Ministério dos Negócios Estrangeiros
O Senhor Secretário Geral solicitou ao Departamento de Assuntos Jurídicos que emitisse a sua opinião relativamente ao caso do Sr. Rosário Poidimani e às suas actividades no estrangeiro envolvendo o nome de Portugal e da Casa de Bragança.
Solicitado que foi o parecer deste Departamento, cumpre emiti-lo.
I. DAS NORMAS DE SUCESSÃO NA CHEFIA DA CASA REAL DE PORTUGAL
Cabe, de antemão, precisar as normas que regem a transmissão de títulos nobiliárquicos, em particular aqueles associados à realeza de Portugal, para enfim confrontar a legitimidade de Rosário Poidimani, por oposição a D. Duarte Pio de Bragança.
As regras sobre a sucessão régia, ou neste caso sobre a sucessão na chefia da Casa Real, em Portugal a Sereníssima Casa de Bragança, fazem parte do direito costumeiro internacional, não se encontrando estabelecidas em nenhum texto consolidado, antes emergindo da ordem social europeia e dispersas pelos vários sistemas constitucionais europeus ao tempo das grandes Monarquias Europeias, dos quais hoje sobrevivem apenas alguns de que são exemplo o do Reino Unido, da Espanha, da Dinamarca, da Bélgica, do Luxemburgo, do Mónaco, etc.
Em Portugal, algumas dessas normas encontraram expressão escrita nas Constituições Monárquicas – Constituição de 1822, Carta Constitucional de 1826 e Constituição Política de 1838.
Em 1911, com a primeira Constituição republicana, foram expressamente revogadas todas as disposições constitucionais anteriores, pelo que deixaram de valer na ordem jurídica portuguesa. Não deixam, contudo de servir de referência escrita mas apenas na parte que corresponde às mencionadas normas da tradição dinástica europeia.
De tal tradição resulta que:
1. A sucessão da Coroa segue a ordem regular de primogenitura, e representação entre os legítimos descendentes do monarca reinante (ou do chefe da Casa Real, num regime não monárquico), preferindo sempre a linha anterior às posteriores e, na mesma linha, o grau de parentesco mais próximo ao mais remoto e, no mesmo grau, o sexo masculino ao feminino e, no mesmo sexo, a pessoa mais velha à mais nova.
2. Extinta a linha da descendência do monarca reinante (ou do chefe da Casa Real num regime não monárquico) passará a Coroa às linhas colaterais e, uma vez radicada a sucessão em linha, enquanto esta durar, não entrará a imediata.
3. A chefia da Casa Real, bem como a Chefia do Estado, só poderá ser assumida por pessoa de nacionalidade portuguesa originária.
4. Extintas todas as linhas dos descendentes e colaterais, caberá ao regime (Cortes, Parlamento, Conselho da Nobreza ou Povo) chamar à chefia da Casa Real uma pessoa idónea a partir da qual se regulará a nova sucessão.
5. A descendência do chefe da Casa Real nascida fora do seu casamento oficial – entenda-se canónico – está afastada da sucessão da Coroa, salvo por intervenção expressa do regime(Cortes, Parlamento, Conselho da Nobreza ou Povo) e nunca do próprio monarca.
6. Mesmo em exílio, a sucessão real mantém-se, com todos os privilégios, estilos e honras que cabem ao chefe da Casa Real não reinante.
II. DA SUCESSÃO NA CHEFIA DA CASA REAL DE BRAGANÇA
De acordo com aquele direito costumeiro, a sucessão na chefia da Casa Real Portuguesa deu-se do seguinte modo:
. D. Pedro IV de Portugal, I do Brasil, irmão de D. Miguel, abdicou do Trono Português.
. D. Maria II, seguinte na linha de sucessão, assumiu o trono.
O Senhor Secretário Geral solicitou ao Departamento de Assuntos Jurídicos que emitisse a sua opinião relativamente ao caso do Sr. Rosário Poidimani e às suas actividades no estrangeiro envolvendo o nome de Portugal e da Casa de Bragança.
Solicitado que foi o parecer deste Departamento, cumpre emiti-lo.
I. DAS NORMAS DE SUCESSÃO NA CHEFIA DA CASA REAL DE PORTUGAL
Cabe, de antemão, precisar as normas que regem a transmissão de títulos nobiliárquicos, em particular aqueles associados à realeza de Portugal, para enfim confrontar a legitimidade de Rosário Poidimani, por oposição a D. Duarte Pio de Bragança.
As regras sobre a sucessão régia, ou neste caso sobre a sucessão na chefia da Casa Real, em Portugal a Sereníssima Casa de Bragança, fazem parte do direito costumeiro internacional, não se encontrando estabelecidas em nenhum texto consolidado, antes emergindo da ordem social europeia e dispersas pelos vários sistemas constitucionais europeus ao tempo das grandes Monarquias Europeias, dos quais hoje sobrevivem apenas alguns de que são exemplo o do Reino Unido, da Espanha, da Dinamarca, da Bélgica, do Luxemburgo, do Mónaco, etc.
Em Portugal, algumas dessas normas encontraram expressão escrita nas Constituições Monárquicas – Constituição de 1822, Carta Constitucional de 1826 e Constituição Política de 1838.
Em 1911, com a primeira Constituição republicana, foram expressamente revogadas todas as disposições constitucionais anteriores, pelo que deixaram de valer na ordem jurídica portuguesa. Não deixam, contudo de servir de referência escrita mas apenas na parte que corresponde às mencionadas normas da tradição dinástica europeia.
De tal tradição resulta que:
1. A sucessão da Coroa segue a ordem regular de primogenitura, e representação entre os legítimos descendentes do monarca reinante (ou do chefe da Casa Real, num regime não monárquico), preferindo sempre a linha anterior às posteriores e, na mesma linha, o grau de parentesco mais próximo ao mais remoto e, no mesmo grau, o sexo masculino ao feminino e, no mesmo sexo, a pessoa mais velha à mais nova.
2. Extinta a linha da descendência do monarca reinante (ou do chefe da Casa Real num regime não monárquico) passará a Coroa às linhas colaterais e, uma vez radicada a sucessão em linha, enquanto esta durar, não entrará a imediata.
3. A chefia da Casa Real, bem como a Chefia do Estado, só poderá ser assumida por pessoa de nacionalidade portuguesa originária.
4. Extintas todas as linhas dos descendentes e colaterais, caberá ao regime (Cortes, Parlamento, Conselho da Nobreza ou Povo) chamar à chefia da Casa Real uma pessoa idónea a partir da qual se regulará a nova sucessão.
5. A descendência do chefe da Casa Real nascida fora do seu casamento oficial – entenda-se canónico – está afastada da sucessão da Coroa, salvo por intervenção expressa do regime(Cortes, Parlamento, Conselho da Nobreza ou Povo) e nunca do próprio monarca.
6. Mesmo em exílio, a sucessão real mantém-se, com todos os privilégios, estilos e honras que cabem ao chefe da Casa Real não reinante.
II. DA SUCESSÃO NA CHEFIA DA CASA REAL DE BRAGANÇA
De acordo com aquele direito costumeiro, a sucessão na chefia da Casa Real Portuguesa deu-se do seguinte modo:
. D. Pedro IV de Portugal, I do Brasil, irmão de D. Miguel, abdicou do Trono Português.
. D. Maria II, seguinte na linha de sucessão, assumiu o trono.
. A descendência de D. Maria II manteve o Trono até 1910, aquando da Implantação da República.
. D. Manuel II, último Rei de Portugal, morreu no exílio, sem descendentes, nem irmãos legítimos.
. A linha colateral mais próxima, mantendo a nacionalidade portuguesa, de acordo com as normas sucessórias era a linha que advinha de D. Miguel, irmão de D. Pedro IV. Desse modo, o filho de D. Miguel, Miguel Maria de Assis Januário tornou-se legitimamente o novo chefe da Casa Real de Bragança por sucessão mortis causa de D. Manuel II.
. Ainda no exílio, sucedeu a D. Miguel [agora, de Bragança], seu único filho varão D. Duarte Nuno de Bragança e a este o actual chefe da Casa Real, D.Duarte Pio de Bragança.
. Em 1950, por Lei da Assembleia Nacional, a Família Real portuguesa foi autorizada a retornar ao território nacional.
Porque alguns defendiam que se mantinha em vigor a disposição da Constituição de 1838 que excluía da sucessão a linhagem de D. Miguel, irmão de D. Pedro IV, e para explicitamente reconhecer essa linha colateral como seguinte na sucessão a D. Manuel II, este ex-monarca e D. Miguel Maria de Assis Januário assinaram um documento, conhecido como o Pacto de Dover, onde o primeiro reconhecia a legitimidade para a sucessão ao filho de D. Miguel, D. Duarte Nuno. Na verdade tal Pacto era juridicamente desnecessário, pois com a Constituição de 1911 haviam sido revogadas todas as disposições constitucionais anteriores.
III. DA LEGITIMIDADE NO USO DO TÍTULO A QUE SE ARROGA ROSÁRIO POIDIMANI
O Sr. Rosário Poidimani alega ser o legítimo sucessor do último Rei de Portugal, D. Manuel II e, como tal, pretendente ao trono de Portugal e verdadeiro chefe da Casa Real de Bragança. Invoca essa sua legitimidade com base nos seguintes factos:
. No exílio, o último Rei de Portugal, D. Manuel II, entretanto casado com a princesa Augusta Vitória de Hohenzollern-Sigmaringen, veio a falecer em 1932 sem deixar descendentes.
. Terá, entretanto, sobrevivido uma filha ilegítima do Rei D. Carlos, pai de D. Manuel II, chamada D. Maria Pia de Saxónia Coburgo de Bragança, nascida em 1907, também conhecida por Hilda Toledano.
. Esta filha ilegítima terá sido baptizada por vontade de seu pai, o Rei D. Carlos, numa paróquia de Alcalà de Henares, perto de Madrid, e o mesmo soberano ter-lhe-á atribuído, por carta, todas as honras, privilégios e direitos dos Infantes de Portugal.
. Não tendo quaisquer outros sucessores, e considerando-se legítima pretendente ao trono português, D. Maria Pia de Bragança terá abdicado dos seus direitos em favor de Rosário Poidimani, por meio de documento presenciado por notário.
III.A. Da bastardia
Como referido anteriormente, a sucessão à chefia da Casa Real faz-se de acordo com as normas costumeiras que afastam da mesma sucessão a descendência ilegítima, outrora designada bastardia. Assim, mesmo provada a existência de uma filha ilegítima de El-Rei D. Carlos, mesmo por vontade daquele monarca, ela não poderia jamais suceder na chefia da Casa Real.
Simili modo, quando El-Rei D. João II, que viria a morrer sem descendência legítima, tentou “legitimar” seu filho bastardo, D. Jorge de Lencastre, não o conseguiu, tendo-lhe sucedido no trono o seu primo e cunhado D. Manuel I, Duque de Beja.
De facto, o único descendente real ilegítimo que conseguiu subir ao Trono Português foi D. João I. Seu meio-irmão, D. Fernando I deixara como único herdeiro legítimo uma filha, D. Beatriz, casada com o Rei de Castela. Essa ainda chegou a ser Rainha de Portugal, mas por fortes oposições internas por temor de que Portugal perdesse a independência com aquela união real dos tronos de Portugal e de Castela, e após um sangrento interregno, tomou o Trono o Mestre de Avis, D. João I, bastardo de El-Rei D. Pedro I, com o apoio legitimante da Nobreza e do Povo portugueses.
III.B. Do direito a outros títulos
Na tradição dinástica europeia, e designadamente portuguesa, era prática reiterada que o monarca, quando fosse o caso, conferisse aos seus descendentes ilegítimos outros títulos para que, não obstante não poderem suceder-lhe na coroa, não ficassem de todo desligados da sua hereditariedade real. O próprio 1º Duque de Bragança era filho ilegítimo do mencionado Rei D. João I.
D. Maria Pia, pretensa filha ilegítima de El-Rei D. Carlos, não reivindicou o uso de qualquer outro título que o Rei lhe tivesse concedido, porque apenas esse título poderia ter sido transmitido ao Sr. Rosário Poidimani, com o aval do Chefe da Casa Real.
III.C. Do acto de abdicação
Mais se esclarece que quando um titular abdica, não o pode fazer designando um sucessor. A designação do sucessor cabe às normas dinásticas vigentes. Assim, sem conceder que D. Maria Pia de Bragança fosse a herdeira de D. Manuel II, o acto de abdicação só seria válido per se, sem a designação de um sucessor cuja relação de parentesco com a abdicante é, minime, obscura. Mas, visto não ser D. Maria de Bragança a legítima sucessora, em nada adianta o acto de abdicação e menos ainda o facto de ter sido lavrado em notário que, não obstante a validade formal, é nulo porque carece de legitimidade.
IV. DO RECONHECIMENTO E DO “APANÁGIO” À CASA REAL DE BRAGANÇA E AO SEU LEGÍTIMO TITULAR
Refere o Sr. Rosário Poidimani, uma comunicação do Consulado Geral de Milão, Março de 1992, em que se informa que D. Duarte Pio de Bragança usufrui de uma habitação oferecida pelo Governo da República Portuguesa (“usufruisce di una abitazione messa a sua disposizione dal Governo della Repubblica Portoghese”). Igualmente numa comunicação do mesmo Consulado, de Julho de 2005, se afirma que ao mesmo herdeiro da Casa Real é conferido também o
respectivo apanágio (“anche del relativo appannaggio”). Por fim, em nome dos cidadãos portugueses, inquere o Sr. Rosário Poidimani, na mesma carta de Fevereiro de 2006 em que refere as anteriores comunicações, ao abrigo de que norma tem o Senhor de Santar direito ao uso de uma casa paga pelos contribuintes portugueses (“di quale provedimento il signor di Santar avrebbe in uso una casa a spese dei contribuenti portoghesi”) e em que capítulo de despesa [do Orçamento do Estado] se encontra aquele apanágio, qual o montante e se é conferido a título vitalício ou a prazo (“in quale capitolo di spesa sai inserito tale appannaggio, a quanto ammonta e se sia a titolo vitalizio o limitato nel tempo”).
Embora de pouca relevância prática, impõe-se esclarecer a questão.
De facto, a mencionada comunicação de 1992 informava erroneamente sobre a habitação do Duque de Bragança. Na verdade, o Estado Português nunca suportou qualquer habitação do herdeiro da Casa Real. Houve, de facto, uma imposição do Chefe do Governo, António de Oliveira Salazar, em 1950, para que a Fundação da Casa de Bragança – fundação privada de utilidade pública para testemunhar a história e manter os bens da Casa de Bragança após a morte de D. Manuel II, em cujo conselho de administração se encontra um representante do Governo – aquando do retorno da Família Real, providenciasse a sua condigna instalação em Portugal, precisamente para não ser o Estado a suportar tais despesas. Foi-lhes então cedido, a custas da
fundação, o Palácio de S. Marcos em Coimbra, onde se mantiveram até 1974.
No conturbado período pós-revolução de 25 de Abril de 1974, o Duque de Bragança, procurou assegurar a sua permanência aquirindo uma vivenda perto da Vila de Sintra que permanece, hoje, a sua residência e sede da Casa Real de Bragança. Esta casa e espaços circundantes, são propriedade pessoal do mesmo D. Duarte Pio de Bragança.
Quanto ao apanágio, entendido como tributo monetário, é de todo infundada a sua existência. O Estado Português nunca conferiu qualquer dotação orçamental para a manutenção da Casa de Bragança. Qualquer despesa ou remuneração da parte do Estado para com os Duques de Bragança foi e será sempre a título de serviços prestados em nome de Portugal, designadamente pela sua representação política, histórica ou diplomática.
No que concerne ao apanágio, com o significado de privilégio, regalia ou tratamento de maior dignidade, a República Portuguesa não promove a distinção de classes, pelo contrário, propugna a igualdade de todos os cidadãos perante a lei.
Por outro lado, o Estado Português, que é hoje uma República com quase 100 anos, viveu os anteriores 8 séculos de História de Portugal em regime de monarquia. A Casa de Bragança e o seu legítimo titular são, no presente, herdeiros e sucessores da Casa que presidia àquele regime.
Como herdeiros da tradição monárquica, é praxis do Estado Português que os Duques de Bragança testemunhem presencialmente os mais importantes momentos da vida do Estado como algumas cerimónias oficiais, designadamente aquelas que envolvem a participação de membros da realeza mundial. De igual modo, são os Duques, várias vezes, enviados a representar o Povo Português em eventos de natureza cultural, humanitária ou religiosa [católica] no estrangeiro, altura em que lhes é conferido o Passaporte Diplomático ao abrigo do n.º 3 b) e do n.º 5 do art.º 2.º do Decreto-Lei nº 70/79, de 31 de Março (Lei dos Passaportes Diplomáticos).
Importa, ademais, esclarecer que ao reconhecimento do Estado Português, se junta o reconhecimento tácito das restantes casas reais da Europa e do Mundo, com as quais a legítima Casa de Bragança partilha laços de consaguinidade, reconhecimento esse que encontra expressão nas constantes solicitações dessas mesmas casas para que os Duques de Bragança se associem
aos seus mais dignos eventos.
V. DO DIREITO À UTILIZAÇÃO DE OUTROS TÍTULOS, DO DIREITO A OSTENTAR BRASÃO, DA MESTRIA DAS ORDENS NOBILIÁRQUICAS E HONORÍFICAS MONÁRQUICAS E DO TRATAMENTO POR “SUA ALTEZA REAL”
A Guardia di Finanza em Gallarate, Itália, numa comunicação para o Consulado Geral de Portugal em Milão, de Março de 2006, procura saber se são reconhecidos ao Sr. Rosario Poidimani, pela República Portuguesa, os títulos de “Principe de Saxónia Coburgo de Bragança”, o tratamento de “Sua Alteza Real” e o título de “Pretendente ao trono de Portugal e Chefe da Casa Real de Portugal”, com o direito de ostentar o “brasão”, o direito de transmitir o título e outros direitos conexos ao Mestrado das Ordens dinásticas da Real Casa de Portugal.
Pois bem, a utilização, em Portugal, do título de Príncipe respeita apenas ao sucessor do legítimo chefe da Casa Real de Bragança. Por tradição esse sucessor – hoje, D. Afonso de Santa Maria, filho primogénito de D. Duarte Pio de Bragança – adquire, com o nascimento, o título de Príncipe da Beira. De todo o modo, nunca seria um Príncipe da linhagem de Saxe-Coburgo-Gotha porque tal linhagem terminou em Portugal com a morte de D. Manuel II.
Ainda, pelo direito dinástico internacional e por tradição, o título de Presuntivo Herdeiro ao Trono de Portugal está reservado para o uso pessoal do Duque de Bragança, como verdadeiro sucessor dos Reis de Portugal.
Do mesmo modo, a mestria das ordens nobiliárquicas e honoríficas monárquicas compete ao legítimo sucessor dos Reis de Portugal, o Duque de Bragança. Apenas a ele compete conferir foros de nobreza e títulos honoríficos. Deve, porém, ressalvar-se que, para efeitos de documentação oficial, apenas são reconhecidos pelo Estado os foros e títulos conferidos antes de 5 de Outubro de 1910 e desde que o direito ao seu uso seja devidamente provado, nos
termos do Decreto n.º 10537, de 12 de Fevereiro de 1925 .
Quanto ao tratamento por “Sua Alteza Real”, o Protocolo de Estado Português respeita as regras de deferência social e o protocolo internacional, pelo que nas cerimónias em que participam os Duques de Bragança, e na correspondência oficial que lhe é remetida, é-lhes conferido o mesmo estilo de “SS.AA.RR.”.
No que concerne a ostentação de brasões, ou armas de família, desde 1910 o regime encontra-se liberalizado em Portugal. Para efeitos de protecção jurídica, os brasões ou armas de família são equiparados a símbolos, logótipos ou marcas, devendo todavia respeitar as regras da não-confundibilidade e da leal concorrência.
VI. DA CELEBRAÇÃO DE NEGÓCIOS JURÍDICAMENTE VINCULANTES POR QUEM USA TÍTULO REAL OU NOBILIÁRQUICO
Ainda que se considere provado, nos termos anteriormente referidos, o direito a usar um título nobiliárquico, o mesmo Decreto n.º 10537 estabelece que a intervenção em acto, contrato ou documento, que haja de produzir direitos e obrigações, é antes de mais exigido o nome civil. Se a esse se juntar a referência honorífica ou nobiliárquica, deverá de novo ser provado o direito ao seu uso.
VII. DE IUS LEGATIONIS E DO RECONHECIMENTO COMO SUJEITO DE DIREITO
INTERNACIONAL
Consta da documentação fornecida que o Sr. Rosário Poidimani, e respectivos caudatários, têm aberto “representações diplomáticas” da Real Casa de Portugal, pelo território italiano.
A capacidade de enviar e receber representantes diplomáticos, ou Ius Legationis, pertence exclusivamente ao Estados e às Organizações Internacionais. São eles os principais actores do Direito Internacional.
O Ius Legationis é prioritariamente uma competência dos Estados, que são o substrato da Comunidade Internacional. A eles, Estados, cabe desenvolver relações amistosas com as outras nações, independentemente da diversidade dos seus regimes constitucionais e sociais (Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, celebrada em 18 de Abril de 1961).
O Ius Legationis e o Ius Tractum (Direito de concluir Tratados), são as competências internacionais que mais evidentemente resultam da soberania dos Estados. Mas a formação das Organizações Internacionais e a evolução da comunidade internacional implicou em grande parte a transferência de algumas dessas faculdades soberanas, e a partilha de outras. Dotadas dessa soberania transferida pelos Estados, as Organizações Internacionais já podem, hoje, celebrar tratados e receber ou enviar representações diplomáticas.
Ulteriormente, tem também ganho importância o indivíduo como sujeito de DireitoInternacional, mas com evidentes limites: não dotado de soberania o indivíduo não possui as competências clássicas dos Estados. Ele é mero sujeito de direito Internacional na medida em que direitos e deveres nascidos de convenções internacionais, celebradas por Estados e/ou Organizações Internacionais, recaiam na sua esfera pessoal.
Porque nem o Sr. Rosário Poidimani, nem a sua “Real Casa de Portugal” dispõem de soberania, não lhes pode ser reconhecido qualquer Ius Legationis.
E ainda que, como parece ser seu plano, pretenda instalar o seu “Estado” numa ilha do Mar Adriático, tal pretensão parece não ser exequível pois a constituição de um Estado está sujeita ao cumprimento dos seguintes requisitos:
. existência de um Povo, cultural, histórica e axiologicamente organizado;
. existência de um Território, independente. A compra de um território à Croácia, não confere independência ao mesmo;
. existência de um Governo, organizado;
. efectiva conexão entre os três anteriores elementos. Ainda que a “Real Casa de Portugal” venha a formar o governo, se o povo é croata, não parece haver qualquer ligação entre os dois.
Cumpridos aqueles requisitos, a soberania está ainda dependente do reconhecimento da comunidade internacional.
VIII. DA OFENSA AO BOM NOME DE PORTUGAL E À CASA DE BRAGANÇA
Do que é dado conhecer pela documentação fornecida, encontra-se em curso uma acção penal na qual é arguido principal o Sr. Rosário Poidimani, nas competentes sedes jurisdicionais italianas, pela alegada prática dos crimesde fraude, evasão fiscal, coacção, burla, extorsão e mesmo usurpação de funções públicas.
Não obstante a acção penal em curso, a actuação como “Duca di Bragança”, Chefe da “Real Casa de Portugal” e “Príncipe de Saxónia de Coburgo e de Bragança”, e de, por esse meio, se ter feito passar por representante do Estado Português, ao ponto de ter, inclusive, aberto “Consulados” da “Real Casa de Portugal”, conferiu fé pública aos seus actos e revelou-se lesiva para o bom nome de Portugal e da legítima Casa de Bragança.
Por outro lado, no que concerne à apropriação ilegítima do título de Duque de Bragança, entende-se – e é nesse espírito que a Republica Portuguesa tem mantido a legislação sobre o uso de títulos nobiliárquicos (Decreto do Governo n.º 10537, de 12 de Fevereiro de 1925) – que os títulos ou forais correspondem a antigas tradições de família, pelo que elementos importantes
da identidade pessoal e familiar. Mesmo em regime republicano, não proteger os legítimos titulares do uso ou apropriação indevida dos seus títulos implica uma violação da norma prevista no art.º 26.º da Constituição da República Portuguesa (direito à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, ao bom nome e reputação, à imagem.).
Acresce que o Sr. Rosário Poidimani tem ostentado um brasão que, até 1910, correspondeu ao brasão do Chefe de Estado de Portugal, acção que parece configurar um uso abusivo e ilegítimo de símbolos da soberania nacional, previsto e punido pelo Código Penal no art.º 332.º.
De acordo com as considerações anteriores, considera-se conveniente, salvo melhor opinião, o Estado Português constituir advogado, através da Embaixada de Portugal em Roma, para que através desse mandatário, o Estado se associe, e, querendo, a Casa de Bragança na qualidade de contra-interessado, à acção penal em curso, nos termos dos números 3 e 4 do art.º 5.º do Regulamento do Conselho 44/2001, de 22 de Dezembro de 2000, que regula a competência
jurisdicional em matéria civil e comercial, com o intuito de obter reparação dos danos de que resultou o desprestígio do nome de Portugal, da sua história e tradição, designadamente danos não-patrimoniais e patrimoniais (despesas administrativas, honorários dos advogados, etc.).
E, se a lei italiana previr a protecção da imagem ou da honra do nome de um Estado ou dos seus símbolos históricos, ou de uma entidade histórica como a Casa de Bragança, possa, salvo melhor entendimento, ser despoletado o processo conducente à punição por violação dessas normas.
Se, por fim, após terem sido encerrados os seus “consulados” e ter sido condenado na reparação dos danos mencionados, o Sr. Rosário Poidimani insistir em prosseguir as suas actividades ilícitas e em intitular-se ilegitimamente Duque de Bragança e Chefe da “Real Casa de Portugal” (cuja
propositada semelhança com Casa Real de Portugal ou de Bragança conduz ao erro sobre a legitimidade daquela) configurará o crime de desobediência previsto pelo direito penal italiano e português.
IX. CONCLUSÃO
Face ao que precede, conclui-se nos seguintes termos:
. Não obstante ser Portugal uma República, o direito à sucessão na chefia da casa real não-reinante continua a ser regulado pelo direito consuetudinário internacional;
. O Estado Português reconhece, de acordo com aquele direito consuetudinário, que a Casa Real de Bragança e o seu chefe, o Sr. D. Duarte Pio, Duque de Bragança, são os legítimos sucessores dos Reis de Portugal. A esse reconhecimento, associa-se o reconhecimento tácito das restantes Casas Reais do mundo;
. Mesmo reconhecida oficialmente, a Casa de Bragança não tem qualquer capacidade de representação do Estado que não lhe tenha sido expressamente e ad hoc concedida. Não é, igualmente um sujeito de Direito Internacional dotado de soberania, pelo que não detém a faculdade de receber e enviar representações diplomáticas.
. A actuação do Sr. Rosário Poidimani em Itália, designadamente a prática de crimes em nome da sua “Real Casa de Portugal” revelou-se lesiva para o nome de Portugal e para a honra da Casa Real de Bragança, desrespeitosa para a história e para os interesses do país e abusiva no uso dos símbolos e títulos outrora do chefe de estado de Portugal que agora pertencem à legítima Casa Real de Bragança.
. Salvo melhor opinião, considera-se conveniente para o Estado Português (e igualmente para a Casa Real de Bragança na qualidade de contra-interessados) associar-se, nos termos do Regulamento do Conselho 44/2001, de 22 de Dezembro de 2000, à acção penal em curso em Itália, se tal ainda for possível, ou intentar uma nova acção de responsabilidade civil pelos danos
patrimoniais e não-patrimoniais que implicou a lesão da imagem, do nome e da honra do Estado Português e da Casa Real de Bragança; eventualmente, se a lei italiana o previr, despoletar igualmente uma acção penal com vista à punição por ultraje à imagem e aos símbolos da soberania de um Estado.
À consideração superior,
Lisboa, Abril de 2006
Fonte: Causa Monárquica
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