“Quem o inimigo poupa, às mãos lhe morre”.
Provérbio português (muito antigo).
Está à porta…
Mais uma vez os órgãos de soberania, não parecem estar tentados a comemorar o evento. E os órgãos de comunicação social, na sua esteira, usarão a lógica do politicamente correcto e noticiarão, maioritariamente, a efeméride com algum fastio.
Sem embargo, a data é de facto importante, uma das mais importantes do século XX português. [1]
A razão é simples, por ter afastado a hipótese – na altura muito real – de ser implantada uma ditadura comunista e “esquerdoíde”, em Lisboa e a Sul do Tejo.
No resto do país, incluindo ilhas, tal seria impossível.[2]
Tenho para mim, que todos os cursos de promoção a oficial superior e general (idem para os sargentos), não direi desde então, mas desde 1982, data da “normalização” da vida política nacional, com a extinção do Conselho da Revolução, do Pacto MFA-Partidos e a entrada em vigor da Lei 29/82 (Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas) – deveriam começar com a projecção de vários filmes, a saber: o cerco à Embaixada de Espanha e da Assembleia Constituinte[3]; o escabroso “juramento de bandeira”, de punho fechado, no Ralis, a 21/11/75, e a proclamação dos oficiais revolucionários, efectuada no dia anterior, do varandim do jardim do Palácio de Belém, fronteiro à Praça Afonso de Albuquerque.
Por último, o filme sobre a ocupação selvagem da Herdade da Torre Bela, ocorrida a 23/4/75.[4]
Tudo isto se passou no ano da graça de N.S.J.C., de 1975, mais propriamente entre o 11/3/75 e o 25/11/75, período conhecido como “Processo Revolucionário em Curso”(PREC), embora as suas raízes tivessem começado logo no dia 25 de Abril de 1974, data em que uma pequena percentagem da oficialidade decidiu tomar conta do Poder e substituir o regime então vigente (os sargentos e cabos não se envolveram na organização do golpe, ao contrário do que ocorreu, por ex., na implantação da República).
A razão por que defendo este início de actividades lectivas é simples: para que o corpo de oficiais e sargentos das Forças Armadas Portuguesas tome consciência do descalabro gigantesco; do grau de ignomínia alcançado e de como se destruiu uma Instituição Militar magnífica a qual, apenas poucos meses antes, tinha 230.000 homens, espalhados por quatro continentes e outros tantos oceanos, e se batia galharda e competentemente, em três teatros de operações distintos, separados por milhares de quilómetros entre si e a “Metrópole”, que era a sua base logística principal.
E faziam-no sem desfalecimento, há 13 anos.
Não há na História de Portugal, desde Afonso Henriques, feito que se lhe iguale.
Esta descida aos infernos – foi disso que se tratou – provocou em poucos meses, a quase destruição da Marinha, do Exército e da Força Aérea, sendo directamente responsável pela alienação em termos vergonhosos – nunca também historicamente igualados – de 95% do território nacional e 60% da sua população.
É fundamental que o corpo de oficiais e sargentos, tenha isto presente sempre, para que jamais permita que tal se possa repetir ou assemelhar!
Ainda hoje sinto profunda vergonha e revolta, por tudo o que se passou e a Instituição Militar não conseguiu até ao momento, recuperar de tudo o que ocorreu e dar-se ao respeito, e está a desaparecer em grande parte por causa disso.
Até porque não soube, não quis, ou não pôde, separar o trigo do joio justamente a seguir ao 25 de Novembro de 1975.
Tivemos, no fim, alguma sorte, pois a parte mais sã das Forças Armadas; a realidade geopolítica internacional, de então (estávamos prestes a atingir o último pico da Guerra Fria) e a índole do povo português, permitiu que as operações realizadas a 25 de Novembro de 1975 terminassem com a vitória do Bem sobre o Mal.
Foi sobretudo disso que se tratou!
Porém foi uma vitória parcial, em muitos casos, ilusória.
Vejamos:
É costume ouvir dizer-se que o 25/11 foi o marco que permitiu a concretização dos ideais de Abril.
A questão está mal colocada.
A realidade é que só se teve que fazer o 25/11 porque houve o 25/4…
O descalabro começou no próprio dia do golpe, quando os autores do mesmo, numa atitude de inacreditável ingenuidade e ignorância das realidades da geopolítica, da História e da natureza humana, deitaram tudo a perder, não declarando o estado de sítio, deixando, desse modo, vir a população para a rua.
De seguida, começaram a prender-se e a sanear-se, mutuamente, sem critério.
Tudo isto no meio duma guerra…
O resultado foi que os tais ideais de Abril – que tinham pouco a ver com os que acabaram por ficar nos livros de História – acabaram por ser consubstanciados no Programa do Movimento das Forças Armadas. Programa que nunca foi cumprido pela anarquia que se instalou no País.
Mas, após o 25/11, foi a vez das forças vencedoras revelarem quão pouco tinham aprendido com o que se tinha passado.
E permitiram que as forças causadoras de todos os males e que queriam objectivamente instaurar um estado totalitário no país, pela via revolucionária – ou seja, um conglomerado inacreditável de desvairados "esquerdoídes" e o Partido Comunista, que de português nunca teve nada – recolhessem em boa ordem de marcha, a quartéis e ganhassem, posteriormente, respeitabilidade democrática.[5]
Ora, devia ter-se aproveitado a ocasião para pura e simplesmente, proibir estas forças políticas de existirem à face da lei, pois isso era o mínimo que estas fariam a todos os outros, se porventura tivessem alcançado o Poder. Foi isso, aliás, o que fizeram, mais um rol extenso de barbaridades, que faz ter saudades do Tamerlão, sempre que tiveram oportunidade, e em qualquer parte do mundo.
E que se saiba, nenhuma dessas forças, até hoje, declarou publicamente ter renunciado a quaisquer práticas golpistas!
Sem embargo, não se coibiram de ilegalizar todos os partidos ou agrupamentos tidos por “Fascistas” – apesar de não haver nenhum, desde que o Professor Salazar esvaziou os nacionais sindicalistas de Rolo Preto, nos anos 30…
E deviam ter colocado, outrossim, atrás das grades, o então Presidente da República Costa Gomes, personalidade que até ao fim da vida andou, aparentemente, a fazer jogo duplo ou triplo com todo o mundo.
Em vez disso veio a ser promovido a Marechal…
Mais tarde veio-se a reintegrar todos aqueles que à esquerda, ao centro ou à direita tinham sido “saneados”, e com retroactivos (na tropa foram quase todos promovidos a coronel ou a sargento-chefe e até se abriu uma excepção para oficial general…) tudo se passando sem quaisquer julgamento e com critérios muito duvidosos. [6]
Ao invés, meteu-se tudo no mesmo saco e permitiram-se situações incríveis.
Tenta-se justificar esta actuação pela necessidade de apaziguar a sociedade portuguesa, mas não vejo como, gerar injustiças sobre injustiças, possa apaziguar seja o que for.
Alcandoraram-se (e condecoraram-se) uma cáfila de traidores, desertores e, até criminosos de delito comum, a funções de responsabilidade, com a justificação que combatiam a “ditadura” e o “fascismo”, confundindo conceitos e actuações, ou querendo fazer crer que na luta política vale tudo.
Despejaram em seguida subsídios para cima das pessoas; pois bem o país entrou em bancarrota e o dinheiro acabou.
A aceitação do PCP e dos "esquerdoídes", se assim lhes podemos chamar, na vida democrática, também é explicada pela necessidade de inclusão e pela “superioridade moral” da Democracia.
Ora isto parece-me tudo uma falácia, pois nem “eles” se querem incluir em coisa alguma; a sua prática enquanto poder nunca foi democrática (aliás o que é que se entende por Democracia?) e a sua ideologia é, provadamente incompetente, anti - natural e anti - humana.
Aqui não há, pois, superioridade moral, alguma, há é falta de senso, cobardia e estupidez!
E quase toda a gente embarcou nisto: os restantes partidos políticos – que não passam de aprendizes – de - feiticeiro, comparados com o PC – confiados não se sabe bem em quê, deixaram de fazer, sequer, luta ideológica, sobretudo a partir da queda do Muro de Berlim, em 1989;
A Instituição Militar foi sendo sucessivamente menorizada, desmontada e reduzida à ínfima espécie, e não conta hoje, para nada;
A Igreja é atacada no Ocidente por todos os lados, anda aperreada de receios e pouco firme nos princípios – precisa de apanhar um susto, para ver se acorda;
A Maçonaria está impante mas, como sempre também, minada por divisões de capela e por “irmãos” mais interessados em negócios, do que em rituais e trabalho de casa, além do que têm sido ultrapassados pela burocracia de Bruxelas, “Grupo de Bilderberg” e afins, e pelos poderes mais finos, do capital apátrida;
Os “parceiros sociais” entretêm-se em se anular uns aos outros, em vez de serem complementares;
Alguns “centros de reflexão” com gente preocupada e diferenciada têm, por norma pouca expressão, chovem no molhado, convertem convertidos, mas não dão as mãos em nada. Às vezes bicam-se.
Em comum, têm querer ser considerados bem comportados e refastelarem-se com umas garfadas, devidamente regadas.
A população, em geral, tem a memória curta – os jovens nem têm memória de nada! – e, por norma, não se querem chatear com coisa alguma;
Está feito o quadro.
A Nação Portuguesa, essa, anda à deriva e não se sente.
Como corolário do provérbio da citação inicial, o PC e os tais “esquerdoídes” – que odeiam tanto a sociedade que a querem andar sempre a mudar – estão 40 anos depois, (quase) no governo [7].
E condicionaram todos os anteriores.
Ainda hoje não se consegue mudar a Constituição, eivada de erros…
Pergunta-se: neste 40º aniversário do 25/11 – cuja vitória em termos militares, se deve essencialmente, às tropas “Comando” e às Esquadras de Voo, da Força Aérea – vai comemorar-se exactamente o quê?
João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador
[1] As diferentes conferências e colóquios que tem havido um pouco por todo o país têm sido, ao que sei, da iniciativa de entidades da chamada sociedade civil.
[2] Enfim, nunca se sabe, os Liberais apenas tinham 7.000 homens e poucos navios e venceram a Esquadra Portuguesa de então e os 90.000 H de D. Miguel…
[3] Ocorridos, respectivamente, em 27/9/1975 e 12/11/75.
[4] O filme foi rodado entre 1975 e 1977, e realizado pelo alemão Thomas Harlan. É uma co - produção portuguesa, italiana e alemã e existem quatro versões. A versão final estreou no cinema “King”, em Lisboa, em 2/8/2007.
[5] O PCP, partido fundado em 1921, nunca foi um partido “português”, pois esteve sempre ao serviço de uma potência estrangeira, a União Soviética, que sempre foi hostil a Portugal. Foi um partido internacionalista, directamente controlado pelo chamado Partido Comunista da União Soviética (PCUS), até o regime dos Bolcheviques ter implodido, na época Gorbatchev. Regime que apoiava directamente os movimentos independentistas que nos emboscavam as tropas. Isto costuma ter um nome…
Aliás, o PC já podia (e devia) “encolher as unhas” pois a sua grande missão estava realizada: Portugal tinha saído miseravelmente de África e o poder entregue aos movimentos marxistas e apenas a esses.
[6] E, neste âmbito, não se tratava de julgar as pessoas pelos seus ideais políticos, mas quem tinha cometido crimes ou não se tivesse conduzido “pelos ditames da Virtude e da Honra”.
[7] Mal comparado, estamos a fazer o mesmo agora com a vaga de “migrantes”. Ou seja a deixá-los entrar em catadupa e sem critério. Daqui a (menos) 40 anos falaremos.
Fonte: O Adamastor
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