24 junho 2015

Batalha de São Mamede


O reinado de D. Afonso Henriques é, por assim dizer, uma peça inteiriça: todo ele, de ponta a ponta, é um sistema de esforços conjugados, e superiormente dirigidos, para a independência do Condado de Portugal.

A batalha de S. Mamede é o primeiro acto decisivo, claro, que não admite dúvidas, da série gloriosa de feitos do fundador do Reino de Portugal. É o nosso grito de independência, é a nossa primeira afirmação de personalidade e de vontade. Vitorioso da hoste estrangeira, Afonso Henriques ergue voo, nas suas legítimas aspirações, e sonha o talhar de fronteiras que é o seu longo reinado.

Génio político e militar formidável, Afonso Henriques é o obreiro máximo da nossa existência como Nação. E foi na batalha de S. Mamede que o plano grandioso se fixou, se concretizou e definiu. Sem a batalha de S. Mamede, a história de Portugal não podia existir: ela foi o seu berço.

Tudo quanto veio depois, a obra inolvidável das dinastias que se seguiram, saiu do combate dos campos de S. Mamede, em que D. Afonso Henriques passando sobre os seus sentimentos de filho, defrontou a vontade da Mãe, subjugada à influência do estrangeiro. Perdoa-se a D. Teresa essa fraqueza sentimental de uma paixão serôdia – recordando-se que também ela cooperara, ainda em vida do marido, para que as condições do condado portucalense tornassem possível o gesto audacioso de Afonso Henriques, em 1128.

Volvidos 800 anos sobre essa data fascinante, a Nação persiste. Foi a continuidade da Realeza que garantiu essa persistência. Neste ano em que escrevo, em que me irritam os nervos, cantos de sereia castelhana que mascaram mal disfarçados apetites do Imperialismo Ibérico, é um dever, e um dever sagrado, recordar a batalha de S. Mamede, e a figura prestigiosa do Rei que a venceu. Coincidência curiosa: há oito séculos, nasceu Portugal. Em 1128, ergue-se o Sol magnífico; em 1828, abre-se a noite nefanda. Como vimaranense e como português, não posso, nesta hora, calar o grito sagrado: – Viva Portugal!

Alfredo Pimenta in «A Ilustração Moderna», n.º 25/26, Julho-Agosto de 1928.


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