e o Mal. É outro campeonato.
Fazer do 1º de Maio feriado apresenta também duas aparentes contradições: se somos todos trabalhadores não faz muito sentido que nos estejamos a evocar e a comemorar a nós próprios; além disso não é muito curial que estejamos a exaltar quem devia estar a trabalhar, não fazendo nada. Para isso a Divina Providência já tinha decretado os domingos…
Aquilo que devia preocupar os promotores do 1º de Maio (enfim de todos) seria então a promoção de boas práticas de gestão e liderança; de como melhorar os meios de produção; promover as boas práticas profissionais; assegurar o cumprimento de normas deontológicas; organização e disciplina na Segurança e Higiene nas condições em que o trabalho é realizado; procurar que os impostos incidam no consumo e não no trabalho; estudar formas harmoniosas de participação na gestão e dividendos das empresas; impôr regras apertadas no funcionamento dos bancos e bolsas e proibir os paraísos fiscais, etc.
Mas isto não parece estar na preocupação de ninguém: apenas sobram a luta por ideologias estéreis e viciosas e a ganância …
A verdadeira essência da coisa tem a ver com um equívoco de base, que é considerar o Trabalho como um Direito (o que também está plasmado na nossa CR); ora o trabalho é sobretudo um Dever, como tão bem o caracterizou o Professor Salazar, que era um profundo conhecedor e “filósofo”, das coisas dos homens e da vida.
Pela simples razão que o trabalho é tão fulcral à vida que sem ele esta não poderia existir.
Por isso faz algum sentido comemorar o “dia do Trabalho”, mas nunca o dia do trabalhador.
Neste âmbito bom seria olhar para a Doutrina Social da Igreja, cuja notável encíclica “Rerum Novarum”, de 1 de Maio de 1891, do Papa Leão XIII, constitui a pedra basilar. E no dia 1º de Maio lembrar S. José, operário, santo padroeiro dos trabalhadores.
Mas como fazê-lo devidamente se nunca ninguém até hoje, se lembrou de montar um altar, junto á Fonte Luminosa?
João José Brandão Ferreira, Oficial Piloto Aviador
Fonte: O Adamastor
Sem comentários:
Enviar um comentário