quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Liberdade Foi… Em Monarquia – Parte II

Greve Geral 1911 1912


Acossado pela censura, escreveria Fernando Pessoa in Da República:
‘Na Monarquia era possível insultar por escrito impresso o Rei; na república não era possível, porque era perigoso, insultar até verbalmente o Sr. Afonso Costa.’
Aos que reclamavam a república pelo panfletário, por exemplo de umas Cartas Políticas de Chagas, a Monarquia respondia com bonomia afabilíssima, com a suprema elegância, com uma quixotesca transigência, esquecendo que a prudência, também, é audácia!
Eis a diferença entre duas épocas, eis a diferença entre dois regimes!
‘Eu bem sei que seria mais fácil, e menos penoso para nós, o tratar de agradar a todos; mas espero que um dia a opinião pública, que felizmente não é sempre a opinião que se publica, saberá fazer-nos justiça’, notava El-Rei Dom Carlos I de Portugal, acossado por uma campanha de detracção, má-língua, falta de respeito que só poderia existir num clima de total liberdade de opinião e de imprensa.
O republicano Brito Camacho enunciou a agenda propagandística republicana: ‘quanto mais liberdades nos derem, mais delas usaremos contra eles’. De facto, um dos maiores auxílios ao ideal republicano foi o uso da imprensa como veículo de propaganda e efervescência junto da minoria alfabetizada e sobretudo ilustrada, pelo que sempre se concluiu que a revolução foi imposta por uma elite minoritária que aproveitou o clima de liberdade e se apropriou dos meios de reclame do ideal que exaltou mentirosamente como receita de salvação nacional.
A liberdade de associação e de organização permitiu que a Maçonaria nas lojas dos Grandes Orientes, mesmo já transformada em organização conjurante, livremente exercesse a sua actividade conspiratória sem qualquer incómodo por parte da Polícia Preventiva.
O maior alvo desta campanha foi sem dúvida El-Rei Dom Carlos I e, também, um pouco a Rainha Dona Amélia.
El-Rei via a Sua caricatura espalhada por jornais e panfletos, colocados em quiosques e cordéis e sempre associada à crítica satírica e não raras vezes violenta da legenda. Bem mais agradável é criticar do que louvar: o republicanismo era um ideal só de garganta! Um dos expoentes máximos desta perseguição foi Rafael Bordallo Pinheiro, o esteta, o Makavenko, que tinha tanto de talentoso como de impertinente, e que fazia do Rei e da Monarquia alvos predilectos. Sem qualquer limite, sem qualquer censura, não raras vezes ultrapassou os limites da decência que hoje fariam corar as leis que protegem certos responsáveis políticos e o regímen. A merecer calabouço, Bordallo Pinheiro antes recebia do bom Rei e da Polícia, indulgência.
Tal qual modo havia sindicatos, partidos de todas as áreas políticas, partidos Monárquicos de todas as facções e tendências (Regenerador, Liberal, Progressista, Miguelista, Nacionalista) até partido republicano que pretendia o derrube da Monarquia, mas que desde 1878 se apresentava a eleições e cujos melhores resultados foram por ordem ascendente: 3 deputados republicanos nas eleições gerais de 26 de Novembro 1899, 7 nas de 5 de Abril 1908 e 14 deputados a 28 de Agosto 1910, sendo o normal oscilarem entre o rotundo 0 e o somítico 2.
Em 1852 surgiu o Centro Promotor dos Melhoramentos Laboriosos, aquele que se pode apelidar do primeiro sindicato português, que reunia socialistas como Azedo Gneco, Batalha Reis, etc. Também em 1871 é fundada a Fraternidade Operária, e em 1875 o Partido Socialista denominado a partir de 78 de Partido dos Operários Socialistas de Portugal e cujo dirigente, o supra-citado Azedo Gneco, dirigiu-se desta forma a El-Rei Dom Manuel II:
‘Venho agradecer reconhecidíssimo o bilhete e a carta que V. M. houve por bem enviar-me e o interesse que V. M. continua a tomar pelos seus operários. Mal sabem eles do alto patrocínio que tão eficazmente os está auxiliando neste momento’.
No desfile do 1.º de Maio de 1897 marcaram presença 50.000 trabalhadores, sem qualquer perturbação, e sem intromissão das autoridades. O socialista Luís Figueiredo afirma: ‘A Monarquia tem a virtude de actuar como instituição moderadora’A esse entendimento não era alheio a possibilidade de fazerem comícios livremente e de estar consagrado o direito à greve.
Depois, a Monarquia é deposta pela golpada republicana e tudo muda: Afonso Costa, Ministro da Justiça do governo provisório de 5 de Outubro de 1910 – sem eleições – anuncia novo programa político do Partido Republicano Português em 29 de Agosto de 1911 e anula os resultados das eleições de 28 de Agosto 1910 na qual o Partido Republicano Português obterá uns meros 9% e anuncia o PRP como o partido único da República. Alia-se no governo à família Rodrigues, com Rodrigo a ministro e Daniel como governador civil de Lisboa, a dupla que fomenta a formiga branca. Segundo João Chagas,  ’a sua obra política é sempre dirigida contra alguma coisa ou contra alguém.’ Para Machado Santos,  o líder militar da revolução, Afonso Costa era ‘o mais audaz, o mais inepto e o mais imoral de todos os tiranos.’
Dois meses, imediatamente, à proclamação da república, o jornal O Sindicalista num artigo de sugestivo título, ‘Quem Tem Ganho?´ faz eco das queixas dos operários e dos sindicatos relativamente às limitações impostas pelo governo do PRP ao direito à greve.
A 14 de Janeiro de 1911 uma greve geral dos ferroviários é fortemente reprimida e em 1912 rebentam as greves dos operários lisboetas e dos trabalhadores rurais alentejanos e que sofrem grave repressão policial, sendo tomada de assalto a Casa Sindical e feridos e detidos centenas de sindicalistas e operários. Cereja no topo do bolo, em 1913, o governo de Afonso Costa proíbe o desfile do 1.º de Maio.
O jornal a Batalha Socialista, que haveria de ser arrasado, escreveu:
‘Estamos a dois anos e meio da proclamação da república, e somos forçados a confessar que nenhuma das promessas sedutoras, que tanto falaram ao espírito das multidões, se cumpriu ainda. A situação do operariado, longe de melhorar, agravou-se.’
Estava tirado o retrato à I.ª República! Liberdade… foi em Monarquia!
Miguel Villas-Boas

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