sexta-feira, 26 de agosto de 2016

DUARTE NUNO DE BRAGANÇA, AQUELE QUE DEVIA TER SIDO REI



Correm este ano quatro décadas sobre a morte daquele que poderia ter sido o salvador do Estado português. Salazar foi excessivamente português no tratamento da questão sucessória que era, afinal, a mais importante. Salazar, sabendo-o, não foi suficientemente lúcido para fazer essa escolha entre a restauração e o caos. Adiou, quis satisfazer a todos, nem um sucessor escolheu e, finalmente, morreu e o poder passou para quem já evidenciava os traços desta gente que manda no país desde 1968.

Salazar sabia que o Marcelo era um biltre, que dizia mal do regime e conspirava, mas deram-lhe o poder. Marcelo foi o grande responsável pela inviabilização da solução monárquica. Os Bragança haviam cumprido escrupulosamente tudo o que Salazar pedira por ocasião do regresso da família real a Portugal, mas nada lhes foi restituído, vivendo apartados da vida pública e do contacto com os portugueses. Foi-lhes até negado um trem de vida compatível com a sua condição. A família viveu numa pelintrice indigna e até a suprema afronta de lhe destinarem uma casa onde chovia. 

Era a faceta mesquinha e aldeã de Salazar. Podendo ter arranjado um Rei de graça, um excelente Américo Tomás de sangue azul, um homem gentil e de carácter muito alemão, preferiram o caminho mais cómodo, ou seja, nada fazer. 

A restauração devia ter ocorrido em 1955 ou 1956, mas o congresso da União Nacional de 1951 impediu-o. A União Nacional passou a ser republicana. O congresso, ao votar pelo encerramento da questão do regime, deixou de poder apontar um futuro estável após o passamento do seu líder e fundador. Marcelo conseguiu-o. Era a diferença entre Salazar e o Marcelo. Como camponês, Salazar entendia a monarquia como um dado relevante do carácter nacional; Marcelo via-a como uma limitação às suas ambições de micro-burguês cheio de complexos de classe. Durante os 14 anos que sobravam a Salazar, teriam formado uma inteira geração de servidores da Coroa. E o que tivemos logo a seguir ? A campanha do Delgado. Compreende-se que depois de 1958, os monárquicos se tenham despolitizado até aos extremos de hoje. 

Até partidos poderiam ter inventado. Com uma monarquia restaurada, não teria havido golpe, revolução nem descolonização nos termos em que esta se processou. Poderia, quando muito muito, ter havido um regime à europeia, mas muito ao centro, como houve em Espanha - algo como uma UCD - sendo até possível uma democracia com muitos traços da doutrina salazariana. Se se tivesse optado por essa solução, a descolonização ter-se-ia projectado para os anos 80 ou 90, quando a URSS entrou em colapso. Não esqueçamos que entre o 25/A e a chegada de Gorbachev medeiam apenas 9 anos. Teria então sido possível negociar com os movimentos. Em 1985 , com a URSS transformada num monte de entulho, eles já seriam bem mais mansos. Mesmo que Angola e Moçambique se tivessem tornado independentes, teriam ficado Cabo Verde, S. Tomé, Cabinda e Timor. 
Uma monarquia não requer grandes reis. Basta ter um Rei, é o suficiente. Como se vê, a monarquia não era apenas uma questão decorativa. Era central. Portugal teve essa oportunidade e deitou-a fora.

Miguel Castelo Branco


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