quarta-feira, 31 de julho de 2019

Família Real Portuguesa presente na Tourada Real em Salvaterra de Magos


A Praça de Touros de Salvaterra de Magos recebeu esta sexta-feira, 26 de Julho, uma recriação da Tourada Real, na qual marcou presença SAR, O Senhor Dom Duarte Pio, Chefe da Casa Real Portuguesa.
Em praça os cavaleiros Ana Batista e Francisco Palha e o rejoneador luso-espanhol Diego Ventura. Frente a touros da ganadaria Alves Inácio, actuaram ainda os Forcados Amadores de Vila Franca de Xira e Alcochete.
Antes da corrida, Dom Duarte Pio, Dona Isabel de Bragança, Infante Dom Afonso, Infanta Dona Maria Francisca e Infante Dom Dinis desceram a arena para cumprimentar todos os intervenientes do espectáculo.
Fonte: infocul

segunda-feira, 29 de julho de 2019

Pinharanda Gomes (1939-2019): um sábio português

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Faleceu  Jesué Pinharanda Gomes, um dos mais notáveis homens de cultura e pensamento da segunda metade do século XX. É evidente que a imprensa dita oficial não se dignará a fazer o mais pequeno apontamento necrológico, não só porque ignora a sua existência e a obra imensa que legou, mas também porque Pinharanda Gomes foi sempre um homem livre.

Autodidacta, trabalhou até à reforma como vendedor de maquinaria agrícola, mantendo sempre prudente distância face à jactante e quase sempre submissa universidade. Pinharanda Gomes era gente. Não foi um intelectual orgânico, não genuflectiu nem fez parte dessa sub-casta que prostituiu a Universidade, ao ponto de termos chegado ao nadir de um tempo em que doutores mal sabem assinar o nome ou agarrar numa caneta.

Já nos havia surpreendido Pinharanda Gomes pela Patrologia Lusitana, pelos Conimbricenses e Filosofia Hebraico-Portuguesa, copiosas fontes de informação e interpretação.Em homenagem ao estudioso, mas a mais notável obras foi certamente a Filosofia Arábigo-Portuguesa, talvez o único trabalho de vulto existente no nosso idioma destinado a facultar informação de base sobre o impacto da civilização árabe no Ocidente peninsular.

MCB

domingo, 28 de julho de 2019

SAR, O Senhor Dom Duarte Pio: “Amália conseguiu fazer essa ponte entre as duas culturas e hoje o fado é considerado tanto da cultura popular como da cultura erudita”


SAR, O Senhor Dom Duarte Pio marcou presença na apresentação da programação das celebrações do centenário de Amália Rodrigues e no final falou com o Infocul sobre a importância da fadista na cultura portuguesa.
O Chefe da Casa Real Portuguesa disse queé certamente a personalidade portuguesa da nossa época mais conhecida em todo o mundo e passa à frente de outras personalidades também muito conhecidas… mas no campo do futebol.
Confidenciou ainda que os meus pais eram muito amigos, davam-se muito bem e a última vez que a vi foi quando fizemos a sua coroação como rainha do fado, em Ourém, numa cerimónia muito interessante. Então ao visitar o castelo estava a apanhar muito sol na cabeça e eu emprestei-lhe o meu panamá, daqueles panamás autênticos e ela disse, “ah eu gostei muito do seu chapéu, vou ficar como recordação” e de modo que está aqui no museu, disse, sorrindo.
Explicou que em Portugal a cultura divide-se basicamente em dois grandes sectores, a cultura popular e a cultura erudita. Os partidários da cultura erudita têm um certo desprezo pela cultura popular e os partidários da cultura popular consideram os da cultura erudita uns chatos e que não tem interesse. A Amália conseguiu fazer essa ponte entre as duas culturas e hoje o fado é considerado tanto da cultura popular como da cultura erudita, e claro que há pessoas que cantam muito bem e outras que cantam muito mal, e às vezes já tenho apanhado com cada susto nas casas de fado, com pessoas que efectivamente não têm voz e que insistem em cantar e acho que devia haver uma certa autocrítica.
Fonte: infocul

sábado, 27 de julho de 2019

OS FOGOS …


“Tanto é ladrão o que rouba a vinha, como o que fica a ver”
Provérbio popular

Vou escrever o artigo mais curto da minha lavra, até hoje. Podia até ser apenas isto: o que se escreve a 90% sobre os fogos em Portugal são apenas lucubrações mentais mentirosas e, ou, acessórias.

Mas tenho que acrescentar algo mais.
          
O país continua a arder – nomeadamente nos locais onde já ardeu – e assim continuará, enquanto não se puser o dedo nas razões porque arde. Ora estas podem-se resumir a duas causas principais: naturais (diria menos de 1%) e humanas (as restantes). Esta última (causas humanas) pode ainda subdividir-se em três, a saber: por desleixo/imprevidência; por acção de tarados e “doentinhos”, que sentem prazer patológico em ver arder, e por intenção dolosa, isto é, criminosa.

Não sei, nem é possível saber em concreto, a percentagem de umas e outras.

Sei apenas – como qualquer cidadão mesmo sem escolaridade obrigatória – que para haver fogo são precisas três coisas em simultâneo: combustível, comburente e uma ignição.

Em simultâneo.

Isto é o fogo não nasce por geração espontânea.

Neste momento percorrem as pantalhas da televisão imagens de artefactos supostamente usados na deflagração propositada de incêndios. São numerosas as vezes que tal já ocorreu.

Há dezenas de pessoas presas todos os anos, que depois não se sabe o que lhes acontece sendo que a maioria é posta em liberdade sem mais aquelas.

Ora não se resolverá jamais o problema desta desgraça dos fogos florestais que, lembra-se, não tem paralelo em qualquer outro país, senão se fizer duas de duas coisas, a saber: castigar a sério os autores de fogos por descuido ou irresponsabilidade e, “enforcar in situ”, aqueles apanhados em flagrante delito, o que seria acompanhado de investigação da possível “mão que os arma” o que está seguramente ligado a vários “negócios” que de algum modo possam prosperar, directa ou indirectamente, com os fogos.

Enquanto não houver coragem para se fazer isto a tragédia continuará. Esta tragédia deve ser encarada como um problema de Segurança Nacional e os criminosos equiparados a terroristas.

Mas não, ainda não vai ser desta.

Quando a coisa amainar os adiantados mentais de serviço, lá vão voltar às velhas desculpas, a saber: as alterações climáticas; as populações que não limpam os terrenos à volta das casas; o reordenamento da floresta, a prevenção, blá, blá, blá…

A que se segue a conclusão costumeira de que se vai envidar esforços (para o ano) na prevenção e no reforço de meios.

Sem nunca se atacar o essencial. [1]

Até quando é que vamos todos andar a fazer de estúpidos e a aturar este estado de coisas?


João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador (Ref.)



[1] Lembram-se por acaso de uma reportagem passada num canal de televisão onde se descreveu e mostraram imagens assaz importantes de como se organizou a destruição do Pinhal de Leiria há dois anos atrás? Aconteceu alguma coisa?


Fonte: O Adamastor

sexta-feira, 26 de julho de 2019

Origem dos Guardas Florestais


Foi nos bons tempos da Monarquia Portuguesa que surgiram os elementos dedicados à conservação do Pinhal do Rei e das florestas portuguesas. Inicialmente, tratavam-se de simples couteiros que com o passar do tempo viram as suas funções ampliadas, atingindo, em 1605, o número de 24.

Mas foi no reinado do bom Rei João VI de Portugal, cognominado ‘O Clemente’, que efectivamente foi criada a carreira de guarda-florestal, integrada no quadro da Administração Geral das Matas, e foi em 1856, no reinado do Bem-Amado e pragmático El-Rei Dom Pedro V, que começaram a usar o uniforme específico que duraria até 1905, data da sua substituição por novo fardamento.

De entre as funções dos guardas-florestais destacavam-se: evitar incêndios criminosos, deter pirómanos, observar as florestas para evitar incêndios ou a sua progressão, zelar pela não realização de queimadas, fiscalização do abate autorizado e da madeira que saía da mata, medições de lenhas e madeiras, assim como proceder a sementeiras das espécies arvoráceas, arbustivas, herbáceas e graminosas autóctones, limpezas, autos de marca e, tal-qualmente, algum trabalho administrativo.
Foram extintos, durante a república, pelo Decreto-Lei 22/2006 de 22 de Fevereiro!
Fotografia: Guarda do Piquete de Fogos do Corpo da Guarda-Florestal, 1905
Miguel Villas-Boas

quinta-feira, 25 de julho de 2019

SAR, O Senhor Dom Duarte Pio: “A meia dúzia de pessoas que são contra as touradas, também são contra a família, são contra a cultura portuguesa(…)”


Aparte da apresentação das comemorações do centenário de Amália Rodrigues, Dom Duarte Pio falou ao Infocul sobre a polémica cada vez mais acentuada para com a tauromaquia, uma tradição secular que provém dos tempos da monarquia.
Para Dom Duarte Pio, há por um lado um certo desprezo para com a cultura tauromáquica e esse desprezo manifesta-se de várias maneiras. A meia dúzia de pessoas que são contra as touradas, também são contra a família, são contra a cultura portuguesa, são contra o facto de haver uma tradição em Portugal. Claro que há pessoas, que eu compreendo, que por motivos afectivos, sentimentais, ficam chocados com alguns aspectos da tourada, compreendo e respeito esses sentimentos. Por outro lado há outros aspectos também muito chocantes, como a criação de galinhas em cativeiro, criação de porcos para a abate… Se formos a ver há imensos aspectos da nossa vida que são um bocado chocantes, dentro desses a tourada talvez é a menos chocante, porque é aquela onde se trata o animal com alguma dignidade”.
O Chefe da Casa Real Portuguesa confidenciou-nos ainda que marcará presença na Tourada Real a 26 de Julho em Salvaterra de Magos.
A corrida organizada por Rafael Vilhais Empresa conta com Ana Batista, Diego Ventura e Francisco Palha frente a touros Alves Inácio, que serão pegados pelos forcados amadores de Vila Franca de Xira e Alcochete.
Fonte: infocul.pt

quarta-feira, 24 de julho de 2019

Um Rei Não Toma Partido


A Monarquia não é uma ideologia, os partidos são ideológicos!
O Rei não toma partido, não é de nenhum partido! ‘Partido é uma parte, sê inteiro’, escreveu Agostinho da Silva; ora inteiro só um Rei, pois um monarca não tem partido nem toma partido, pois é supra-partidário. Assim, o único partido do Rei é o interesse nacional. O Rei é português por inteiro.
Por muito marcante que, por vezes, possam ser a personalidade e carácter de um presidente, existe uma falha original na chefatura de estado republicana, que melhor não podia ser descrita do que como fez Ramalho Ortigão:
‘Um Rei é Presidente de todos os cidadãos. Um Presidente é apenas o Rei dos seus correligionários’.
Assim só um Rei será o “defensor do equilíbrio da Nação”, como foi estatuído nas Cortes de 1211.

Miguel Villas-Boas

terça-feira, 23 de julho de 2019

Vincent Lambert e as 5 mentiras da eutanásia

A eutanásia é uma licença para matar os que desejam morrer e os que não podem manifestar a sua vontade: é uma prepotência de um Estado totalitário.

Vincent Lambert (VL) morreu no passado dia 11 de Julho, depois de nove dias de agonia. Morreu?! Não, foi morto à fome e à sede.

É eticamente reprovável a distanásia, ou encarniçamento terapêutico, que é a acção de prolongar artificialmente, com tratamentos extraordinários – a alimentação e a hidratação nunca o são – e inúteis, uma vida humana que chegou ao seu termo natural. Mas pior é a eutanásia, que consiste em provocar, consciente e voluntariamente, a morte de um ser humano inocente. VL não é alguém que, simplesmente, morreu, mas uma pessoa que foi morta, em cumprimento de uma ordem judicial de um Estado europeu, com a cumplicidade dos médicos que lhe causaram a morte. A eutanásia não é, portanto, a acção pela qual se põe termo ao sofrimento de um doente terminal: é a eliminação de uma vida humana inocente.
A eutanásia, seja realizada por razões racistas e eugenistas, como na Alemanha nazi, ou por outras razões, é sempre um crime.  Há delitos que se cometem por acção, como matar alguém com um tiro; ou por omissão, como deixar alguém morrer à fome. Matar com um disparo, ou uma bomba, é brutal, mas condenar uma pessoa a morrer esfomeado e desidratado é ainda pior, na medida em que significa uma mais lenta e dolorosa agonia. Este foi, de facto, o triste fim de VL. Mas a sua morte não foi em vão, porque pôs a nu cinco grandes mentiras sobre a suposta ‘bondade’ da eutanásia.
Primeira mentira: a eutanásia e o suicídio assistido são legítimos porque queridos pelo próprio. Nem o Estado, nem nenhuma religião ou instituição deve interferir com um direito que só ao próprio corresponde.
VL nunca quis, ou pediu, a morte. Não se trata, portanto, de dar relevância jurídica à vontade do próprio, quando desiste de viver, mas de dar ao Estado, nomeadamente aos tribunais e aos médicos, uma licença para matar seres humanos inocentes.
É verdade que VL já não estava em condições de manifestar-se a favor ou contra a sua vida e, por isso, foi preciso recorrer ao parecer dos seus familiares mais próximos. Enquanto a sua mulher, cinco dos seus irmãos e um sobrinho se manifestaram favoráveis à sua morte, tanto os seus pais como uma irmã defenderam, até ao fim, a sua vida. Aqueles que pretendiam que VL fosse morto, à falta de melhor argumento, invocaram o que disseram ser a suposta vontade do próprio que, segundo eles, “não quereria continuar a viver naquelas condições”.
É espantoso e aterrador que um tribunal possa decidir a vida ou morte de um ser humano inocente! É como se alguém, tendo em conta as duríssimas condições em que vivem os sem abrigo, ou os toxicodependentes, obtivesse um mandato judicial que lhe permitisse legalmente exterminá-los, como agora aconteceu em França, um país que foi cristão e o berço das declarações universais dos direitos do homem.
Portanto, não é verdade que a eutanásia se pratica em nome da vontade individual: é uma licença para matar, não apenas os que desejam morrer, mas também os que não podem manifestar a sua vontade. É uma prepotência de um Estado totalitário.
Segunda mentira: a vida vegetativa já não é vida humana e, por isso, eliminar uma pessoa nessas condições, não pode ser equiparado a um homicídio.
É certamente discutível, em termos médicos, o conceito de vida vegetativa. Um ser humano, mesmo que inconsciente, nunca está reduzido à vida vegetativa: não faltam casos de pessoas que, depois de um prolongado e profundo coma, acordaram para a vida consciente, sem perda da sua identidade e memória. Ora, se tais faculdades puderam ressurgir, é porque de algum modo se mantiveram latentes, o que necessariamente quer dizer que, nem sequer nesse período de aparente inactividade intelectual, a vida do ser humano esteve reduzida às funções vegetativas do seu organismo.
Como aqui muito bem explicou o médico João Duarte Bleck, no caso de VL, “trata-se de uma situação indubitavelmente dramática, de alguém que está indiscutivelmente VIVO, alternando períodos em que pode estar neurologicamente a dormir ou acordado, mas, como referi, gravemente afectado na sua capacidade cognitiva e de consciência, e também de comunicação. Mas, estando indiscutivelmente VIVO e não morto, nem em coma propriamente dito, nem agónico às portas da morte”.
Terceira mentira: a eutanásia não pode ser equiparada ao homicídio, porque aquele procedimento não pretende matar ninguém, mas apenas retirar-lhe os meios extraordinários de que necessita para viver.
É mais uma falsidade, que pretende branquear o carácter criminoso do acto que provoca a morte de um ser humano inocente. Com efeito, no caso de VL, foi preciso mesmo matá-lo, à fome e à sede.
Não obstante a gravidade do seu estado, que não pode nem deve ser subestimada, VL mantinha o regular e natural funcionamento dos seus órgãos vitais, como aqui também explicou José Miguel Pinto dos Santos: “Lambert não estava a receber tratamento médico nem era regularmente medicado. Não necessitava de nenhum equipamento que apoiasse o regular funcionamento pulmonar, cardíaco, de rins, fígado ou outro.” Foi por este motivo que, para pôr termo à vida de VL, não foi suficiente ‘desligar a máquina’, mas matá-lo, como efectivamente aconteceu.
Mesmo quando administrada de forma artificial, a alimentação nunca pode ser entendida como um meio extraordinário, nem como um tratamento clínico. Como muito bem disse o Dr. João Duarte Bleck, qualquer paciente, qualquer que seja o seu estado, “mantém o direito elementar e absolutamente fundamental que lhe advém da necessidade básica da alimentação, incluindo as necessidades de água. Este direito elementar mantém-se, mesmo que a administração da alimentação e da água dependa de meios artificiais, como, por exemplo, a introdução directa no estômago, através de sondas especiais; ou directamente na corrente sanguínea, através de dispositivos – hoje comuns – que as debitam lentamente ao longo do dia.”
Escreveu ainda o citado médico: “Tratando-se de um direito/necessidade básico de qualquer ser vivo – e, por maioria de razão de qualquer ser humano, independentemente do seu desenvolvimento ou estado de saúde – o meio ou modo de o fazer são irrelevantes e não devem ser considerados desproporcionados e muito menos configuram aquilo a que se chama encarniçamento terapêutico. A alimentação em si mesma não é, normalmente e como é razoável pensar, uma terapia ou tratamento; é, insisto, uma necessidade natural básica, fundamental e elementar de qualquer ser humano”.
Portanto, como concluiu o Prof. Pinto dos Santos, “a morte de VL não foi devida à remoção de nenhum cuidado médico intrusivo ou não intrusivo, desnecessário, desproporcional ou suscetível de causar sofrimento adicional. A morte de VL deveu-se a lhe ter sido retirada a alimentação e hidratação. Embora pudesse vir a morrer à fome, não foi isso que lhe aconteceu: VL morreu à sede à medida que vários órgãos foram colapsando por falta de fluídos, mais concretamente por uma insuficiência cardíaca causada por um mau funcionamento renal.”
Quarta mentira: pelo suicídio assistido e pela eutanásia consegue-se, pelo menos, pôr termo ao sofrimento, por vezes insuportável, do doente terminal.
Sim, é verdade que uma pessoa, que é morta, deixa de sofrer no seu corpo. Mas seria criminoso pensar que a melhor cura é a eliminação do paciente, ou que a morte a que foi condenado VL, embora inocente, foi uma ‘boa morte’, como a etimologia de eutanásia leva a crer. Muito pelo contrário, foi uma morte horrível.
Nem sequer a equipa médica, que matou VL à sede, acreditava no carácter indolor da sua morte. Porquê? Porque entendeu que o devia sedar, reduzindo ao mínimo a sua reacção à dor causada pela continuada privação de comida e de bebida. De facto, se essa fosse, como se pretendeu, uma ‘boa morte’, sem sofrimento, com certeza que não seria necessária a sedação e, portanto, se foi sedado é porque os próprios médicos sabiam que era real e cruel o sofrimento que lhe provocaram, para lhe causar a morte.
É impressionante o testemunho de um familiar, insuspeito porque favorável à eutanásia, que assistiu à sua agonia. François Lambert, sobrinho do falecido e defensor da eutanásia do tio, declarou publicamente que VL tinha sido sujeito a um “procedimento sádico”. Como dizia o saudoso Prof. Daniel Serrão, “a morte por compaixão é a morte da compaixão”.
Quinta mentira: a eutanásia e o suicídio assistido garantem uma morte digna aos doentes em fim de vida.
É curiosa esta noção hedonista de dignidade, como se fosse mais digno morrer sem dor e o sofrimento fosse incompatível com a dignidade humana. Outro é, contudo, o entendimento ético e religioso, pois sempre exaltou o sacrifício dos heróis e o martírio dos santos. Morre indignamente quem indignamente vive – como Lenin, Stalin, Mao, etc. – mesmo que, depois da morte, lhe sejam tributadas todas as honras; morre dignamente quem vive, até ao último momento, com dignidade, mesmo que seja na maior miséria e humilhação, como os mártires do holocausto nazi, Maximiano Kolbe e Edith Stein, cujos cadáveres jazem nalguma vala comum. A morte mais digna de que há memória é a de Jesus Cristo porque, sendo inocente, ofereceu-se para morrer na Cruz, entre dois ladrões, por amor. Foi também, decerto, das mortes mais dolorosas, o que não só não diminuiu como aumentou a sua dignidade e valor, porque o que muito custa, muito vale.
Em relação a VL, não houve a compaixão de o matar com um só tiro, que não em vão se chama de misericórdia, ou com uma injecção letal, como se faz com os condenados à pena capital nos Estados Unidos da América. Um touro, numa corrida de morte, quando morre de uma só estocada, é morto com mais respeito e menos sofrimento; e um serial killer,condenado à morte, é executado com mais dignidade e menos dor.
A eutanásia é, sempre, uma morte indigna, como indigno é o suicídio de quem, por cobardia, deserta, consciente e voluntariamente, do combate da vida. Não deve faltar caridade e compreensão para quem desiste de viver, mesmo que seja por via do suicídio ou da eutanásia. Mas não há nenhuma dignidade em pôr termo à vida, ou em ser cúmplice do próprio assassinato. Não só é uma ofensa à humanidade, como ao próprio Criador porque, como dizia S. Ireneu de Lyon, a glória de Deus é o homem vivo.
Fonte: Observador

segunda-feira, 22 de julho de 2019

Municipalismo Na Monarquia


Foi com El-Rei Dom Afonso III de Portugal, nas Cortes de Leiria de 1254, que as liberdades municipais passaram a ser uma regra essencial de governação, pois a representação nacional foi alargada aos Municípios. O papel democrático dos municípios tornava-o em real representante de toda a comunidade local diante do Rei que valorizava o apoio popular, tornando a Monarquia Portuguesa uma democracia orgânica, pois os conselhos municipais compostos por ‘vizinhos’ tinham capacidade política e um enorme conjunto de liberdades fundamentais, regalias e seguranças, normalmente consignadas em carta de Foral – que elencava as matérias relativas à liberdade das pessoas, ao direito de asilo, à defesa dos direitos em juízo, à tributação, à inviolabilidade do domicílio – tudo isto em plena Idade Média.
Desta forma,  descentralizava-se o poder fazendo com que os munícipes tivessem voz através de representantes efectivos, livres, independentes e apartidários, cientes da necessidades do território, das suas virtualidades e das suas gentes, e que nominalmente eleito, podia ser responsabilizado directamente e destituído caso não cumprisse de forma digna e competente o mandato para o qual fora eleito.
A importância destes concelhos era tal que eram enviados representantes às cúrias, as Cortes, tendo assim participação na governação. Era pois, já nesses iniciais tempos Portugueses uma Monarquia democrática e igualmente popular na qual, por exemplo, a qualquer hora do dia ou da noite o Juiz do Povo se poderia apresentar no Paço à Presença do Rei e reclamar de injustiças ou peticionar graças – que diria hoje, Sua Excelência O Senhor Protocolo de Estado diante de igual cenário?! A democracia popular ficava à porta, certamente!
Miguel Villas-Boas

domingo, 21 de julho de 2019

Demagogos, mentirosos e inimigos da ciência

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Li há tempos uma obra que me passara despercebida e cuja capa acima reproduzimos. Le Terrorisme Intellectuel, de Jean Sévillia, é mais do que uma história da cultura francesa contemporânea e suas polémicas: trata-se de original abordagem aos mecanismos de fabricação de um certo tipo de verdade imposta sem debate, à mistura com intimidação, amálgama e sufocação do normal processo de discussão que, juntas, permitem a ciência.

Sévillia desmonta esta engrenagem nascida no imediato pós-guerra. Ao prestígio reclamado pelos comunistas - a tão propalada superioridade moral - foi-se edificando uma teia de lugares-comuns inquestionáveis, umas quantas crenças indiscutíveis, uns adornos pseudo-científicos que concorreram para que a percepção dos acontecimentos coroasse o discurso comunista.

Assim, os intelectuais impuseram até meados dos anos 50 um acrisolado culto por Estaline, tão intenso como cego ao ponto de inverter todos os dados de sensibilidade, rasurar todas as consabidas práticas do tirano e permitir fazer crer aos pacatos leitores de jornais que as causas da paz, da fraternidade entre os povos e da liberdade se encontravam para lá da Cortina de Ferro. Nessas piedosas patranhas acreditaram quase todos. O odioso ficou para os anti-comunistas, tidos como lacaios do americanismo "fascista", do imperialismo" e do belicismo.

Depois, assentaram armas contra o odioso "colonialismo". A esquerda francesa, incluindo o PCF, que sempre havia defendido o império colonial, receberam instruções do Kominform para desencadear a mais que questionável tese dos "ventos da História". Tratava-se, naturalmente, de abrir o campo à acção soviética e carrregar a má-consciência dos europeus, minando-lhes a capacidade de reagir e obrigando-os a reconhecer a inevitabilidade da descolonização. Sévillia desenvolve com particular argúcia esta questão, porquanto desmonta uma a uma as teses da sociologia e historiografia marxistas. Como os estudos mais recentes permitem demonstrar (vide Jacques Marseille, L' Empire Colonial et Capitalisme Français), as colónias jamais enriqueceram os colonizadores; antes pelo contrário, foram um peso acrescido e um freio ao crescimento económico metropolitano, um factor de conflitualidade entre as potências coloniais e um cadinho de problemas políticos internos em cada Estado colonizador.

Mas aos comunistas interessava diabolizar, imobilizar pelo remorso, desconjuntar as forças anímicas de políticos, militares e administradores coloniais. Quando partiam para a Indochina e a Argélia, os jovens franceses já não tinham ao seu lado e atrás de si o incentivo da nação. Não, partiam como vulgares criminosos e opressores dos povos colonizados. Era o tempo que em Ho Chi Mihn se reverenciava como um sábio confuciano, em que Ben Bella reproduzia os românticos guerrilheiros da literatura oitocentista e em que Lumumba, era exibido como "mártir".

Com a descolonização executada, a desonestidade voltou-se para outras empolgantes causas: o multi-culturalismo, o proibido proibir, o ecolo-regressismo, o fim do estado-nação, etc, etc.

Pese a expressão destas fortes correntes, verdade é que lhes falta, a todas, matéria académica credível. Estas opiniões, contudo, ganharam tamanha respeitabilidade que discuti-las acarreta o desprezo da auto-constituída "comunidade de razão", aquela que domina a "inteligência estúpida" do jornalismo, dos "fazedores de opinião" e demais pequenos intelectuais divulgadores.

MCB

sábado, 20 de julho de 2019

ESSENCIAL LER

Um senhor de 70 anos viajava de trem, tendo ao seu lado um jovem universitário, que lia o seu livro de ciências.

O senhor, por sua vez, lia um livro de capa preta. Foi quando o jovem percebeu que se tratava da Bíblia e estava aberta no livro de Marcos.

Sem muita cerimónia o jovem interrompeu a leitura do velho e perguntou:

O senhor ainda acredita neste livro cheio de fábulas e crendices?

Sim, mas não é um livro de crendices. É a Palavra de Deus. Estou errado?

Respondeu o jovem:
- Mas é claro que está! Creio que o senhor deveria estudar a História Universal. Veria que a Revolução Francesa, ocorrida há mais de 100 anos, mostrou a miopia da religião. Somente pessoas sem cultura ainda creem que Deus tenha criado o mundo em seis dias. O senhor deveria conhecer um pouco mais sobre o que os nossos cientistas pensam e dizem sobre tudo isso.

- É mesmo? Disse o senhor.

E o que pensam e dizem os nossos cientistas sobre a Bíblia?

- Bem, respondeu o universitário, como vou descer na próxima estação,
falta-me tempo agora, mas deixe o seu cartão que lhe enviarei o material pelo correio com a máxima urgência.

O velho então cuidadosamente abriu o bolso interno do paletó e deu o seu cartão ao universitário.
 
Quando o jovem leu o que estava escrito, saiu cabisbaixo sentindo-se a pior pessoa do mundo.

No cartão estava escrito:
Professor Doutor Louis Pasteur
Diretor Geral do Instituto de Pesquisas Científicas da Universidade Nacional
da França. 

E, um pouco mais abaixo da frase, estava escrito em letras gótica e negrito:

*"Um pouco de ciência nos afasta de Deus. Muita, nos aproxima".*
 
Fato verídico ocorrido em 1892, integrante da biografia de Louis Pasteur...

Fonte: O Adamastor

quarta-feira, 17 de julho de 2019

15 de Julho: Beatos Inácio de Azevedo e Companheiros


Português de nobre linhagem, Inácio de Azevedo entrou na Companhia de Jesus, na qual ocupou cargos importantes. As suas insignes virtudes atraíram-lhe as atenções do provincial S. Francisco de Borja, que o mandou ao Brasil como visitador geral. Dois anos depois voltava à Pátria, para daí a pouco voltar como superior de uma leva de missionários.

Atacado no alto mar por corsários franceses [huguenotes], foram imediatamente condenados à morte. O primeiro foi o superior, que se tinha ido colocar diante dos hereges ostentando uma imagem da Virgem que recebera das mãos do Papa S. Pio V. A sua mansidão era uma exprobração para a impiedade dos hereges. Trespassado por uma lança e degolado, entregou a alma a Deus. Do mesmo modo, 39 dos seus companheiros foram atormentados com atrozes suplícios, e os seus corpos lançados ao mar. Apenas foi poupado um irmão cozinheiro, de cujos serviços os piratas contavam utilizar-se. Mas o seu lugar foi logo tomado por um generoso adolescente, sobrinho do capitão do navio, que tinha solicitado a sua admissão na Companhia. As suas almas foram vistas subir ao Céu por Sta. Teresa de Ávila.

«Missal Romano Quotidiano», 1963


Fonte: Veritatis

terça-feira, 16 de julho de 2019

A CP e a Festa dos Tabuleiros

Já alguém fez contas a quanto as Finanças deixariam de arrecadar em impostos nos combustíveis se a maior parte dos portugueses deixasse o carro para andar encaixotada nos transportes públicos?

“O mundo conduz-se por mentiras.
Quem quiser despertá-lo ou conduzi-lo,
cuidará de mentir delirantemente.
Fá-lo-á com tanto mais êxito, quanto a si
próprio mais mentir e se compenetrar da
verdade da mentira que criou.”
Fernando Pessoa
Como é do conhecimento geral esta festa – uma das mais importantes, pelo que representa, no nosso país – leva à cidade de Tomar centenas de milhares de visitantes, sobretudo no seu dia mais importante: o da Procissão dos Tabuleiros.
Avisado das dificuldades em entrar e circular de carro na cidade decidi, amparado no desconto de 50% no preço do bilhete (isto da “terceira idade” também tem as suas vantagens…) ir de comboio.
Bilhete comprado com antecedência, pois a demora nas bilheteiras assim o aconselha, e resolvido o problema de estacionar o carro junto a S. Apolónia – tarefa nada fácil por não haver nenhum parque digno desse nome junto a tão vetusta estação – lá consegui entrar no comboio regional que me levaria a Tomar em duas horas.
Não sem um pequeno percalço.
A composição (das 07H45) teria umas seis ou sete carruagens, mas só consegui entrar na terceira da frente por o mecanismo (botão) que abria as portas se recusar a funcionar em todas as carruagens da retaguarda. Diga-se que também não se pode passar interiormente de uma para a outra carruagem.
O resultado disto foi que o comboio saiu com as carruagens disponíveis completamente cheias e com muita gente em pé.
As carruagens, cuja idade ignoro, têm um aspecto “idoso” e pouco cuidado com assentos muito desconfortáveis, onde qualquer conceito ergonómico está ausente.
Na primeira paragem – a estação do Oriente – o comboio foi invadido por uma turba de gente (com muitos turistas), resultando ficar tipo “sardinha em lata”. E nunca mais deixaram de entrar pessoas até Tomar…
Aquelas acomodavam-se como podiam no meio de carros de bebé, “gaiolas” de cães, gente sentada no chão.
Era nítido o desconforto das pessoas idosas, e/ou alquebradas, o que fez com que lhes fossem cedidos alguns lugares, mas noutros casos também não…
O problema das portas abrirem só ficou resolvido por alturas de Vila Franca de Xira e até hoje não sei dizer se foi avaria ou feito de propósito.
Não há lugares marcados nos bilhetes e nunca apareceu um revisor. Dado que as paragens passassem a ser mais longas que o normal, o comboio chegou com cerca de 25 minutos de atraso.
A única coisa que felizmente funcionou, foi o ar condicionado.
O regresso a Lisboa foi idêntico, salvo o problema das portas e o atraso.
Não fiquei cliente da opção que fiz.
A gestão estatal dos transportes públicos tem-se mostrado, há mais de quatro décadas, ruinosa e incompetente. Foi agora notícia nos “média” que o Governo não aprova as contas da CP faz anos; o prejuízo acumulado é estimado em 2000 mil milhões de euros…
O que se passa na, e com a “Soflusa” é simplesmente escabroso, e fiquemos por aqui. A população tem-se mostrado mansa e tansa.
A responsabilidade maior tem a ver com as sucessivas administrações nomeadas pelos diferentes governos, nomeadamente de entre os “boys e girls” dos Partidos que os apoiam. Um forró que já bate de longe a bandalheira da Monarquia Liberal e sobretudo da I República.
A seguir temos que considerar as leis da greve e do trabalho que potenciam e exponenciam as injustiças e barbaridades, nas greves, nos contratos de trabalho, na desorganização e indisciplina laboral, baixas fraudulentas, abusos das horas extraordinárias, etc.
A falta de fiscalização adequada favorece o desregramento financeiro e a corrupção, já de si facilitada pelo decaimento da educação moral, religiosa e ética da população, por via do descalabro das relações familiares, do funcionamento da Escola e do desregramento da comunicação social.
No caso do transporte ferroviário a má prestação do serviço ainda tem uma agravante de peso: este sector fundamental dos transportes (e da economia) deixou de ter qualquer prioridade – o que só deve ter sido ultrapassado pela quase liquidação da Marinha Mercante – nos últimos 40 anos em favor das auto – estradas e dos camiões ”TIR”. Um erro estratégico de monta.
Parece que agora se estão a dar conta disso. Pois é, mas agora a dívida é que lidera as coisas…
Seja como for podíamos tentar minorar os problemas. Ocorre-me dizer que sendo difícil reservar os lugares neste tipo de composição dado o número de paragens que efectua, talvez se pudesse tentar não vender mais bilhetes do que lugares disponíveis e já que se sabe com uma antecedência de quatro anos que vai haver festa dos tabuleiros – uma coisa que até hoje em dia a Igreja aceita participar depois de ter tentado solapar, no século XVI, os fundamentos que a sustentam – talvez se pudesse programar uns quantos comboios extra. Partindo do princípio, é claro, que existe material circulante suficiente (e operacional) e gente disponível, para tal. O que, a acreditar nas notícias que há algum tempo a esta parte começaram a transbordar, não existe.
Lamentavelmente não podemos, assim, aceder aos apelos lancinantes cheios de argumentos e apelos sociais, financeiros, de cidadania e sobretudo ecológicos, que as mais diferentes personalidades, governantes, autarcas, comentadores, forças partidárias, nos fazem com uma frequência inusitada, para deixarmos o carro na garagem (ou mais propriamente na rua) e utilizarmos os transportes públicos, de resto um cancro mal cheiroso da Sociedade e do Estado Português.
Uma última questão: já alguma vez se fizeram contas de quanto é que o Ministério das Finanças deixava de arrecadar em impostos, cobrados leoninamente nos combustíveis, se a maior parte dos portugueses deixasse o carro para andar encaixotado nos transportes públicos?
Fonte: Observador

segunda-feira, 15 de julho de 2019

230 anos da Revolução Francesa


Foi extraordinário aparecer este monstro; mas ainda foi mais extraordinário achar tantos sequazes esta infame doutrina. O mal não se ateava, nem lavrava, se de longo tempo não estivessem envenenadas as fontes, onde sem cautela bebiam os inocentes. Começou-se por desprezar as gerações que nos precederam, com o fim de insultar nos Mestres a doutrina; e tiraram, ou arrancaram, as profundas raízes que deixa a educação, a que chamaram preocupações. Com o falso pretexto de evitar a hipocrisia, fizeram que os homens se envergonhassem de mostrar em público ser Cristãos, e ao mesmo tempo perdeu-se a saudável vergonha, que em outros tempos havia de ser mão. Ralharam de nossos Pais serem pecadores, e passaram a ímpios, não ganhando certamente na troca que fizeram. Facilitou-se o caminho das Ciências, não para se saber mais, mas para todos julgarem que sabiam; e inspirou-se em todos um desejo de mostrar juízo, ainda que fosse à custa de o perder, e com ele a honra, o dinheiro e as maiores dignidades. Assim sucedeu, e muitos milhões de homens foram sacrificados a uma pequena e humilde classe dos chamados Filósofos; que logo que viu completa a depravação para que tinham concorrido seus escritos, rompeu contra tudo o que há de mais sagrado na sociedade. Deus, os Seus Santos, Templos, Reis, Sacerdotes, propriedade, segurança, fé pública, nada se respeitou, e muitos dos mesmos sedutores pagaram com as vidas uma parte do seu enorme crime. Neste dilúvio quase geral, como o primeiro, tem Portugal, graças a Deus, conservado pura a sua fidelidade Religiosa e Política; e o Céu nos tem pago com usura; porque os géneros de primeira necessidade não nos têm faltado, as searas são abundantes, o flagelo da guerra ouve-se ao longe, e ricos Comboios atravessam os mares com segurança, e vêm fazer Lisboa o Empório da Europa. Contudo, não são para desprezar os riscos, que corre a mocidade indiscreta, e são temíveis os efeitos da lição de perniciosos Escritores, que com engraçado estilo enganam leitores de pouca capacidade e mal educados.

Marquês de Penalva in «Dissertação a Favor da Monarquia», 1799


Fonte: Veritatis

domingo, 14 de julho de 2019

Portugal católico, património da humanidade

Basílica, Convento e Palácio de Mafra, Bom Jesus do Monte. O Cristianismo está na matriz e na essência da cultura portuguesa. Negá-lo, seria negar a nossa história e identidade nacional.

No passado dia 7 de Julho, a Basílica, Convento e Palácio Nacional de Mafra e o Bom Jesus do Monte, em Braga, passaram a fazer parte do património cultural mundial, por decisão tomada em Baku, no Azerbaijão da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).

É muito de saudar que mais dois monumentos nacionais tenham sido – a par, entre outros, dos mosteiros de Alcobaça, da Batalha e dos Jerónimos e do convento de Cristo, em Tomar – reconhecidos como expoentes máximos, não apenas da cultura nacional, mas mundial. É particularmente significativo que estes dois monumentos nacionais, agora incluídos no património mundial, sejam essencialmente religiosos: Mafra é, sobretudo, uma basílica e um convento, para além de palácio nacional; e o Bom Jesus é um conjunto arquitectónico constituído por uma basílica e várias capelas.
Segundo Paulo Pereira, professor da FAUL e historiador de arte, o Bom Jesus é “o maior e mais monumental sacro-monte do mundo; e é também um exemplo, o último de uma ‘espécie’ que se extinguiu” (Público, 8-7-2019). Já Manoel António Vieira, na sua Descripção do Prodigioso Augusto Santuário do Bom Jesus do Monte da Cidade de Braga, o equiparara às sete maravilhas do mundo.
Se, para Paulo Pereira, o Bom Jesus é “o maior e mais monumental sacro-monte do mundo”, o Real Edifício de Mafra – que compreende a basílica, o convento e o palácio – é “uma das maiores superfícies cobertas pré-modernas da Península Ibérica!” Com efeito, até excede o monumental palácio e convento de El Escorial, em Espanha, cujas enormes dimensões ficam, contudo, aquém da gigantesca construção planeada e edificada por João Frederico Ludovice, ao serviço de el-Rei D. João V. Ludovice foi, como muito acertadamente se escreveu no mais recente e documentado estudo sobre a sua vida e obra, a mão direita do Magnânimo (Leopoldo Frederico de Drummond Ludovice, A mão direita de D. João VJoão Federico LudoviciO arquiteto mor do reino, Edição do Autor, Lisboa 2019).
Como Leopoldo de Drummond Ludovice demonstra, a obra do seu ilustre antepassado, João Frederico Ludovice, é profundamente teológica. A sua arquitectura, na transição para o iluminismo laico é, por definição, uma aplicação da teologia católica, plasmada nas pedras que, segundo a mente do Magnânimo e o risco da sua ‘mão direita’, deveriam ser um perene testemunho da fé do fidelíssimo monarca. Recorde-se, a propósito, que o barroco nasce como resposta católica à heresia luterana e, por isso, esse estilo não pode ser dissociado da contrarreforma, nem da doutrina do Concílio de Trento.
Neste sentido – escreve-se no preâmbulo dessa obra – o convento palácio de Mafra inscreve-se na tradição das grandes catedrais góticas, cuja grandiosidade servia, certamente, um propósito de engrandecimento pátrio, mas também um intuito devocional. A monumentalidade destas empresas deve ser, portanto, lida e interpretada à luz da pneumatologia católica, porventura no esteio das profecias de um novo messianismo, também intimamente relacionado com o mito do quinto império, tão do agrado dos heraldos da presença lusitana em terras de aquém e além-mar. Sobre este particular, é relevante a tradicional devoção ao Espírito Santo, particularmente incentivada nas ilhas do arquipélago açoriano, também relacionada com as principais obras arquitectónicas de Ludovice.”
Se este desígnio transcendente inspirou algumas das magnas construções que se ficaram a dever ao risco de João Frederico Ludovice, também influenciou as suas construções civis, como o seu palácio em São Pedro de Alcântara, ou a sua quinta de Alfarrobeira, na freguesia lisboeta de Benfica. Com muito acertada intuição, Leopoldo de Drummond Ludovice descobriu na traça desses edifícios sinais que permitem concluir, com bastante probabilidade, uma mística afinidade com a sempre presente devoção ao Espírito Santo.
Se o Bom Jesus do Monte é uma obra tipicamente portuguesa, o mesmo já não se pode dizer do Real Edifício de Mafra, porque o seu arquitecto nasceu alemão e, só depois de uma estadia em Itália, passou a Portugal, onde foi o principal arquitecto de D. João V. Nestes tempos de construção do ideal europeu, em que as barreiras fronteiriças tendem a transformar-se em pontes de intercâmbio cultural, quem melhor do que Johan Friedrich Ludwig, aliás Giovanni Federico Ludovici, ou ainda João Frederico Ludovice, para dar nome a este ideal?! Seria bom que a Comunidade europeia, atenta a este exemplo de excepção, promovesse o conhecimento da sua personalidade e obra, na medida em que antecipou e realizou, de forma excelente, o que de melhor se fez na Europa. Não seria, porventura, o seu nome, uma excelente denominação para um prémio que galardoasse a melhor obra de um arquitecto europeu noutro país da comunidade europeia?!
Talvez alguém possa pensar que houve, na escolha destes dois monumentos nacionais, pouco respeito pela laicidade do Estado: com efeito, foram premiadas duas basílicas, ambas católicas! Até é de estranhar que uma organização internacional, como a UNESCO, em geral tão avessa à Igreja, tenha seleccionado dois templos construídos expressamente para o culto cristão. Teria sido mais politicamente correcta uma decisão que beneficiasse também grandes monumentos laicos nacionais … se os houvesse. De facto, a julgar pelo ridículo repuxo que, no cimo do parque Eduardo VII, celebra o 25 de Abril, não os há, talvez com a excepção de alguns castelos e da emblemática Torre de Belém, já declarada pela UNESCO, em 1983, património mundial. A verdade, porém, é que mesmo este monumento, essencialmente militar, de laico tem pouco.
Com efeito, o Castelo de São Vicente a par de Belém – assim foi a Torre de Belém oficialmente designada por D. Manuel I, em 1521 – conta com capela; imagens de Nossa Senhora no terraço do baluarte e num nicho exterior; de São Vicente, padroeiro de Lisboa; e de São Miguel arcanjo, também identificado como o anjo da guarda de Portugal; para além das inúmeras ameias, em forma de escudo, com a Cruz de Cristo (José Manuel Garcia, A magnífica Torre de Belém, Edição Verso da História, Vila do Conde 2014). Portugal católico, no seu melhor.
A conclusão é óbvia: o Cristianismo está na matriz e na essência da cultura portuguesa e, negá-lo, seria negar a nossa história e identidade nacional. Quer isto dizer que, se se destruíssem todos os edifícios religiosos, se se retirassem das bibliotecas nacionais todas as obras de inspiração cristã, se se banissem todas as esculturas e pinturas religiosas dos nossos museus, Portugal não seria muito diferente, culturalmente, do Sáara. Com algumas excepções, como as medonhas, embora excelentemente executadas, pinturas de Paula Rego; ou as obras da colecção Berardo que, graças a Deus, não são confessionais, nem portuguesas.
Fonte: Observador