“Aqueles que por obras valorosas se vão da lei da morte libertando”
Camões, Lusíadas, Canto I, 2
No passado dia 23 de Fevereiro decorreu no Salão “Portugal” da Sociedade de Geografia de Lisboa (SGL) – local de tantos e notáveis eventos – uma justíssima homenagem pública, a D. Isabel Manuela Teixeira Bandeira de Mello Rilvas e às enfermeiras paraquedistas da Força Aérea Portuguesa.
Esta homenagem ainda em vida das homenageadas (como deve ser), foi promovida pela Sociedade Histórica para a Independência de Portugal (SHIP), através do seu “Instituto” Bartolomeu de Gusmão, nome que bem melhor serviria para substituir aquele do aeroporto até há pouco conhecido como da Portela.
A homenagem a que muito diligente e honrosamente se associou a SGL culminou com um jantar no Salão Nobre do Palácio dos Almadas, aquele onde reuniam os conjurados que resgataram, não só a independência de Portugal, em 1640, como outrossim, a Honra da Nação.
Não podia a homenagem ter-se realizado em melhores locais, pois são “chãos sagrados” da nacionalidade portuguesa.
Estão pois, de parabéns, estas duas vetustas e patrióticas Instituições criadas no século XIX, e que tão relevantes serviços têm prestado ao país.
Porque se fez esta homenagem?
Por uma simples razão: as senhoras mereciam-na!
Isabel Rilvas já tinha sido objecto de uma homenagem, em 15/2/2014, efectuada pela Força Aérea Portuguesa, no Museu do Ar, tendo sido condecorada com a Medalha de Mérito Aeronáutico de 1ª classe.
Por seu lado as Enfermeiras Paraquedistas foram exaltadas por aquele Ramo das Forças Armadas, em 7/12/2011, numa pequena cerimónia no EMFA, antecedida de uma missa na Igreja da Força Aérea e seguida de um almoço na Messe de Monsanto; e louvadas pelo Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas, em nome do Conselho de Chefes Militares, em 4/6/2015.
A Comissão Organizadora da Homenagem Nacional aos Combatentes, também decidiu distinguir estas excelentes militares, no ano de 2015, na cerimónia que realiza anualmente a 10 de Junho, junto ao Monumento aos Mortos do Ultramar, em Pedrouços.
A D. Isabel Rilvas, “Isabelinha”, como é conhecida é uma notável mulher portuguesa, nascida em 1935, com uma vida cheia e um curriculum extenso.
Distinguiu-se entre os seus, não só por ser moralmente sã, mas por ter sido desde muito nova uma mulher corajosa, determinada e empreendedora.
Notabilizou -se em campos onde, à época, não era fácil a uma mulher fazê-lo, como seja no âmbito aeronáutico, onde pode exibir credenciais únicas e pioneiras.
Destaco: obteve o brevet de Piloto Particular de Aviões, nº 945 em 28/8/1954, no Aero - Clube de Portugal, tendo participado em numerosas actividades e obtido vários prémios de que se destaca, o 2º lugar no primeiro campeonato nacional de acrobacia aérea, em 1959, onde foi a única mulher a participar; foi a segunda mulher portuguesa a ter o brevet de voo sem motor, em 1955, tendo batido o record de permanência no ar, em 1960, com 01:15’; obteve o brevet de paraquedista no Centro Nacional de Biscarrose, França, em 4/7/1956; foi a primeira paraquedista civil portuguesa a saltar em Portugal, em 16/1/1957, em Tancos; também a 1ª paraquedista mulher na Península Ibérica e o primeiro português a saltar em Angola e Moçambique (incluindo militares). Fez um total de 142 saltos.
Ainda no âmbito aeronáutico, foi o primeiro português a obter o brevet de piloto de balão de ar quente, nos EUA, em 10/3/1981.
Depois – o que configura um espírito de iniciativa invulgar – tendo sido embaixatriz, por via do seu casamento de 28 anos com o embaixador Leonardo Matias, de quem teve três filhos, Isabel Rilvas fundou a Associação das Mulheres dos Diplomatas Portugueses, em 30/6/1982, quando só havia quatro associações desse género em todo o mundo. É membro de muitas outras associações e em diferentes âmbitos.
Desde muito nova que participou e participa em várias instituições de assistência social, não só fazendo parte dos seus quadros, mas também em trabalho voluntário.
Foi, em súmula, e creio que ainda é, uma apaixonada pela causa do Ar, pela intervenção cívica, pela assistência aos mais desfavorecidos; pelos laços familiares, tudo envolvido na Fé Cristã que a assola e na ideia monárquica que a entranha.
Foi ela, ainda que, inspirada num exemplo colhido em França, propôs ao então Subsecretário de Estado da Aeronáutica, em 1956, a criação de um corpo de enfermeiras paraquedistas a ser incluído no então Batalhão de Caçadores Paraquedistas – notável corpo de tropas, em boa hora criado, em 1955 – e que viriam a participar nas operações de contra subversão e contra guerrilha, desencadeadas em Angola a partir do bárbaro ataque ocorrido em 15 de Março de 1961, efectuado por uma verdadeira horda de assassinos desvairados, alimentados do exterior por organizações e governos inimigos de Portugal.
Este corpo de enfermeiras militares paraquedistas constituiu, na altura, uma verdadeira inovação e surpresa, tendo sido aprovado pelo Chefe do Governo, Professor Doutor António de Oliveira Salazar, que com esse gesto confirmou, se tal fosse ainda necessário, a sua classe como estadista e homem de alma grande e visão larga.
A criação e actuação das enfermeiras paraquedistas – esses “anjos que desciam do Céu” como passaram a ser conhecidas - revelou-se notabilíssima e heroica, tendo a sua acção sido alargada ao Estado da Índia, à Guiné, Moçambique e por último a Timor.
O 1º curso teve lugar em 6 de Junho de 1961, tendo sido brevetadas 6 das 11 que se voluntariaram, em 8 de Agosto. De notar que todas provinham de escolas de religiosas, que davam cursos de enfermagem.
Em 12 de Outubro de 1961, chegaram a Luanda, capital de Angola (nossa!), onde decorriam extensas operações militares.
Seguiram-se mais oito cursos, tendo sido brevetadas 46 “Marias” das quais uma ficou ferida e outra morreu em operações.
As Forças Armadas e a Nação muito lhes devem.
*****
Esta homenagem – feita apenas a mulheres, unicamente por homens, que não precisam de pedir licença a feminismos serôdios e escalavrados – é ainda especial pois venceu um arreigado hábito em Portugal de só dar valor às pessoas, depois destas desaparecerem do número dos vivos (mesmo assim muitos notáveis nacionais estão injustiçados e outros mal avaliados) o que, por norma, ocorre por descaso, inveja ou questões ideológicas.
Foi ainda feita por iniciativa de alguns cidadãos associados em duas instituições, também elas oriundas de iniciativas privadas, com créditos firmados, homenagem que foi organizada sem recorrer aos serviços do Estado com a honrosa excepção de material cedido graciosamente pela Força Aérea Portuguesa cujo Chefe de Estado-Maior se fez representar na cerimónia.
Finalmente esta homenagem foi um sopro de ar fresco e saudável, não poluído pelos actos contumazes da baixa política partidária; de ideologias desnacionalizantes; pela corrupção dos negócios e do relativismo moral, sem vergonha, que avassala a desmoralizada sociedade portuguesa.
É por isso, um marco de afirmação cívica, exaltação moral e exemplo para os vindouros.
É uma vitória da virtude sobre o vício, da verdade sobre a mentira e do Bem sobre o Mal.
Representou um lenitivo que alimenta a alma da Pátria Portuguesa que é o alimento do nosso espírito e o penhor do nosso futuro.
Bem andaram.
Em continência perfilo-me perante o exemplo destas minhas compatriotas.
João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador