segunda-feira, 24 de março de 2025

Da consideração de si mesmo

1. Não podemos confiar muito em nós, porque frequentemente nos faltam a graça e o critério. Pouca luz temos em nós e esta facilmente a perdemos por negligência. De ordinário também não avaliamos quanta é a nossa cegueira interior. A miúde procedemos mal e desculpamo-nos, o que é pior. Às vezes move-nos a paixão, e pensamos que é zelo.
 
Repreendemos nos outros as faltas leves, e descuidamo-nos das nossas maiores. Bem depressa sentimos e ponderamos o que dos outros sofremos, mas não se nos dá do que os outros sofrem de nós. Quem bem e retamente avaliasse as suas obras não seria capaz de julgar os outros com rigor.

2. O homem interior antepõe o cuidado de si a todos os outros cuidados, e quem se ocupa de si com diligência facilmente deixa de falar dos outros. Nunca serás homem espiritual e devoto, se não calares dos outros, atendendo a ti próprio com especial cuidado.
 
Se de ti só e de Deus cuidares, pouco te moverá o que se passa por fora. Onde estás, quando não estás contigo? E, depois de tudo percorrido, que ganhaste se esqueceste a ti mesmo? Se queres ter paz e verdadeiro sossego, é preciso que tudo mais dispenses, e a ti só tenhas diante dos olhos.

3. Portanto, grandes progressos farás, se te conservares livre de todo cuidado temporal; muito te atrasará o apego a alguma coisa temporal. Nada te seja grande, nobre, aceito ou agradável, a não ser Deus mesmo ou o que for de Deus. Considera vã toda a consolação que te vier das criaturas.
 
Imitação de Cristo


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