Se ‘BA’ é uma “boa acção”, seria de esperar que ‘BE’ fosse “boa educação”. Mas não é: na realidade, BE é até o oposto da boa educação…
Como é sabido, os reis de Espanha vieram a Portugal, em visita oficial de cortesia e boa vizinhança. Quis o monarca espanhol, num gesto de muita simpatia, honrar o parlamento português com a sua presença e palavra. Os deputados do Bloco de Esquerda (BE) fizeram questão de permanecer sentados e não aplaudir as palavras do soberano. Pouco faltou para que não devolvessem ao monarca o que o seu augusto pai, o rei Juan Carlos, em tempos disse a Hugo Chávez: “Porqué no te callas?”
Em comunicado, o irreverente grupo parlamentar esclareceu: “O BE valoriza a importância das relações entre o Estado português e o Estado espanhol. Mas mantém a posição de sempre, republicana, e não naturaliza relações de poder com base em relações de sangue e não em actos democráticos”. Ainda bem que ‘valoriza’ … mas, se o faz de forma tão malcriada, o que faria se não valorizasse?! Cuspiria nos reis?!
Os deputados do BE são peritos em dizer uma coisa e … fazer outra. Se valorizassem, como dizem, as boas relações com Espanha, em vez de protagonizarem o triste número de circo com que brindaram a plateia internacional, teriam tido uma atitude de Estado, digna de quem valoriza, de facto, as relações entre os dois países ibéricos. O PCP, que não é menos progressista nem menos republicano, soube receber com dignidade e sentido de Estado o rei do país vizinho, sem se imiscuir em questões que são do foro interno dessa nação. Portanto, não é uma questão de coerência ideológica, mas de falta de maturidade política e de irresponsabilidade institucional.
Será que o BE, se porventura entender preferível uma chefia de Estado feminina, se recusa a cumprimentar um presidente masculino?! Deveria fazê-lo para, segundo a sua esfarrapada desculpa, não ‘naturalizar’ um poder machista …
O BE tem todo o direito de ser republicano, como é muito boa gente, também católica. Mas isso não o autoriza a fazer um paternalista juízo de valor sobre o regime do Estado vizinho. Não faz sentido questionar a legitimidade democrática da monarquia espanhola, que não só foi o motor da democratização desse país, como também foi legitimada pelo povo quando, por esmagadora maioria, aprovou a sua actual constituição. A vigente lei fundamental restaurou a democracia e a forma monárquica do Estado, na pessoa do então rei Juan Carlos e da sua descendência, nomeadamente o agora rei Filipe VI, seu filho e sucessor no trono.
A justificação do BE também falha redondamente quando afirma não reconhecer “relações de poder com base em relações de sangue”. Acontece que esse princípio tão solenemente proclamado é, juridicamente, um supino disparate, porque também o BE admite relações de poder, embora não estatal, que têm por base relações de sangue, como são, por exemplo, os poderes parentais: paternal e maternal. Com certeza que o BE não ignora, nem considera ilegítimo, o poder dos pais em relação aos filhos menores, mesmo não sendo, como certamente não são, poderes democráticos.
Um rei constitucional, como é o espanhol, não é, nem tem, nenhum poder: reina, mas não governa. Não tem faculdades executivas, legislativas ou judiciais: é um órgão moderador e de representação da unidade nacional. Nem sequer é de sangue porque, como toda a gente sabe, o “sangue” do actual rei de Espanha é grego pela mãe – que é, por sua vez, de ascendência dinamarquesa e germânica – e Bourbon pelo pai, ou seja, francês … Aliás, os deputados do BE não têm qualquer autoridade moral para dar lições de democracia ao rei de Espanha: quando os avôzinhos dos bloquistas provavelmente ainda não sabiam o que era a democracia, já o avô de Felipe VI, o Conde de Barcelona, estava exilado em Portugal, precisamente por ser democrata e não querer pactuar com o regime franquista.
Espero que a partir de agora, a bem da coerência, os deputados do BE também não se levantem quando tocar o hino nacional, que não tem mais legitimidade democrática do que o rei de Espanha e que, talvez, até tenha menos do que “ O Pica do Sete”, de António Zambujo, bem mais português e pacífico do que a versão lusa da bélica marcha marselhesa. Portanto, senhores deputados do BE, sejam coerentes: quando tocar o hino, toda a malta sentadinha, de boina na cabeça, perna traçada e, se possível, a fumar um charuto, de preferência cubano! O mesmo se diga da bandeira republicana, que também não foi legitimada pelo voto popular e que, por isso, não pode merecer a homenagem dos democratas do BE.
A Igreja católica teve sempre uma atitude de respeito pelas autoridades públicas, mesmo quando, como aconteceu durante os três primeiros séculos de Cristianismo, o poder político perseguia impiedosamente os cristãos. Por isso, São Pedro, o primeiro papa, exortou os cristãos a rezarem e honrarem os reis e demais governantes (1Ped 2, 13-14). Se o presidente da República ou o primeiro-ministro participam, oficialmente, em celebrações religiosas católicas, a Igreja presta-lhes a honra devida aos cargos que exercem, sem fazer acepção de pessoas, nem confundir o que é de César com o que é de Deus. A Igreja não adula o poder, mas também não ofende os chefes de Estado, nem insulta os que exercem funções legislativas, judiciais ou executivas. É uma questão do mais elementar civismo; uma questão, afinal, de boa educação.
É pena que a arrogância e irresponsabilidade de um grupo parlamentar afecte tão negativamente, também a nível internacional, o bom nome de Portugal. É lamentável que alguns deputados, pelos vistos nada patriotas, ponham as suas birras ideológicas à frente do interesse nacional. Este modo fracturante de estar na política é a antítese da atitude de serviço ao bem comum que é, afinal, o modo cristão de exercer, séria e responsavelmente, o poder.
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