Enquanto Portugueses, não abdicamos nem da nossa Identidade, nem (de nenhuma parte) da nossa História, nem nos deixaremos apoucar.
'A História há-de ser luz da verdade e testemunha dos antigos tempos', escreveu Fernão Lopes.
O viés político e ideológico da (in)cultura de cancelamento, woke mob e outros movimentos demagógicos, mundialistas e internacionalistas munidos de argumentatório falso escolheram a História das Grandes Nações e as suas Memórias, derradeiros resquícios dos Estados-Nação, como alvo e colocaram-nas sob ataque cerrado, de tal forma que alguns (até com grande responsabilidades), sem qualquer critério, parecem tratar com indolência o que merecia o maior respeito e orgulho.
A História do Herói e da sua acção no tempo e no espaço concomitantemente à análise de processos e eventos por ele praticados, ocorridos no passado, mas julgados à luz do processo moral (quase inquisitorial) presente, resultam em distorção e menoscabo, e isso pode moldar a opinião das massas nivelando-a pelo mínimo, pichar a pedra do conhecimento e/ou menorizar os feitos e imagem dos nossos viris illustribus.
A intolerância e repúdio pela História por determinado espectro político-social, comparado com a sua total abertura, bonomia e até carinho com que trata regimes totalitários de esquerda (e não só) e radicais intolerantes subversivos e agressivos, é preocupante. Como pode a História ser assim distorcida e corrompida pela mentira niilista e radical?
Por isso, também precisamos sem tréguas, continuar a desconstruir toda a mentira dessa poluição à ordem de interesses e agendas obscuras que tentam moldar a opinião das massas e pichar os feitos dos nossos Maiores.
O Rei Fundador, D. Afonso, O Primeiro de seu nome, Rei dos Primeiros Portugueses, nasceu (provavelmente) em 25 de Julho de 1109, e era filho do Conde D. Henrique e, portanto, neto de Henrique de Borgonha, trineto de Roberto I de França, sobrinho-bisneto do Abade S. Hugo de Cluny, e que, como tal, tinha por avoengos os Reis Capetos de França e os Imperadores romanos da Dinastia Comnenus e Paleólogo, e da Infanta D. Teresa de Leão, e como tal neto do Imperador da Hispânia, o Rei D. Afonso VI, o 1° Rei de Leão, Castela e Galiza, e de todos os Reis e Senhores de Leão e Castela.
Alphonsus Burgundiensis Primus Portugaliae Dux et Rex foi o Unificador dos 5 Reinos (Suevos, Visigodos, Lusitanos, Bracos e Alanos), o algoz do Sarraceno e o Tomador de Praças. Afonso I, mais conhecido pelo seu nome de príncipe, Dom Afonso Henriques (de Henrique, em tradução literal do patronímico Henriques), também chamado de Ibn-Arrik (“Filho de Henrique”) e El-Bortukali (“O Português”), apelidado de "o Conquistador", foi o primeiro Rei de Portugal desde 1139 até à sua morte, a 6 de Dezembro de 1185.
Em 1125, com apenas 14 anos de idade, num acto de importante relevância política, o efebo Príncipe Dom Afonso Henriques, conforme o uso e costume dos reis, arma-se a si próprio “Cavaleiro” na Catedral de Zamora, cidade onde se refugiara. O Infante Portucalense torna-se assim guerreiro e cavaleiro independente considerando legitima a pretensão de tomar o governo do Condado Portucalense, pois quando o Conde D. Henrique faleceu, em 1112, o governo do condado foi assumido por Dona Teresa, uma vez que, Afonso Henriques, o filho de ambos tinha apenas três anos de idade.
Devem-se-Lhe os Actos que levaram ao Nascimento de Portugal: no dia 24 de Junho de 1128, à dianteira dos barões e fidalgos portucalenses, Dom Afonso Henriques defrontou no campo de São Mamede, perto de Guimarães as forças galegas comandadas por Dona Teresa e por Fernão Peres de Trava, derrotando-os naquela que ficou conhecida pela Batalha de São Mamede e que marcou a Fundação da Nacionalidade Portuguesa, uma vez que o Infante Dom Afonso Henriques avoca a si o governo do Condado Portucalense, com pretensões de independência. Não é ainda após esta Batalha que se autointitula Rei, Rex Portucalensis, pois com duas frentes de Batalha – uma contra Leão e Castela, outra contra os sarracenos –, tal só se viria a acontecer após a Batalha de Ourique, em 1139, quando arrasou os mouros – que temiam sobremaneira o gigante de 1,91 metros (imagine-se aquela figura real, agigantado para a época, a surgir no horizonte a bradar a sua grande e larga espada, quase um espadão, que outros só conseguiriam manejar com ambas as mãos, e montado num portentoso Cavalo Ibérico) e Lhe chamavam o terrível Ibn Erik (Filho de Henrique) - e consegue uma importante vitória que o engrandece sobremaneira e assim declara a Independência face a Castela-Leão, após um Alevantamento seguido de Aclamação como Rei pelos Barões Portucalenses.
Com o enorme e recortado litoral português a vocação marítima deste tão grande e aventureiro Povo, virado para o imenso e misterioso Mar, era inevitável, pelo que naturalmente foi impulsionado a partir para rumos incertos descobrindo assim novos caminhos e novas terras.
Com o fim da Idade Média, encerrou-se, também, uma Era que para Portugal foi a da consolidação da Independência e afirmação como potência. Era altura de levar o Sonho Portugal mais além, e inicia-se a Época que ficará e será sempre indissociável de quando se falar de Portugal: os Descobrimentos.
É com o início da Dinastia de Avis que, de facto, a sociedade portuguesa sofre a sua maior metamorfose, pois dá-se a introdução da mentalidade Humanista do Renascimento em Portugal.
Para começar a língua portuguesa toma a sua característica e inconfundível fisionomia que é enriquecida com os neologismos que advém do contacto com as obras clássicas e esse contacto influência a mentalidade tornando-, tal-qualmente, científica. Com o Renascimento vem a ideia de tomar a Antiguidade Clássica como modelo.
A educação que Dom João I recebeu como Grão-mestre da Ordem de Avis transformou-o num Rei invulgarmente culto para a época e o seu gosto pelo saber passou-o para a sua Ínclita Geração, assim como a sua necessidade de sonhar mais longe.
A expansão portuguesa ultramarina principiou em 1415, com a conquista de Ceuta. Nem vamos abordar o papel guerreiro que o Infante D. Henrique teve nos Descobrimentos portugueses, mas sim o seu papel como patrocinador da criação de uma cadeira de Astronomia na Universidade de Coimbra, ou o seu empenho no desenvolvimento da Caravela, de portulanos, de roteiros e de instrumentos náuticos que facilitassem essas mesmas descobertas por parte dos navegadores. "O Navegador" investiu toda a sua fortuna em investigação relacionada com navegação, náutica e cartografia, dando início à epopeia dos Descobrimentos. Esta descoberta geográfica do Mundo empreendida pelos portugueses que se expandirá por séculos, é reflexo do paradigma do Renascimento na medida que o humanismo não se trata apenas de um ideal de cultura, mas um ideal de pensamento de confiança no Homem. Com os Descobrimentos, Portugal participa na primeira linha da construção de um admirável Mundo Novo. Sulcaram-se Mares e Oceanos e como escreveu Luís Vaz de Camões, no Canto VII d’Os Lusíadas: “E se mais mundo houvera, lá chegara".
‘Estou certo de que nada produz mais o barbarismo do que a ignorância, e nenhuma mais do que a da História, porque a história mostra o que são os homens, mostra o que eles foram, e é a experiência dos séculos; e acrescentarei nenhuma ignorância de história é mais prejudicial do que a da História da Civilização.’, grafou Dom Pedro V de Portugal nos seus famosos ‘Escritos’.
Os nossos antigos Reis criaram um Império de espanto através da Espada e do Sonho em descobrir Novos Mundos, por isso os que descrêem e desertaram desse Passado, neste Presente só de garganta, renegam o nome não só dos maiores desta tão grande Nação, mas também negam a grandeza, no futuro, aos seus filhos, pois existe um tronco directo que liga Passado, Presente e Futuro. ‘Quebramos estouvadamente o fio da nossa missão histórica. Desmoralizamo-nos, enxovalhamo-nos, desaportuguesamo-nos.(...) Bem exíguo, bem frágil, bem desacompanhado do mundo era o pequeno Portugal que no espaço de cem anos, entre o século XV e o século XVI, se assenhoreou no globo de um império territorial e marítimo consideravelmente superior àquele a que aspira a hegemonia germânica dos nossos dias.’, escreveu Ramalho Ortigão, Escritor, jornalista e Par do Reino in extrato da "Carta de um velho a um novo" - de Ramalho Ortigão a João Amaral.
‘- Tempos bons! Bons tempos esses, em que os súbditos não mentiam, pelo sufrágio, aos Chefes da Nação e em que os Reis, só a verdade diziam aos súbditos; mas fartaram-se estes da quezilenta companhia (a mentira é muito mais gostosa!) e mandaram a Verdade para o ostracismo, como coisa antiquada; mas essa coisa, real e verdadeira, - não podia existir sem a Realeza, nem a Realeza sem a Verdade e, pelo exílio Se ficaram, enquanto a jovial mentira fazia as delícias de um século…’, sintetizou magistralmente Francisco Perfeito de Magalhães e Menezes, 3.º Conde de Alvelos in ‘O Berço Exilado’, 1945.
‘Rex eris si recte facies, si non facies non eris - serás rei se actuares rectamente, se não actuares, não serás’.
Primeiro foi o grande Horácio (Venúsia, 8 de Dezembro de 65 a.C. — Roma, 27 de Novembro de 8 a.C.), poeta lírico e satírico romano que enunciou a tese acima, depois esta foi recolhida e completada por Santo Isidoro de Sevilha (c. 560, Cartagena - 4 de Abril de 636, Sevilha), "o último académico do mundo antigo”, e depois elevada à categoria de princípio político fundamental na Monarquia Visigótica.
Quando os portucalenses, esse povo calaico e suevo, com idiossincrasias distintas dos visigodos leoneses e castelhanos, quis que o mais valente e insigne de todos os Infantes os conduzisse à independência, não vislumbrou nele uma centelha sagrada, mas uma valentia e nobreza que lhes interessava para seu primus inter pares. Não o viram apenas como um ungido e como tal com o direito divino de reinar, como acontecia nas monarquias absolutas, mas elegeram-no para conduzir a Nação Portucalense e que haveria de unificar os 5 Reinos (Suevos, Visigodos, Lusitanos, Bracos e Alanos), para nascer como Portugal.
Assim, no Reino de Portugal, nunca a Soberania foi cativada pelos Reis, mas os primeiros Monarcas Portugueses exerciam a Soberania por delegação da Comunidade por intermédio de um pactum subjectionis em que o mandato real era limitado, uma vez que o poder vinha directamente de Deus para o Povo tendo estes súbditos o poder in habitu e os reis apenas o poder in actu.
Assim, desde que o Primeiro Rei de Portugal fundou esta tão grande Nação com o auxílio dos Infanções Portucalenses, foi através de um Alevantamento de todos, que naquela linda manhã do Dia de San’ Tiago, em 1139, foi alçado no Trono El-Rei Dom Afonso Henriques, este reinou sempre de acordo com a vontade expressa de todos os Portugueses e já como Rei de Portugal de acordo com o desejo de todo o Reino. Assim reinaram seus filhos, netos, bisnetos, etc., nos 771 anos da Monarquia Portuguesa: por delegação e vontade da Comunidade portuguesa.
Por que se diz que era de acordo com a vontade expressa de todo o Reino?
Assim acontecia, porque o poder real era legitimado pelas Cortes Gerais da Nação Portuguesa. As Cortes eram assembleias políticas, Gerais ou Extraordinárias, os órgãos políticos de carácter consultivo e deliberativo das Monarquias orgânicas. Eram convocadas pelo Rei, ou em seu nome, para as diferentes classes sociais estabelecidas em três Ordens: o Primeiro Estado, fronde do Clero; o Segundo Estado, fronde da Nobreza; e o Terceiro Estado, braço do Povo.
As Cortes da Monarquia Portuguesa eram uma evolução dos concílios nacionais da monarquia visigótica, e, a designação de Cortes provém do nome de Corte dado a cada uma das várias audiências pelas quais se desenvolviam os trabalhos da Assembleia.
Assim a legitimação dos Reis resulta destes receberem o poder do Povo para governar sob a obrigação implícita de reinar bem. O Rei coloca-se ao serviço da Nação – a servidão de reinar de que falava D. Pedro V - caso contrário, se ele não cumprir quaisquer deveres próprios à função real, a Comunidade pode destroná-lo. A Nação não é obrigada a amargar um Rei despótico e caprichoso ou um incapaz e por isso mesmo o Monarca pode ser deposto por Cortes Gerais. É a repristinação do mandamento do direito visigótico de que o Rei tem de reinar justamente: ‘És Rei se fizeres rectamente, se não fizeres, não és’, que foi plasmado nas leis do Reino e depois nas Constituições do Reino de Portugal.
‘Os Tês Estados destes Reinos de Portugal, juntos nestas Cortes, onde representam os mesmos Reinos e em todo o poder que neles há, consultarão que por princípio delas deviam fazer assento por escrito firmado por todos (…) E pressupondo por cousa certa em direito, que ao Reino somente compete (…) eximir-se também de sua sujeição e domínio, quando o Rei por seu modo de governo se fez indigno de reinar, por quanto este poder lhe ficou, quando os povos a principio transferirão o seu poder no Rei para os governar’, escreveu Ayres de Campos in ‘O poder Real e as Cortes’.
Para castigar o Rei que fazia mau uso do poder ou que não tivesse capacidade para governar e administrar o poder que lhe havia sido conferido pela Comunidade, as Cortes Gerais, e depois, na Monarquia Constitucional – onde entre o Rei e o Povo já existia um pactum unionis - o Parlamento, também chamado de Cortes, dispunham de meios que iam desde a ab-rogação das regalias reais, pela instituição de uma Regência, ou mesmo pela extremada deposição do Rei para por fim ao problema. Isso passavam as Leis da Monarquia Portuguesa e depois na sua vigência Constitucional o Art. 15° da Carta Constitucional de 1826.
Assim, em Portugal, no caso particular de Dom Sancho II, por mau governo, no caso de D. Afonso VI por incapacidade, os Reis foram afastados com base nesse princípio enunciado. Essa é uma das grandes diferenças entre Monarquia e o actual regime: em Monarquia se um Rei fosse 'tolo' era logo afastado.
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