sábado, 16 de julho de 2016

A Segunda Monarquia – 1.ª Parte: O Falhanço da República Velha



Portugal não começou há 105 anos, isso foi a república portuguesa!
Dois meses, imediatamente, à proclamação da república portuguesa, o jornal O Sindicalistanum artigo de sugestivo título, ‘Quem Tem Ganho? Quem tem ganho com a República?´ faz eco das queixas dos operários e dos sindicatos relativamente às limitações impostas pelo governo ao direito à greve.
6. 1911 Protestos
Antes, durante 771 anos existiu o Reino de Portugal e dos Algarves. Portugal, País forjado à espadada e valentia por Reis e heróis extraordinários. O Reino de Portugal e depois, também, dos Algarves, e depois, também, d’Aquém e d’Além-Mar, com o seu desejo oceânico fruiu o Mundo e esses tempos de Glória de Portugal, não podem ser encarados como meras recordações, ecos ensurdecidos, pois em Monarquia ultrapassamos sempre as crises: granjeamos a Nação Portucalense, expulsamos os sarracenos, sobrevivemos à ocupação castelhana, às Invasões Napoleónicas com a sua política de delapidação e terra-queimada, sobrevivemos a Ultimatos e guerrilhas.
Já a república teve origem revolucionária, antagónica à da Monarquia Portuguesa, pois no Reino de Portugal, o Rei era Aclamado e nunca imposto, pois sempre reinou por delegação da comunidade portuguesa.
Ao contrário da Monarquia Portuguesa, o regime republicano não resultou de uma vontade comum nem de uma emanação popular. Na 46ª eleição geral, 37ª eleição da 3ª vigência da Carta que se realizou a 28 de Agosto de 1910 – portanto, as últimas eleições do constitucionalismo monárquico -, estavam recenseados 695 471 eleitores, e a ida às urnas traduziu-se numa vitória com 58% dos votos (89 deputados) para os Governamentais do chamado bloco liberal Monárquico de Teixeira de Sousa, mas sobretudo numa vitória dos partidos monárquicos expressa nuns retumbantes 91% (33% – 51 Deputados p/ o bloco conservador das oposições monárquicas; 15% – 20 deputados regeneradores apoiantes de Campos Henriques; 13% – 23 deputados progressistas; 3% – 5 dep. franquistas; 2% – 3 dep. nacionalistas ), contra uns meros 9% (14 deputados) do Partido Republicano Português.
Assim sendo, antes sim, este Estado das Coisas republicano foi implantado a 5 de Outubro de 1910 em sequência de um golpe revolucionário apoiado nas milícias revolucionárias da Carbonária e da ralé que se lhe juntou, nas bombas dos anarquistas e nas obscuras jogadas políticas da maçonaria, salteado com cumplicidade de alguns traidores monárquicos e a omissão cobarde de outros, o que destroçou a Nação.
Ora este regime republicano nunca foi referendado, pois nunca foi dado aos Portugueses a liberdade de escolher sobre que regime pretendem ou preferem: república ou Monarquia?
Não podem dizer que o Povo não sabia o que queria e portanto escolheram por Ele!
Porque recusam a democracia directa?!
‘Ser republicano por 1890, 1900 ou 1910, queria dizer ser contra a monarquia, contra a Igreja e os jesuítas, contra a corrupção política e os partidos monárquicos, contra os grupos oligárquicos. Mas a favor de quê?’
Seria errado encará-lo como um movimento puramente ideológico, pois a esta rebelião não foram alheios os interesses dos protagonistas revolucionários. Não ficou no anonimato o desabafo de um dos implantados para outro enquanto na varanda era comunicada a instauração do novo regime: ‘Eles já comeram muito, agora é a nossa vez!’
Desde o início a República Velha mostrou-se inadequada às idiossincrasias do “Ser Português”, pois quiseram moldar o cidadão à imagem do positivismo que nada tem a ver com a maneira de ser e estar portucalense. Para começar não foi o resultado de uma vontade popular, pois no início do terceiro quartel do século XIX, não havia magotes de republicanos, mas uns grupinhos atrevidos. Foi graças a uma ampla, metódica e obstinada propaganda que maldosamente aproveitou os contratempos da época – como o Ultimatum britânico de 1890 – que começaram a evidenciar-se, mas, não obstante, nas últimas eleições realizadas em Portugal, em 1910, durante a Monarquia, recorde-se os partidos monárquicos obtiveram 91% dos votos expressos e os republicanos 9%. Pode constatar-se pelos resultados das Eleições Gerais realizadas no Reino de Portugal entre 1878 e 1910 que o Partido Republicano Português não passava da insipiência, e que a sua pequena franja de admiradores se concentrava sobretudo nas zonas urbanas de Lisboa e Porto:
.13 de Outubro 1878  – 148 deputados monárquicos e 1 deputado republicano
.19 de Outubro 1879 – 137 deputados monárquicos e 1 deputado republicano
.21 de agosto1881 – 148 deputados monárquicos e 1 deputado republicano
.29 de Junho 1884 – 167 deputados monárquicos e 2 deputados republicanos
.6 de Março 1887 – 157 deputados monárquicos e 3 deputados republicanos
.20 de Outubro 1889 – 157 deputados monárquicos e 2 deputados republicanos
.30 de Março 1890 – 148 deputados monárquicos e 3 deputados republicanos
.23 de Outubro 1892 – 119 deputados monárquicos e 2 deputados republicanos
.15 e 30 de Abril 1894 – 167 deputados monárquicos e 2 deputados republicanos
.17 de novembro1895 – 141 deputados monárquicos e 0 deputados republicanos
.02 de Maio 1897 – 141 deputados monárquicos e 0 deputados republicanos
.26 de Novembro 1899 – 142 deputados monárquicos e 3 deputados republicanos
.25 de Novembro 1900 – 145 deputados monárquicos e 0 deputados republicanos
.6 de Outubro 1901 – 157 deputados monárquicos e 0 deputados republicanos
.26 de Junho 1904 – 157 deputados monárquicos e 0 deputados republicanos
.29 de Abril 1906 – 157 deputados monárquicos e 0 deputados republicanos
.5 de Abril 1908 – 148 deputados monárquicos e 7 deputados republicanos
.28 de Agosto 1910 – 139 deputados monárquicos e 14 deputados republicanos
Afonso Costa, Ministro da Justiça do governo provisório não eleito de 5 de Outubro de 1910, anula as derradeiras eleições do constitucionalismo Monárquico, e no novo programa político de 29 de Agosto de 1911, anuncia o partido republicano como o partido único da República. Alia-se no governo à família Rodrigues, com Rodrigo a ministro e Daniel como governador civil de Lisboa, a dupla que fomenta a formiga branca. Segundo João Chagas,  a sua obra política é sempre dirigida contra alguma coisa ou contra alguém. Para Machado Santos,  o líder militar da revolução: ‘o mais audaz, o mais inepto e o mais imoral de todos os tiranos.’
Viveram-se tempos em que a política interna era caracterizada pela deliquescência e desagregação do sistema do partido único, o que em último grau comprovou a dissolução do regímen republicano desprestigiado e enfraquecido por incompetência e impreparação técnica e política, escândalos de corrupção, nepotismo, favorecimento, privilégio, despesismo, sem que se assumissem as responsabilidades pelos próprios erros.
Assim, passou a existir um Estado que se regia sobre o princípio da benevolência para com o seu Povo, à maneira de um pai relativamente aos seus filhos, com um regime republicano paternal, esse sim, que entende os cidadãos como súbditos, crianças menores que ainda não podem distinguir o que lhes é verdadeiramente útil ou prejudicial, e por isso os obriga a comportar-se de maneira passiva e como tal não passou de um regime deImperium paternale, que via os cidadãos como crianças menores que não podiam discernir o que lhes era realmente vantajoso ou nocivo, submetendo-os a comportar-se de modo paciente, aguardando da classe dirigente um alvitre sobre a melhor maneira de que deveriam ser felizes, se e no grau que essa classe o quisesse. De facto, o regímen republicano começou muito mal e, não sendo resultado do ensejo e determinação populares, logo surgiu a repressão; depois empurrou o País para uma Guerra (Iª Guerra Mundial) de ambíguas razões. Consecutivamente à implantação da república, Afonso Costa nomeado Ministro da justiça do governo provisório (sem eleições) de 5 de Outubro de 1910 a 4 de Setembro de 1911, ao anunciar o novo programa político do partido republicano, aponta para a Guerra contra quase todo o resto da sociedade portuguesa dividida entre ‘guerristas’ e ‘antiguerristas’ (a maioria), com propósitos de afirmação e legitimação do novel regímen republicano. Também, em território nacional, a guerra, provocara um agravamento das condições de vida, com aumento galopante dos preços dos bens essenciais, gerando uma escalada de violência que se traduziu em ataques bombistas, greves e motins quase diários, e como tal para evitar um derrube do regime houve a necessidade de meter o País na Grande Guerra para desta forma afastar os possíveis ‘golpistas’. Para o Teatro de Operações da Europa seguiram 55.165 militares portugueses para combater um inimigo técnica e tacticamente superior.
Desde 1814 que Portugal não actuava operacionalmente naquele território europeu nem num ambiente de guerra intensa. Mas em Março de 1916 a República portuguesa, deliberadamente, requisitou os navios alemães detidos no Tejo, criando o ‘casus belli’ com o qual o Império Alemão declarou guerra a Portugal entrando assim o País na Guerra de duvidosas causas, mas como veremos de perniciosos efeitos. A guerra das trincheiras era uma novidade para os militares portugueses. Assim, em La Lys, no dia 9 de Abril de 1919, os alemães elegeram propositadamente o sector português sabendo que este seria o ponto mais frágil. Os alemães atacaram justamente no dia em que o contingente português se preparava para a rendição. Na Batalha, embora, existissem extraordinários actos de bravura – como o de Milhões – o saldo de mortandade foi enorme com cerca de seis centenas de mortos e bem mais de seis mil prisioneiros. Ao meio dia, os últimos esforços de resistência terminavam e com eles a Divisão Portuguesa deixava de contar como unidade militar. Ao todo na Grande Guerra morreram 1.643 militares portugueses e os que não foram mortos ou feitos prisioneiros retiraram desorganizadamente para a retaguarda. 200 mil Portugueses foram mobilizados e combateram em África e na Europa, mais de 55.000 no Corpo Expedicionário Português na Flandres. 7.500 soldados portugueses perderam a sua vida e 14.062 foram de alguma forma vítimas da Iª Guerra Mundial, seja como mortos, feridos ou prisioneiros. Além destas baixas foram imensuráveis os custos sociais e económicos que tiveram consequências superlativas para a capacidade nacional, e, os objectivos que levaram os responsáveis políticos da 1ª República a empurrar os jovens para a guerra saíram gorados em toda a linha. Ao invés da unidade nacional pretendida pelo novel regime saído do golpe revolucionário do 5 de Outubro gerou-se ainda mais instabilidade política que levaria, em 1926, à queda da nova República Velha.
Os ‘donos’ da República Velha, fartos em questiúnculas, mas com pouco bom senso para amenizar e irmanar as diversas energias politico-sociais, – embora se dissessem irmãos e primos – não tiveram, também, engenho para melhorar a gestão financeira e reformar a administração do Estado; antes sim mergulharam o País na guerrilha, na bancarrota e na censura. Foi este, então, claro, o resultado necessário e esperado de uma espécie de remexida de ideias.
Ora, como numa viagem, um mínimo desvio inicial torna-se cada vez maior à medida que vai aumentando a distância. Só anda meio caminho, quem começou bem, mas como começaram mal, para o País não alcançaram nada do que prometeram, outrossim, foi o que se viu; deram nova existência ao pensamento de Miguel Delibes: ‘Para aqueles que não têm nada, a política é uma tentação compreensível, porque é uma forma de viver com grande facilidade’.
Cedo o regímen republicano foi ultrapassado pelos defeitos originários, pois logo desde a sua implantação o republicanismo português mostrou não estar à altura das exigências do País. Não houve qualquer progresso histórico, as instituições não adquiriram qualquer vigor democrático que já não existisse na Era da Monarquia, o progresso social é mínimo, pois substituiu-se uma estrutura de classes por uma outra: a burguesa.
Ora assim sendo, as influências da revolução republicana portuguesa são fáceis de descobrir: o fervor maçónico e o jacobinismo da revolução francesa. Nada de socialismo, pois, os próprios socialistas, (que hoje representariam todo o universo que abrange a social-democracia, passando pelo centro-esquerda e pelo socialismo) já haviam rompido, a sua breve ligação, com os republicanos em 1907, e logo em 1910, dois meses volvidos sobre a proclamação da república, se queixavam das limitações ao direito de greve.
Mas esse ateísmo oficial e insistência no aperfeiçoamento apenas material do indivíduo considerando, erradamente, tudo o resto misticismo de baixa condição, mostrou um desconhecimento pobre da história da Nação Portuguesa e ignorou o temperamento do Povo. Ignoraram o principal: o conhecimento prático do homem!
‘A República já aparecia inquinada, ao nascer, do mal tremendo que a está afligindo. Na sua constituição haviam intervindo elementos mórbidos. Cuja acção deletéria difícil será eliminar do seu organismo. Longe de se ter procurado aniquila-los, alimentaram-nos. Fizeram-lhe o terreno propício à devastação infalível.’, foi esta a «Opinião de um Monárquico», Carlos Malheiro Dias, escrita in «Zona dos Tufões».
O mundo que os implantadores republicanos tão frequentemente puseram em causa, e utilizaram como justificação para a sua revolução verde-rubra, vingou-se justamente dos seus prosseguidores, pois os novos senhores do Estado cedo abandonaram a defesa das razões activas com que justificaram a implementação do novo regime.
Miguel Villas-Boas

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