sábado, 4 de abril de 2020

As dores pela defesa da Portugalidade: lembrar os nossos cativos


Um dos capítulos mais dolorosos da expansão ultramarina, em particular do ciclo imperial marroquino, prende-se com a sorte dos cativos portugueses nas masmorras norte-africanas entre os séculos XV e XVII. Para quem tem presente o drama Frei Luís de Sousa, de Garrett, cuja peça ou filme todos já terão visto, a figura do enigmático romeiro, velho, alquebrado e pobre - de facto, Dom João de Portugal, regressado do cativeiro - exprime o retorno ao Reino desses mortos-vivos, após anos, muitas vezes décadas, de indescritíveis padecimentos.

Tal como aconteceu com Miguel de Cervantes, cativo durante cinco anos em Argel e resgatado graças ao empenho de amigos, familiares e cortesãos, os cativos de Marrocos terão sido centenas, senão milhares, a aguardarem que se reunisse o pecúlio exigido pelos captores. Atirados para covas, submetidos a áspero tratamento - fome, sede, violências - e tantas vezes traídos por companheiros que entretanto haviam renegado a sua condição de cristãos, convertendo-se em "arrenegados" como então se dizia - a esses desgraçados só a esperança de serem redimidos os mantinha vivos. Para que tal sucedesse, montou-se em Portugal e em Espanha uma verdadeira máquina inteiramente consagrada a reunir enormes somas, produto da caridade popular e de doações da nobreza e da Coroa. Como o estado de guerra era quase permanente e aos captores, habitualmente corsários, era de todo impossível chegar pelos habituais canais da diplomacia, coube a uma ordem religiosa - os Trinitários, ou Ordem da Santíssima Trindade para a Redenção dos Cativos - desenvolver o papel de intermediação. Onde hoje funciona o Teatro da Trindade, esteve sediada durante quase trezentos anos a sede da província portuguesa.

MCB

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