quarta-feira, 31 de julho de 2024

Missa em Latim: protectora do etnocídio dos europeus na guerra cultural. Homenagem ao Papa Pacificador Bento XVI

 A convite de um padre católico cujo nome omito para lhe poupar incómodos, assisti pela primeira vez a uma Missa Tridentina, celebrada em latim e de costas, ritual único formalizado entre 1570 e 1962, no Missal Romano. A língua e o ritual cruzam a fé católica com as raízes civilizacionais da Europa, cerimonial cuja origem remonta ao século III, motivo para uma parte da Cúria Romana das décadas recentes tomá-lo de ponta como manifestação «ultraconservadora», eufemismo religioso do anátema «extrema-direita».

Bem mais de um milénio depois, não por acaso no ciclo histórico de explosão do esquerdismo, o ritual único em latim foi substituído, em 1962, pelo ritual da missa católica actual no Concílio do Vaticano II (1962-1965) e, em 1970, o Papa Paulo VI deu um passo em frente ao perseguir e tentar extinguir uma tradição milenar que, felizmente, a Providência vai permitindo que resista. Se os rituais da missa não foram estáticos no decurso dos séculos, a rotura histórica inédita resulta da proibição do latim como língua de celebração católica, interregno que duraria mais de três décadas. Em 2007, o Papa Bento XVI reconciliou a Igreja Católica com a sua identidade e história milenares fazendo regressar a Missa Tridentina como ritual alternativo para pouco depois, em linha com a posição persecutória iniciada por Paulo VI, o Papa Francisco voltar a introduzir fortes restrições à Missa Tridentina desde 2021.

Na sua terra ancestral, a Europa Ocidental, um ritual cristão católico milenar está hoje forçado a só poder ser celebrado fora das igrejas paroquiais, por isso a missa a que assisti em 2024 foi na capela de um hotel, em Lisboa, espécie de catacumba onde se escondiam os cristãos nos primórdios da religião. Inacreditável!

Paradoxalmente, a situação adensa o interesse pela velhíssima Missa Tridentina. Deixa de ser uma mera «curiosidade histórica»«interesse turístico» ou «coisa diferente» para se tornar em questão cultural substantiva de sobrevivência da identidade dos europeus comuns na actualidade.

Após a substituição da Missa Tridentina pelo novo ritual (1962), não foi mero acaso a perseguição ostensiva ter tido início no ano de 1970. Coincidiu com o ciclo da Revolução Cultural Chinesa (1966-1976), de Mao Tsé-Tung, e com o advento do auge do poder comunista da antiga URSS durante a guerra fria (1945-1991), a década de setenta. Nesse contexto, o Papa Paulo VI decidiu romper com um ritual profunda e genuinamente europeu ocidental, por isso o latim passou a alvo cirúrgico a abater, para em troca se impulsionar um renovado ecumenismo cristão próximo do então «internacionalismo proletário» soviético que, com o passar dos anos, rebatizou-se em «multiculturalismo»«globalismo» ou «cultura inclusiva». Tudo antieuropeísmo desbragado!

Podendo conservar ao menos em parte uma tradição católica milenar como alternativa, no entanto uma Cúria Romana revolucionária preferiu surfar a onda histórica da viragem política mundial à esquerda desde os anos sessenta e setenta tornando-se, ela mesma, marco do suicídio cultural europeu com laivos de etnocídio.

A evidência é tanto mais preocupante quando se confronta o cristianismo católico com o Islão no mesmo ciclo. Dos anos sessenta até hoje, enquanto aos católicos foi imposto o abandono do ritual originário da missa em latim, a Missa Tridentina (fruto do Concílio de Trento, 1545-1563), os islâmicos persistiram no seu ritual originário iniciado no século VII, a celebração religiosa em árabe onde quer que seja. Por se manter capaz de aproximar a identidade de povos, nações e países diversos e dispersos, porém com identidades colectivas derivadas da mesma tradição secular originária islâmica, a força do Islão cresceu nas últimas décadas ao ritmo do enfraquecimento do catolicismo que, por razões políticas, paga o preço do abandono persecutório das suas raízes identitárias seculares europeias, a eterna alma-mãe de todas as variantes do cristianismo que hoje existem no mundo.

A diferença entre uma língua «morta» (latim) e uma língua «viva» (árabe) não é, em si, factor explicativo, em especial no âmbito religioso. O decisivo remete para o significado que lhes é atribuído pelas sociedades e suas instituições, isto é, uma língua dita «morta» pode, paradoxalmente, funcionar como garantia da vitalidade identitária de um culto religioso, até porque o latim tem uma relação directa com as línguas europeias «vivas».

Em 2007, ao voltar a legitimar a missa celebrada em latim, o Papa Bento XVI procurava reverter o ciclo de empobrecimento espiritual, intelectual e cultural das sociedades europeias que estava e está longe de se restringir ao campo religioso cristão, mas este paga e pagará por tabela. E Bento XVI também será sempre uma voz Divina no interior da Igreja Católica.

Em primeiro lugar, ao ser decretado o seu desaparecimento das missas em 1970, o latim não resistiu ao desaparecimento das escolas, empobrecimento em toda a linha das identidades europeias. O abandono religioso da língua arrastou o seu abandono intelectual, cultural e social.

Portugal é um caso sintomático. Talvez nunca tivesse existido o Novo Acordo Ortográfico (1990) se o latim tivesse resistido, e não resistiu por responsabilidades directas de uma Santa Sé virada à esquerda.

A profundidade civilizacional da questão linguística bastaria para recomendar a cada um a experiência de uma Missa Tridentina. Se o ritual verbal em latim for acompanhado pelo respetivo missal (texto escrito), é provável que se vivam momentos de metamorfose de uma língua hoje supostamente distante e complicada, o latim, em idioma ritualizado venerável por nunca perder a capacidade de acender a luz da profundidade histórica e civilizacional da fé cristã, da língua portuguesa (como de outras línguas europeias), das identidades europeias, do que fez a grandeza dos povos europeus. Será isso ofensa ao Divino?!

Em segundo lugar e não menos grave, o latim sempre esteve simbolicamente associado ao que se pode designar por alta cultura europeia: tradição filosófica e literária milenar, música clássica, ballet, ópera, pintura e o resto. Por tradição, sendo o ritual da missa o alimento cultural dos desfavorecidos e classes médias europeias, o latim sempre lhes abriu os espíritos à sedução pela alta cultura, que o progresso social de alguns depois permitia desenvolver. Desaparecido o latim de missas e escolas, naturalmente a má moeda (a indigência cultural) ocupou o lugar abandonado pela boa moeda (a alta cultura).

Daí em diante, o que se tornou culturalmente sedutor para desfavorecidos e classes médias? A literatura fast-food tipo Miguel Sousa Tavares, a «filosofia» terceiro-mundista tipo Boaventura de Sousa Santos e demais seita académica e intelectual «globalista», escolas-intelectuais substituídas por escolas-madraças-esquerdistas, hip-hop, rap e breakdance, «filosofia» africana Ubuntu, arte-grafiti que tornou imundo o espaço público habitacional quanto mais pobre o meio socioeconómico, ideologia de género impossível de germinar em contextos de complexidade intelectual ou cultural inerentes à alta cultura europeia, entre um rol interminável de perdas civilizacionais severas.

A perseguição à Missa Tridentina instigada pela Cúria Romana nos seus ciclos «progressistas» nunca foi indiferente ao facto da alta cultura europeia – que inclui Santo Agostinho, S. Tomás de Aquino, Santo Inácio de Loyola, Santo António, entre tantos outros – ter passado de manifestação civilizacional nobre, que é!, à categoria de instrumento de «opressão» ou «discriminação» cultural alegadamente imposto pelas velhas elites europeias às classes desfavorecidas, minorias ou povos não-ocidentais e, vamos descobrindo, a alta cultura europeia também foi desqualificada ao nível das águas pútridas de supostos «racismo» e «xenofobia».

Fica um dos retratos maiores da capitulação civilizacional da Europa às mãos da contracultura destrutiva introduzida pelo progressismo soviético, o tal que propagava que a religião era o «ópio do povo» para divinizar o seu novo ente supremo, o Comunismo. O papel da Cúria Romana acabou por ser decisivo no escancarar das portas das sociedades europeias ocidentais no seu ponto mais sensível, ao ataque à sua identidade civilizacional contruída ao longo de dois milénios em torno do cristianismo, identidade bastante fragilizada num contexto de extinção do latim.

Daí o terreno social apelativo para o avanço do esquerdismo que, na hora da verdade, nunca protege a Igreja Católica porque não protege a sua alma originária, a civilização europeia.

No caldo espiritual e cultural populares empobrecidos desde os anos sessenta, a Igreja Católica só tem de se queixar de si mesma. Verdadeiro sábio, o Papa Bento XVI, em 2007, sem impor contrarroturas internas, avançou para um exercício de arrependimento e contrição face a um desvio imposto aos católicos desde o Vaticano II (1962-1965) e, sobretudo, desde 1970 com o Papa Paulo VI. No entanto, em 2021 o Papa Francisco voltou a teimar no mesmo contra o que se rotula de «ultraconservadores» da Igreja Católica, a tal alegada «extrema-direita».

Crentes e não crentes, resta a cada um de nós fazer a sua parte em homenagem a Bento XVI, Papa que soube salvar uma semente civilizacional milenar preciosa antes da mesma secar em definitivo. Que nenhum europeu continue a fazer de inocente, antes que bata no peito: «Por minha culpa, minha culpa, minha tão grande culpa»!

Prof. Gabriel Mithá Ribeiro
Deputado do Chega


Fonte: Observador

terça-feira, 30 de julho de 2024

De Deus não se zomba

No primeiro domingo de Setembro, um indivíduo que primava pelas suas ideias irreligiosas, andava à caça nas margens do Garonne, rio de França, quando tentou vadeá-lo para a margem oposta. O infeliz, porém, foi arrastado pela corrente e seu corpo não mais foi achado.
Este desgraçado, bem conhecido de todos os seus patrícios pelo implacável ódio com que perseguia a religião e pelo ardente zelo com que promovia os enterros civis, havia-se sempre oposto ao baptismo de seus filhos; e quando soube que o mais velho fora baptizado sem seu conhecimento, tomado de furor, foi com ele a ter com o pároco, exigindo-lhe que desbaptizasse seu filho e que riscasse seu nome dos registos da Igreja.
O povo, quando soube das circunstâncias de sua morte, comentava com as seguintes e semelhantes reflexões: Já que ele não quis baptizar seus filhos, apanhou um mergulho como ele nunca esperava; e em vez d'um grupo de empavesados mações que seguissem seu cadáver à sepultura, teve o silencioso e igualmente civil cortejo dos peixes do Garonne.
É assim que a Divina Justiça pune muitas vezes aos que d'Ela riem e motejam.

«Voz de S. António: Revista Mensal Ilustrada», 2º Ano, Nº 22, Outubro de 1896

Fonte: Veritatis

segunda-feira, 29 de julho de 2024

Mãe conta a Família como começou a ir à Missa Tradicional

Leila Marie Lawler é esposa de um, mãe de sete e avó de quatorze...até agora. Vive no centro de Massachusetts. Encontrou o Cristianismo quando ainda era estudante e entrou na Igreja Católica em 1979, ano em que se casou com Philip Lawler, um conhecido jornalista católico. No seu blog descreveu como a sua Família começou a ir à Missa Tradicional numa paróquia da Fraternidade de São Pedro (FSSP):

Recentemente, começámos a frequentar uma paróquia da FSSP, depois de anos numa paróquia menos do que morna. Estávamos com medo que os nossos filhos ficassem assustados, ou confusos, e que não seriamos capazes de explicar o que estava a acontecer. Mas descobrimos que os nossos filhos estavam mais atentos à Missa, mais admirados, e todos estávamos mais conscientes dos mistérios que nos cercavam. 

Tivemos dificuldade em explicar isto a amigos que estão perplexos por lá termos ido, quando há uma paróquia a 20 minutos de nossa casa, que às vezes tem Missa Novus Ordo em latim. Mas além dessa também tem uma Missa para adolescentes, uma Missa de cânticos contemporâneos, uma Missa de cânticos tradicionais, etc. É como escolhermos o nosso próprio livro de aventuras ou escolher o sabor do gelado! 

Quando vamos à paróquia da FSSP sabemos o que lá vamos encontrar. Missa baixa ou Missa Solene. Tradição sem pedir desculpas por isso. E descobrimos, durante a COVID, que também nos oferece um pouco de normalidade quando o resto do mundo fica louco. Mais tempo para confissões, mais Missas. Estes padres estão a trabalhar no duro para levar os sacramentos aos fiéis. É fantástico.

domingo, 28 de julho de 2024

Origem dos Guardas Florestais

Foi nos bons tempos da Monarquia Portuguesa que surgiram os elementos dedicados à conservação do Pinhal do Rei e das florestas portuguesas. Inicialmente, tratavam-se de simples couteiros que com o passar do tempo viram as suas funções ampliadas, atingindo, em 1605, o número de 24.
Mas foi no reinado do bom Rei João VI de Portugal, cognominado ‘O Clemente’, que efectivamente foi criada a carreira de guarda-florestal, integrada no quadro da Administração Geral das Matas, e foi em 1856, no reinado do Bem-Amado e pragmático El-Rei Dom Pedro V, que começaram a usar o uniforme específico que duraria até 1905, data da sua substituição por novo fardamento.
De entre as funções dos guardas-florestais destacavam-se: evitar incêndios criminosos, deter pirómanos, observar as florestas para evitar incêndios ou a sua progressão, zelar pela não realização de queimadas, fiscalização do abate autorizado e da madeira que saía da mata, medições de lenhas e madeiras, assim como proceder a sementeiras das espécies arvoráceas, arbustivas, herbáceas e graminosas autóctones, limpezas, autos de marca e, tal-qualmente, algum trabalho administrativo.

Foram extintos, durante a república, pelo Decreto-Lei 22/2006 de 22 de Fevereiro!

Fotografia: Guarda do Piquete de Fogos do Corpo da Guarda-Florestal, 1905

Miguel Villas-Boas

Fonte: Plataforma de Cidadania Monárquica

sexta-feira, 26 de julho de 2024

Sant'Ana, Mãe de Nossa Senhora e Avó de Jesus

Santa Ana, ou Sant'Ana - do hebraico Hannah: Graça - foi a Mãe de Maria Santíssima e pertencia à família do sacerdote Aarão. O seu marido, São Joaquim, homem pio, fora censurado pelo sacerdote Rúben por não ter filhos. Segundo narra a Tradição, Rubén parou Joaquim quando este estava para entrar no Templo para levar a sua costumeira oferenda anual em dinheiro e disse: “Tu não tens o direito de ser o primeiro, porque não geraste prole”. 

Sant’Ana já era idosa e estéril, e São Joaquim não queria tomar outra mulher para gerar filhos, segundo os costumes hebraicos, porque amava a esposa. Confiando no poder divino, São Joaquim retirou-se ao deserto para rezar e fazer penitência. Ali um anjo do Senhor apareceu-lhe e disse que Deus havia ouvido as suas preces. Tendo voltado a Jerusalém, ambos se encontraram na Porta Áurea. 

Algum tempo depois Sant’Ana, a quem também aparecera concomitantemente um anjo (“Ana, Ana, o Senhor ouviu a tua prece e tu conceberás e parirás e falar-se-á da tua prole em todo o mundo”), ficou grávida. A paciência e a resignação com que sofriam a esterilidade deu-lhes o prémio de ter por filha aquela que havia de ser a Mãe de Jesus. 

O santo casal residia em Jerusalém, perto da Porta dos Leões, ao lado da piscina de Betesda, onde hoje se ergue a Basílica de Sant'Ana, construída pelos Cruzados e cuidada pelos Padres Brancos (Sociedade dos Missionários da África). Num Sábado, 8 de Setembro do ano 20 a.C., nasceu-lhes uma filha que recebeu o nome de Miriam - do hebraico: "Senhora da Luz", passado para o latim como Maria. 

Os pais de Maria nunca foram nomeados nos textos bíblicos; a sua história foi narrada pela primeira vez nos apócrifos¹ Protoevangelho de Tiago e Evangelho do Pseudo-Mateus². Depois foi enriquecida de detalhes hagiográficos no curso dos séculos, incluindo a Legenda Aurea de Jacopo de Varazze. 

A Tradição conta que as relíquias de Sant’Ana foram salvas de serem destruídas pelo centurião Longinho. Os restos foram custodiados na Terra Santa até que, por obra de alguns monges, chegaram a França, onde permaneceram durante anos. Durante as incursões otomanas, o inteiro corpo da Santa foi guardado num caixão de cipreste e murado, por precaução, que se encontrava numa capela escavada sob a nascente catedral de Apt. Muitos anos depois, o corpo foi encontrado, graças a diversos milagres e graças também a uma inscrição em grego. De seguida, o corpo foi desmembrado e as relíquias enviadas por toda parte do Ocidente. Actualmente, o crânio está em Castelbuono, na Sicília, onde no dia 27 de Julho é levado em procissão. Entre os milagres, conta-se o do "lumezinho" que permaneceu aceso ao lado do caixão durante anos, apesar da ausência de ar.

A mãe da Virgem possui os mais diferentes patronatos, quase todos ligados a Maria; por ter levado no ventre a Esperança do Mundo (Maria), o manto de Sant'Ana é verde. Por isso na Bretanha, onde são devotíssimos, é invocada na colheita do feno. Por ter custodiado Maria como uma jóia num cofre, ela é patrona dos ourives e tanoeiros. Protege também os mineiros, os marceneiros, os carpinteiros e os oleiros. 

Por ter ensinado à Virgem a cuidar da casa, tecer e costurar, é a padroeira dos fabricantes de vassouras, dos tecelões, dos costureiros, dos fabricantes e comerciantes de tecidos. É sobretudo a padroeira das mães de família, das viúvas, e, por ter concebido a mais alta das criaturas humanas, sobretudo das parturientes; é invocada nos partos difíceis e nos casos de esterilidade conjugal.

in Pale Ideas


quinta-feira, 25 de julho de 2024

São Tiago Maior, íntimo de Nosso Senhor


Hoje é dia de São Tiago, ou Santiago. Filho do pescador galileu Zebedeu, era o irmão mais velho de S. João Evangelista e não de São Tiago Menor, a quem se costuma confundir como irmão mais novo. Junto com João foi chamado por Cristo para tornar-se, com Pedro e André, num dos apóstolos. O epíteto o Maior significa justamente que foi um dos primeiros chamados. Junto a São Pedro e São João assistiu à Transfiguração e à Agonia de Cristo, no monte das Oliveiras. 

O glorioso Apóstolo Santiago, Maior, Luz e Patrono das Espanhas, foi natural da Província de Galileia, filho do Zebedeu e de Maria Salomé (filha de Alfeu ou Cleofas, irmão de São José, e de Maria: Maria de Cleofas), e irmão maior de São João Evangelista, e primo de Jesus Cristo, segundo a carne. Foram pescadores, ambos os irmãos, como o foi o Pai Zebedeu, que vivia nas margens do mar da Galileia e devia ser pescador rico, pois tinha navio próprio e criados. São Jerónimo diz que eram nobres. Quanto à vida de Tiago, deveremos tirar o que dele e do seu irmão dizem os sagrados evangelistas. 

Estando um dia com o pai e o irmão a consertar redes, passou Jesus e disse-lhes: “Sigam-me”. João e Tiago imediatamente obedeceram; deixaram o pai e as redes e seguiram Jesus, como fiéis discípulos, para todo o sempre. Eles sempre estavam no grupo dos três: Pedro, Tiago e João. Eram, talvez, os mais íntimos.

Podemos entender também o pedido feito a Jesus, por Maria Salomé, de que os colocasse no seu Reino, um à sua direita e o outro à sua esquerda. Era um pedido de mãe; porém, provavelmente ela expressou o desejo mais íntimo dos dois apóstolos.

Naquele momento, Jesus, sem considerar o parentesco, repreendeu-os ainda e disse: “Não sabeis o que pedis. Podeis beber o cálice que eu hei de beber?”. Eles prontamente responderam: “Podemos”. Por fim o Senhor afirma que tal decisão cabe tão somente ao Pai.

Depois de os ter chamado, o Senhor mudou-lhes o nome, chamando-lhes Boanerges, que quer dizer, Filhos do trovão. Isto é coisa particular, digna de consideração, pois que só a São Pedro e a estes dois irmãos, entre todos os apóstolos, lemos que o Senhor lhes trocou os nomes. 

A Pedro, mudando-lhe o nome de Simão em Pedro ou Cefas, porque seria a cabeça da Igreja e a pedra fundamental sobre a qual, depois de Cristo, ela deveria edificar-se. E a São Tiago e São João, porque depois de São Pedro, seriam os mais próximos, familiares, mais favorecidos e prendados, como se vê em muitas coisas que lhes comunicou, excluindo os restantes. 

Levou-os consigo quando foi ressuscitar a filha do Chefe da Sinagoga, quis que fossem testemunhas da glória da sua sagrada humanidade, quando se transfigurou, e resplandeceu o seu divino rosto mais que o Sol no monte Tabor. Somente levou os três consigo, deixando os outros, quando foi rezar no horto de Getsémani e lhes mostrou a sua tristeza e agonia, a fim de o verem desfigurado e suando sangue, ao que antes tinham visto cheio com tanta glória e claridade. 

O evangelista Lucas narra um facto que caracteriza bem a índole dos dois irmãos, como também a sua dedicação e fidelidade ao Mestre. E deu-lhes o nome de Filhos do trovão, como principais capitães do seu exército e que com a voz sonora da sua pregação e doutrina, a jeito de trovão, haveriam de espantar e converter o mundo e trazê-lo ao conhecimento e Fé no seu criador. 

E embora isto seja mais evidente em S. João, fundador, pai e mestre de todas as igrejas da Ásia, o qual fixando, como Águia-real, os seus limpos e agudos olhos nos raios do Sol, nos mostrou a geração do Verbo eterno. E, enquanto se ouviam trovões e relâmpagos espantosos do céu, também se cumpriu em Santiago, seu irmão que para além de ter pregado na Judeia e em Espanha, defendeu tantas vezes estes reinos e como terrível trovão e furioso raio, desbaratou e destruiu os exércitos dos mouros e de outros inimigos dos cristãos. E, com apoio e protecção deste glorioso apóstolo, os espanhóis levaram por todo o mundo o estandarte da cruz e plantaram nas Índias e noutras províncias e reinos a doutrina evangélica e deram a conhecer a gentes cegas os resplendores da divina luz. 

E refere o evangelista São Lucas que indo o Senhor, próximo da Páscoa, a Jerusalém, enviou alguns dos seus discípulos adiante à cidade de Samaria onde haviam de passar, a fim de que preparassem o que haviam de comer. Porventura, como reconheceram, por seus modos e traje, que eram judeus e de diferente religião da sua, não foram bem recebidos pelos Samaritanos que não quiseram tratar com eles, nem admiti-los na sua cidade. 

Quando São Tiago e São João, seu irmão que eram filhos do trovão, viram a descortesia dos Samaritanos, movidos de zelo e desejosos de vingar a injúria que se fazia a Cristo, disseram-lhe: Senhor, não quereis que façamos descer fogo do céu e que toda esta gente seja abrasada? Mas o Senhor respondeu-lhes: Não sabeis de que espírito sois, dando a entender que aquele espírito e zelo que os movia, era espírito de vingança e não de brandura, espírito do Velho Testamento e não do Novo, de Elias e não de Jesus Cristo, o qual como tinha vindo a ensinar e ganhar os pecadores, assim o modo de os ensinar e ganhar devia ser brandura, suavidade e caridade evangélica.

Tiago, o irmão mais velho, sempre foi uma referência para João evangelista e para os demais discípulos, pois era corajoso e determinado. Santo Epifânio afirma que Tiago viveu sempre em perfeita castidade.

in Pale Ideas


quarta-feira, 24 de julho de 2024

A censura na Europa

Elon Musk revelou há dias que a Comissão Europeia propôs às plataformas de redes sociais acordos ilegais secretos no período que antecedeu as recentes eleições europeias. O acordo pretendido pela Comissão Europeia pressupunha que as redes sociais censurassem os conteúdos nas respectivas plataformas, se forma sigilosa e, por contrapartida, estas estariam imunes a processos judiciais que levariam à imposição de multas gigantescas e restrições à sua actividade comercial ao abrigo do chamado Regulamento dos Serviços Digitais.

O X (ex-Twitter) recusou o acordo, mas Musk afirma que o Facebook e a Google o aceitaram.

É extraordinária a hipocrisia e o cinismo da Comissão Europeia. É que Bruxelas tem alertado constantemente para uma suposta ameaça da Rússia à Europa por via da disseminação de notícias falsas, desinformação e discursos de ódio provenientes do regime de Putin. Mas se isto é verdade, é bom que os cidadãos europeus estejam conscientes de que os ataques à sua liberdade e atitudes antidemocrática censórias são também o modo de acção das elites da União Europeia.

Este desprezo pelos cidadãos e pela democracia assenta na húbris e presunção institucionalizada de que os burocratas e decisores da União Europeia sabem o que é melhor para a sociedade e, portanto, devem eles decidir em nome dos europeus o que é um discurso aceitável, o que pode e não pode ser dito online, e prevenir que informação inconveniente chegue à população que não tem a mesma capacidade de discernimento e cultura das elites.

O Regulamento dos Serviços Digitais não passa de máscara sob a qual a elite da União Europeia exerce o seu poder, subvertendo os valores europeus da democracia e da liberdade de expressão. É um subterfúgio para controlar narrativas úteis aos interesses da oligarquia dominante que passa por exemplo por instrumentos como os chamados “verificadores de factos” ou polígrafos, pela programação centralizada dos algoritmos para remoção de certas publicações e cancelamento de utilizadores inconvenientes, etc.

Esta forma de manipular os cidadãos tem sido consentida e mesmo apreciada pelos partidos portugueses, da esquerda à direita.

A censura regressa à Europa promovida por dirigentes políticos com a cumplicidade activa de algumas Big Tech e passiva dos media tradicionais que beneficiam do ataque contra os novos meios de comunicação.

Dir-se-ia que se adoptarmos como princípio de prudência considerar as narrativas dos burocratas de Bruxelas e de grande parte dos nossos jornais e televisões como desonestas e mentirosas, estaremos mais bem informados e mais próximos da verdade dos factos.



Fonte: Blasfémias

terça-feira, 23 de julho de 2024

A tolerância e o comércio

A tolerância, dizem os Iluminados, enriqueceu o comércio e faz florescer o Estado. Estão enganados, lhes respondo eu, e estupidamente enganados. O que por meio do comércio enriquece o Estado são as próvidas ordenações, a sagaz perícia, a indústria laboriosa, e a economia prudente, a boa-fé incorrupta, a abundância dos géneros, e das manufacturas: eis aqui o que faz florescer o Estado pelo comércio, e não a tolerância de toda a Religião e irreligião. Viram-se Estados tolerantes sem comércio, e Estados intolerantes de grande comércio e riquezas; baste Portugal para exemplo, e houve Estados em que a tolerância contribuiu para empobrecer os domésticos e enriquecer os estranhos. Se para o comércio mais florescente é precisa alguma tolerância, é a tolerância de outra Religião, e não a tolerância da irreligião, e a gente útil para o comércio não são os Doutores do Epicurismo e do Ateísmo, são homens a quem basta a tranquilidade na crença em que foram educados, porque eles em seus tráficos também se não embaraçam com a crença dos outros. Aqui podia ter lugar a questão sobre o negócio dos Livros, que tão recomendado tem sido pelos Iluminados. Direi a este respeito uma palavra só: os Livros são para a alma o que são os alimentos para o corpo; é justo que haja abundância ou fartura de uns e de outros. Vigia-se com cem olhos para que sejam são os alimentos que sustentam o corpo, parece que também deve haver algum cuidado que não sejam pestilentes os alimentos da alma. Não são os Iluminados os que devem dar Leis a este respeito; isto toca a uma prudente e religiosa política; esta deve ordenar as coisas de tal maneira que o comércio aproveite sem que o Cristianismo padeça; nem se estraguem os bons costumes que são mais proveitosos à República [= coisa pública, Estado] que todos os tráficos.

Pe. José Agostinho de Macedo in «Refutação dos Princípios Metafísicos e Morais dos Pedreiros Livres Iluminados», 1816


Fonte: Veritatis

segunda-feira, 22 de julho de 2024

12 importantes proveitos da Oração Mental

Os proveitos que se tiram de exercitar a oração mental são tantos, e tão importantes, que para os declarar seriam necessários muitos livros. Nós neste lugar, para tocarmos alguma parte de seus louvores, somente compararemos a Oração à Árvore da vida, que São João viu no Paraíso celestial; e da qual diz, que produzia doze géneros de frutos. Porque verdadeiramente a Oração Mental é uma árvore plantada pela mão de Deus no Paraíso da Igreja para sustento da vida espiritual: sua é aquela grande excelência de ser um colóquio da alma com o mesmo Deus; e daqui procedem seus copiosíssimos, e dulcíssimos frutos, que podemos reduzir aos doze seguintes:

I. A Oração Mental reforma eficazmente a vida, e arranca de raiz os vícios, que com nenhum outro remédio se podiam arrancar: e cada dia nos está mostrando a experiência, que pecadores, mui envelhecidos em seus maus costumes, com pouco tempo, que usaram este exercício, se tornaram tão outros, que o mesmo Confessor os desconhece. E também purga os pecados da vida passada; porque o pecador os chora novamente cada dia, e quando chega ao Sacramento da Confissão, leva deles exame mais cuidadoso, e contrição mais viva.

II. Alcança grande luz das verdades, e mistérios de nossa Santa Fé, conforme aquilo do Salmo: "Chegai-vos a Deus, e sereis alumiados" (Salmo 34). Donde vem, que um rústico, ou uma mulher simples com oração, entende às vezes estes pontos com maior firmeza, e clareza, que um Teólogo sem oração: verificando-se a sentença de Cristo, falando com Seu Eterno Pai: "Escondestes estas coisas aos sábios, e as revelastes aos pequenos"

III. Faz que saibamos discernir as inspirações da graça Divina, e moções do Espírito Santo: coisa, que sendo tão importante para o governo da vida cristã, os mundanos a não entendem, nem observam, e assim andam às escuras.

IV. Purifica, e endireita a intenção, com que fazemos as obras boas, (como o leme endireita toda a nau) e por conseguinte as faz mais agradáveis a Deus, mais rendosas para nós, e mais exemplares para o próximo. Porque quem obra depois que ora, não segue tanto os impulsos da natureza, como os ditames da razão, e luz da graça; e o concerto de suas acções, e honesto fim, que com elas pretende, lança de si certo resplendor, que bem se deixa conhecer de fora.

V. Despega o coração das coisas transitórias, e o levanta às eternas; porque o amor a qualquer criatura segue o conhecimento que dela temos; e como com a luz da Oração se descobre a vileza dos bens caducos, e a excelência dos eternos, a estes vai buscar o coração, desprezando aqueles.

VI. Consola, e fortalece nas tribulações; e por isso os Santos em todos seus trabalhos se acolhem a esta cidade de refúgio, e dela saem tão animosos, que não só rebatem, mas ainda desafiam o Mundo, e o Inferno. Santo Inácio de Loyola dizia, que se alguma coisa lhe poderia dar pena, seria o desfazer-se a Companhia; mas que com meia hora de Oração ficaria sossegado.

VII. Amedronta grandemente os demónios, e descobre as ciladas, que nos armam; porque a oração dá asas ao espírito, o põe em lugar alto, donde as possa descobrir; e como diz o Espírito Santo: "Debalde se lançam as redes à vista dos que têm asas" (Prov. 1,17). Dá também esforço para vencermos suas tentações: "Orate ne intretis in tentationem". Por onde disse S.João Clímaco: "Qui baculum orationis jugiter tenet non offendet; sed si offendere eum contigerit, non penitus cadet"- Quem tem na mão o báculo da Oração continuamente, não tropeçará; e se suceder que tropece, não cairá de todo.

VIII. Desterra as tristezas do coração. Sente-se triste algum de vós outros? (diz o Apostólo S.Tiago 5,13) Pois ore. E esta alegria, que aqui se comunica, não é exterior, e falsa, como a que causam as criaturas; senão interior, e verdadeira: porque enfim é causada do Espírito Santo, consolador óptimo, doce hóspede, e doce refrigério das almas.

IX. Adoça, e facilita o exercício da mortificação: o qual por uma parte é necessário para despirmos o amor próprio, causa de todas nossas misérias; e por outra é muito amargoso, e contrário à natureza: e querer dobrar, e amoldar esta sem primeiro meter o espírito na forja da Oração, seria bater em ferro frio.

X. Gera grande paz de consciência: porque cessando os pecados, cessão os remorsos, e o Espírito Santo lá dentro da alma dá testemunho, que mora nela. Daqui nasce, que a morte das pessoas habituadas a este Santo exercício é mais desassombrada; por quanto a má consciência é a que nos faz mais horrorosa a passagem para a Eternidade.

XI. Alcança de Deus Nosso Senhor grandes favores, e mercês: porque da Oração nasce o conhecimento de que necessitamos delas, o desejo de as procurarmos, a confiança, resignação, e perseverança para as pedirmos,e a humildade para as conservarmos: e ali se granjeia a devoção com Maria Santíssima, a familiaridade com os Anjos; tudo disposições para sairmos com bom despacho: e assim São João Crisóstomo chamou à Oração 'omnipotente'.

XII. Une os próximos entre si, porque une cada um com Deus: e daqui vem, que nas Comunidades, e famílias, que tem exercício quotidiano de Oração Mental, reina mais a paz do Senhor, e custam menos desvelo a quem as governa.

Padre Manoel Bernardes in 'Tratado breve da Oração Mental'

domingo, 21 de julho de 2024

19 de Julho de 1415 - Morre D. Filipa de Lencastre


A Rainha Dona Filipa de Lencastre (em inglês: Philippa of Lancaster; Leicester, c. Março de 1360 — Odivelas, 19 de Julho de 1415), nasceu no Castelo de Leicester e era uma princesa inglesa da Casa de Lencastre, filha mais velha de John de Gaunt ou Gante, 1.º Duque de Lencastre iuris uxoris , i.e., "em direito de uma esposa", e de Blanche de Lancaster. Neta do Rei Eduardo III de Inglaterra, quando tinha 18 anos, Lady Philippa foi agraciada com a dignidade inglesa de Dama da Ordem da Jarreteira.
Lady Philippa foi primorosamente educada para uma mulher da época e estudou ciências com Frei John, poesia com Jean Froissart, e filosofia e teologia com John Wycliffe.

Consumada a Vitória na Batalha de Aljubarrota sobre os Castelhanos, El-Rei D. João I informou prontamente os seus aliados ingleses através de John de Gaunt, Duque de Lencastre, e filho do Rei Eduardo III de Inglaterra.
Bem sabia Dom João I que a situação do Reino de Portugal era ainda periclitante e que certamente seria ainda acossado por Castela se não fosse encontrado um equilíbrio externo para defender Portugal de uma eventual guerra com o Reino vizinho. Importava, pois, garantir o futuro político português como Nação independente, através da consolidação dos acordos de amizade e apoio mútuo de 1373 entre Portugal e a Inglaterra.
Para isso, Dom João I enviou a Inglaterra os plenipotenciários D. Fernando de Albuquerque (Mestre da Ordem de Sant'Iago) e o chanceler Lourenço João Fogaça para negociar um acordo de aliança política e militar, favorável a ambos.
O Rei Ricardo II de Inglaterra, após as conversações iniciais, designou então três procuradores para a elaboração do texto final do Tratado de amizade com Portugal.
O Tratado foi finalmente assinado, no Castelo de Windsor, a 9 de Maio de 1386, tendo cinco procuradores testemunhado a assinatura do acordo entre o Soberano inglês e os delegados régios portugueses.
O Tratado possuía carácter quer defensivo, enquanto salvaguarda dos interesses de ambas as partes, em aliança, contra inimigos que passavam a ser comuns, quer ofensivo, porque visava uma colaboração entre Portugal e Inglaterra contra Castela e França. Todavia, era também uma aliança que visava a manutenção do bem e da tranquilidade públicos das populações dos reinos de Inglaterra e Portugal.
O comércio marítimo era também um dos objectos abrangidos no tratado. De acordo com o tratado de Windsor nenhuma das partes contratantes poderia fretar navios ou embarcações inimigas ou prestar socorros a nações que se encontrassem em conflito com qualquer um dos reinos. Se alguma das partes tomasse conhecimento de algo que fosse contra as disposições do tratado ou os interesses da outra parte, teria que intervir rapidamente para que depressa se eliminasse esse perigo ou infração do tratado. Antes do Tratado de Windsor nenhuma outra aliança concertada na Europa tinha sido tão abrangente.
A aliança consolidou-se, em 1387, pelo casamento, no Porto, d’El-Rei D. João I com a Princesa Inglesa Lady Philippa of Lancaster.
Foi no encontro com John of Gaunt, pai de Philippa, para negociar o apoio que o monarca português poderia dar à causa do duque inglês - que se proclamava rei de Leão e Castela e queria reconquistar o trono -, em Ponte de Mouro a 1 de Novembro de 1386, que D. João I tomou a decisão de casar com Philippa of Lancaster.
Assim, D. Filipa de Lencastre chegou a Portugal, com 27 anos – idade pouco comum para a época – e casa com D. João I, a 2 de Fevereiro de 1387, no Paço Episcopal anexo à Sé Catedral da cidade do Porto, tornando-se Rainha-consorte de Portugal. O matrimónio, esse, foi comemorado por todo o reino durante quinze dias, cimentando a Aliança Luso-Britânica. Em 1372, El-Rei D. Fernando de Portugal e o poderoso magnate inglês John de Gaunt, Duque de Lencastre (filho de Eduardo III de Inglaterra) firmaram uma aliança contra Castela e Aragão, que o duque se preparava para guerrear, aliança cimentada no Tratado Anglo-Português de 1373, e que é mais antiga aliança diplomática do mundo ainda em vigor. Foi com base neste Tratado de aliança que os ingleses, com os seus poderosos arqueiros, lutaram ao lado da Casa de Avis na Batalha de Aljubarrota, em 14 de Agosto de 1385. Depois dos ingleses lutarem ao lado dos portugueses contra os castelhanos e franceses na batalha, foi assinado o Tratado de Windsor, em 9 de Maio de 1386, com o intuito de renovar a Aliança. Foi no âmbito desta aliança que se organizou o casamento entre o Rei D. João I e a Princesa Philippa, para cimentar as relações e a aliança anglo-portuguesa.
Casamento de D. João I e D. Filipa de Lencastre, excerto da ‘Crónica de D. João I’ de Fernão Lopes:
‘E El Rei saiu daqueles paços em cima de um cavalo branco, em panos de ouro realmente vestido; e a rainha em outro tal, mui nobremente guarnida. Levavam nas cabeças coroas de ouro ricamente obradas de pedras de aljofar e de grande preço, não indo arredados um do outro, mas ambos a igual. Os moços de cavalos levavam as mais honradas pessoas que eram e todos de pé muito corregidos. E o arcebispo levava a Rainha da rédea. Diante iam pipas e trombetas e outros instrumentos que se não podiam ouvir. Donas filhas dalgo isso mesmo da cidade cantavam indo de trás, como é costuma de bodas. A gente era tanta que se não podiam reger nem ordenar pelo espaço que era pequeno dos paços à igreja e assim chegaram à porta da Sé, que era dali muito perto, onde dom Rodrigo, bispo da cidade, já estava festivalmente em pontifical revestido, Esperando com a cleresia. O qual os tomou pelas mãos, e demoveu a dizer aquelas palavras que a Santa Igreja manda que se digam em tal sacramento. Então disse a missa e pregação; e acabou seu ofício, tornaram El Rei e a Rainha aos paços donde partiram com semelhante festa, onde haviam de comer. As mesas estavam já guarnidas e todo o que lhe cumprira; não somente onde os noivos haviam de estar, mas aquelas onde era ordenado de comerem bispos e outras honradas pessoas de fidalgos e burgueses do lugar e donas e donzelas do paço e da cidade. E o mestre-sala da boda era Nuno Álvares Pereira, Condestável de Portugal; servidores de toalha e copa e doutros ofícios eram grandes fidalgos e cavaleiros, onde houve assaz de iguarias de desvairadas maneiras de manjares. Enquanto o espaço de comer durou, faziam jogos à vista de todos, homens que o bem sabiam fazer, assim como trepar em cordas e tornos de mesas e salto real e outras coisas de sabor; as quais acabadas, alçaram-se todos e começaram a dançar, e as donas em seu bando cantando a redor com grande prazer.’
Chegada à corte portuguesa, D. Filipa não negou a Sua estirpe, e tratou de implementar o protocolo, etiqueta e regras do seu país natal. Também, a praxe das refeições foi alterada introduzindo se o hábito de se lavar as mãos antes e depois das refeições, os alimentos passam a ser manuseados de forma higiénica. Desempenhou, também, um importante papel na política da Corte e, apesar de não mais ter pisado solo inglês, não se manteve alheia da inglesa, correspondendo-se por carta com o pai e irmão o Rei Henry IV.
Do casamento com D. João I nasceu a Ínclita Geração: D. Duarte, de seu verdadeiro nome Edouard – influência inglesa da mãe -, que foi rei; o Infante D. Pedro, Duque de Coimbra senhor de grande cultura , conhecido como o "Príncipe das Sete Partidas"; o Infante D. Henrique, Duque de Viseu e promotor e impulsionador dos Descobrimentos marítimos Portugueses; D. Isabel, mais tarde Duquesa de Borgonha, sábia administradora do território governado pelo seu marido, Filipe, o Bom; o Infante D. João, designado em 1418, Mestre da Ordem de Santiago de Espada; e o Infante D. Fernando, conhecido como o "Infante Santo", que morreu, em Fez. Ilustres filhos a que não foi alheia a educação ministrada pela Mãe.
A Rainha D. Filipa de Lencastre participou ainda com as suas ideias na idealização e construção do Mosteiro da Batalha. Não menos importante foi o seu incentivo à expedição a Ceuta.
A Rainha foi tocada pela peste em 1415, morrendo a 19 de Julho, poucos dias antes da partida da expedição a Ceuta.
A 21 de Agosto de 1415 o exército Português sob o comando d’El-Rei D. João I de Portugal, desembarca em Ceuta, conquistando a cidade norte-africana.
Finda uma noite de intensa peleja, pela manhã de 22 de Agosto, Ceuta estava abduzida pelas tropas portuguesas, e coube a D. João Vasques de Almada hastear a bandeira de Ceuta, com os gomos brancos e pretos como na bandeira de Lisboa, e com o então brasão de armas do Reino de Portugal ao centro, e que perdura até aos dias de hoje.
Após a tomada da mais bela e mais florescente cidade da Mauritânia, no norte de África, El-Rei Dom João I procede ao ritual de armar cavaleiros os filhos D. Duarte, D. Pedro e D. Henrique, que se haviam ilustrado pelas armas no campo de batalha.
Após a Santa Missa, os três Infantes, usando reluzentes armaduras, foram armados cavaleiros pelo Rei seu Pai, com a espada abençoada pela Rainha Dona Filipa de Lencastre, mulher de D. João I e mãe de tão Ínclita Geração.

Miguel Villas-Boas

sexta-feira, 19 de julho de 2024

SAR, O Senhor D. Afonso no jantar de homenagem ao Fra' D. Ruy Villas-Boas, da Ordem de Malta


A Delegação Portuguesa da Ordem Constantiniana realizou no dia 15 de Julho, por indicação do seu Grão-Mestre S.A.R. o Duque de Castro, um jantar de homenagem ao Fra' D. Ruy Villas-Boas, da Ordem de Malta, a quem foi concedida a Grã-Cruz de Justiça. O jantar realizou-se no Grémio Literário e contou com a presença de S.E.R. o Patriarca de Lisboa e Capelão-Chefe da Ordem Constantiniana, de S.A.R. o Príncipe da Beira, de S.E. a Sec. Estado da Gestão da Saúde, de S.E. o presidente C.M. Alcanena, do Rev. Conselheiro da Nunciatura, do Chefe Gab. Pres. C.M. Alcanena, do Secretário Ass. Cav. Port. Ordem Malta e do Rev. Reitor da Igreja da Memória e Capelão da Ordem Constantiniana, entre muitos membros da Ordem Constantiniana e amigos.

quinta-feira, 18 de julho de 2024

Pio XII teceu os maiores elogios aos portugueses

Como foi possível que vós, embora sendo poucos, fizestes tanto na Santa Cristandade? Onde Portugal encontrou forças para acolher sob seu domínio tantos territórios da África e da Ásia, para estendê-lo até às mais distantes terras americanas?

Onde, senão naquela ardente fé do povo português, cantada por seu maior poeta, e na sabedoria cristã dos seus governantes, que fizeram de Portugal um dócil e precioso instrumento nas mãos da Providência, para a actuação de obras tão grandiosas e benéficas?

Sua Santidade o Papa Pio XII