segunda-feira, 5 de julho de 2021

O maior plano de descristianização e de totalitarismo “verde” da História (1ª Parte) - Há um ano de uma denúncia que previu os dias actuais

 


O Instituto Plinio Corrêa de Oliveira (IPCO) publicou, em 26 de Abril de 2020, o seu manifesto-denúncia intitulado Aproveitando o pânico da população e o apoio espiritual do Vaticano – A maior operação de engenharia social e de baldeação ideológica da História.

O documento incriminava a precipitação de governos em tomar medidas drásticas de confinamento com base em estimativas exageradas da letalidade do coronavírus chinês e em modelos matemáticos irrealistas, com os enormes custos sociais e económicos daí decorrentes.

Para o IPCO, seriam quatro os grandes beneficiários da crise universal gerada pelos confinamentos: o regime comunista da China, o movimento ecológico radical, a ultraesquerda e os promotores da governança mundial.

Após um ano da publicação da mencionada denúncia, pareceu-nos oportuno tentar fazer um balanço e uma actualização desse plano universal de subversão totalitário-ecológica e de descristianização do Ocidente, que tem tomado proporções jamais vistas na História.

Com base em uma epidemia viral real que infelizmente tem ceifado muitas vidas, foi apresentada como inevitável uma grande mudança em todos os aspectos da existência humana. Os factos ocorridos no último ano não apenas confirmaram o que foi dito naquela ocasião, como tornaram ainda mais evidente a desproporção entre a resposta à epidemia e o carácter pernicioso do chamado “novo normal” que dela surge.

1. O exagero da taxa de mortalidade e dos riscos incorridos pela maioria da população

Em março de 2020, a taxa de mortalidade da Covid-19 tinha sido estimada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 3,4%[1] e pelo Imperial College de Londres em 0,9%[2], o que resultaria em um número de vítimas comparável ou mesmo superior ao da trágica “gripe espanhola” de 1918[3]. O IPCO, pelo contrário, acreditava que essa taxa seria próxima daquela fornecida pelo Instituto de Virologia da Universidade de Bonn, em pesquisa realizada no primeiro cluster alemão, a cidadezinha de Gangelt, ou seja, uma taxa de 0,37%.

Os estudos mais completos realizados até hoje sobre a taxa de mortalidade por infecção em nível mundial são os da equipe do Prof. John P A Ioannidis, da Universidade de Stanford, na Califórnia. O primeiro deles, publicado em 14/10/20 no Boletim da Organização Mundial da Saúde[4], concluía, depois de uniformizar 61 estudos feitos em 51 localidades do mundo inteiro, que a fatalidade mediana da Covid 19 era de 0,27%.

Em um estudo de janeiro do presente ano, publicado pelo European Journal of Clinical Investigation, o Prof. Ioannidis abaixou essa taxa, asseverando que “as evidências disponíveis sugerem uma IFR [taxa de fatalidade da infecção] global média de ~0,15%”[5]. Isso não impede que haja diferenças substanciais em dita taxa nos vários continentes, países e locais, devido a variáveis como idade média e densidade da população na área, ou seu grau de imunidade prévia por exposição anterior a um vírus similar[6].

O segundo erro de avaliação da OMS e de autoridades sanitárias de diversos países foi o de considerar que o conjunto da população corria grave risco se fosse infectado pelo vírus chinês. Na realidade, segundo afirma o Prof. Jay Battacharya, da Universidade de Stanford, “é mil vezes maior a diferença da taxa de mortalidade em pessoas mais idosas, com 70 anos ou mais, e a taxa de mortalidade das crianças”, e vinte vezes maior em relação à população em geral: “quatro em cada 100 entre aqueles com 70 anos ou mais, em oposição a dois em 1.000 na população geral”[7].

Mesmo que aumente a taxa de letalidade de novas variantes do vírus, isso não desmentirá a avaliação de que as acções das referidas autoridades sanitárias foram globalmente prejudiciais à saúde pública, às liberdades constitucionais e à economia mundial, como se verá mais adiante.

2. A ineficácia dos lockdowns para conter a difusão do vírus chinês

A análise do IPCO considerava desarrazoado confinar todo o mundo, porque paralisava a vida do país, destacando que havia especialistas que sugeriam, pelo contrário, um isolamento temporário somente daqueles já contaminados pelo vírus, assim como medidas eficazes de proteção da população de risco (os idosos, os obesos e os portadores de algumas doenças). Era o chamado “isolamento vertical”, em contraposição ao “isolamento horizontal” (lockdown).

Essa abordagem foi validada cinco meses depois pela Declaração de Great Barrington, redigida pelos acadêmicos Sunetra Gupta (Oxford), o já mencionado Jay Bhattacharya (Stanford) e Martin Kulldorff (Harvard), a qual foi depois assinada por 13.985 cientistas na área de Medicina e Saúde Pública, e 42.519 médicos e auxiliares de medicina.

Essa Declaração denuncia que “as actuais políticas de confinamento estão produzindo efeitos devastadores na saúde pública em curto e longo prazo […] levando a um maior excesso de mortalidade nos próximos anos, com a classe trabalhadora e os membros mais jovens da sociedade carregando o fardo”. Prossegue afirmando que “à medida que a imunidade se desenvolve na população, o risco de infeção para todos – incluindo os vulneráveis – diminui. […] A abordagem mais compassiva que equilibra os riscos e benefícios de alcançar a imunidade de grupo é permitir que aqueles que estão em risco mínimo de morte vivam normalmente a sua vida para construir a imunidade ao vírus através da infecção natural, ao mesmo tempo protegendo melhor aqueles que estão em maior risco. Chamamos a isto Protecção Focalizada”.

Em consequência, a Declaração promove as seguintes medidas de bom senso: “As escolas e universidades devem estar abertas ao ensino presencial. As actividades extracurriculares, como o esporte, devem ser retomadas. Os jovens adultos de baixo risco devem trabalhar normalmente, e não a partir de casa. Restaurantes e outras empresas devem ser abertos. As artes, a música, o esporte e outras atividades culturais devem ser retomados. As pessoas que correm maior risco podem participar se o desejarem, enquanto a sociedade como um todo goza da protecção conferida aos vulneráveis por aqueles que acumularam imunidade de grupo”[8].

A ineficácia dos confinamentos universais para efeitos de conter a propagação do coronavírus ficou patenteada nos Estados Unidos, onde os estados que aplicaram regras mais estritas durante o último inverno têm em média taxas de mortalidade ligeiramente inferiores às dos estados similares que impuseram restrições suaves aos seus habitantes, como se pode verificar no gráfico abaixo, em que esses últimos figuram em vermelho:


Outro exemplo eloquente são os bairros da cidade de Nova York onde se concentram os seguidores do ramo hassídico do Judaísmo[9], os quais não respeitaram as regras impostas pelo prefeito da cidade, mantendo as escolas abertas e participando de reuniões multitudinárias por ocasião do funeral de um importante rabino e do casamento do filho de outro, o que levou o New York Times a denunciar com grande título: “‘Peste em escala bíblica’: famílias hassídicas duramente atingidas por vírus na área de Nova York”[10].

Na realidade, enquanto o conjunto da cidade teve até hoje uma taxa de 382 mortes por 100 mil habitantes[11], os bairros hassídicos – que não são ricos e de alta densidade média por lar por terem muitos filhos – tiveram uma incidência de fatalidades bem menor por 100 mil habitantes: East Williamsburg, 287; Borough Park, 275 e Williamsburg, 185[12].

Em um estudo publicado recentemente pelo European Journal of Clinical Investigation, os citados cientistas Ioannidis e Bhattacharya, juntamente com os professores Oh e Bendavid, da Universidade de Stanford, concluíram o seguinte: “Não há evidências de que intervenções não farmacêuticas mais restritivas (‘lockdowns’) contribuíram substancialmente para dobrar a curva de novos casos na Inglaterra, França, Alemanha, Irã, Itália, Holanda, Espanha ou nos Estados Unidos no início de 2020. […] Os dados não podem excluir totalmente a possibilidade de alguns benefícios. No entanto, mesmo que existam, esses benefícios podem não contrabalançar os inúmeros danos dessas medidas agressivas.”[13].

Como o Prof. Bhattacharya reiterou recentemente em uma entrevista, “para a maioria da população mais jovem, os danos colaterais dos bloqueios representam um risco maior do que a infecção por Covid; ao confiar em bloqueios ineficazes para proteger os idosos e evitar estratégias de proteção focalizadas, acabamos expondo os idosos ao vírus e prejudicando os jovens com bloqueios”[14].

Na opinião da Dra. Elke van Hoof, professora de Psicologia da Saúde na Universidade Livre de Bruxelas, a quarentena imposta como resposta à Covid é “o maior experimento psicológico da História”, porque “um terço do mundo está confinado” e “não sabemos como as pessoas vão reagir”, “não temos um modelo, não sabemos o que vai acontecer”[15].

3. O pânico como factor de guerra psico-política

Em 2009, após a epidemia de H1N1, o conhecido conselheiro presidencial francês Jacques Attali declarou: “A humanidade não evolui significativamente senão quando ela tem verdadeiramente medo”. Comentando essa frase, já em sua análise de 2020, o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira (IPCO) destacou que não havia dados “para afirmar peremptoriamente que esse seja o plano que está sendo posto em execução”, mas que vários fatores contribuíram para semear o pânico e dar início à evolução que Attali auspiciava. E que “as organizações internacionais e nacionais incumbidas da saúde pública se prestaram para a sua amplificação”.

Um estudo intitulado “Impacto da pandemia de COVID-19 na saúde mental: vigilância em tempo real usando o Google Trends”, publicado na revista Trauma Psychology, da Associação Americana de Psicologia (ANA), confirmou que, nos primeiros 40 dias após a declaração de pandemia pela Organização Mundial da Saúde, houve nos Estados Unidos “um aumento imediato de preocupação e pânico, seguido pelo início de sintomas de ansiedade”[16].

Outros estudos verificaram o mesmo pânico em atitudes como aumento de retiradas de dinheiro em espécie[17], esvaziamento dos supermercados por compras compulsivas[18], fugas das cidades para o interior[19] ou automedicação[20]. Sonia Bishop, professora associada de psicologia da Universidade da Califórnia em Berkeley, que tem investigado como a ansiedade afeta as tomadas de decisão, afirmou que isso se patenteou durante o surto do coronavírus. Mensagens inconsistentes de governos, da comunicação social e das autoridades de saúde pública alimentaram a ansiedade: “Não estamos acostumados a viver em situações em que as probabilidades mudam rapidamente”, disse a cientista[21].

O IPCO denunciou, já no início de 2020, o papel desempenhado pelos boletins da OMS na criação desse clima de pânico.

Hoje, há dados mostrando a existência de uma colaboração voluntária de algumas autoridades políticas nacionais com o seu agravamento. O caso mais expressivo foi o escândalo denunciado pelo Die Welt am Sonntag (edição de 07/02/21), mostrando a pressão exercida em meados de Março do ano passado sobre um grupo de cientistas pelo ministro alemão do Interior através do secretário de Estado para a Ciência, pedindo-lhes uma “maximale Kollaboration” (máxima colaboração) para obter deles o que hoje é conhecido como o “documento pânico”, que serviu de legitimação para medidas políticas mais restritivas[22].

No Reino Unido, o documento “Opções para aumentar a adesão às medidas de distanciamento social” foi analisado pelo Grupo de Aconselhamento Científico para Emergências do governo na sua reunião de 23 de Março de 2020. Elaborado pelo subgrupo de ciências do comportamento, o texto afirma que “um número significativo de pessoas ainda não se sente suficientemente ameaçado pessoalmente”, motivo pelo qual “o nível de ameaça pessoal sentido precisa ser aumentado entre aqueles que são complacentes, usando mensagens emocionais contundentes[23].

A sugestão foi posta em prática e, um mês depois, o Prof. Robert Dingwall, membro do Grupo Consultivo de Ameaças de Vírus Respiratórios Novos e Emergentes (NERVTAG), do governo britânico, deplorou que “temos esta mensagem muito forte que efetivamente aterrorizou a população fazendo-a acreditar que esta é uma doença que vai matar você. […] Tudo isso ajuda a criar esse clima de medo”[24].

4. O caráter revelador e uniforme da resposta global às epidemias com base em novo paradigma de segurança sanitária

Um aspecto que a análise do IPCO de um ano atrás não chegou a detectar foi o caráter extremamente uniforme da resposta dada à epidemia em toda a área ocidental do mundo. Com excepção da Suécia, de uma dúzia de estados norte-americanos e de algumas regiões do Brasil, praticamente todos os países tomaram sucessivamente as mesmas medidas, como se estivessem seguindo um script.

Desde o início do milénio houve de facto uma mudança de paradigma em matéria de biossegurança, analisada em 2013 por Patrick Zylberman, professor emérito da Escola de Altos Estudos de Saúde Pública de Paris, em seu livro Tempêtes microbiennes – Essai sur la politique de sécurité sanitaire dans le monde transatlantique (Tempestades microbianas – Ensaio sobre a política de segurança sanitária em um mundo transatlântico)Se o conceito tradicional de “prevenção” das calamidades públicas calculava as possibilidades reais de uma ameaça com base nos dados fiáveis de epidemias anteriores, um novo conceito – conhecido como preparedness – optava por imaginar cenários fictícios de fraca probabilidade, mas com consequências potencialmente catastróficas, exigindo da população um civismo superlativo. Com base na “lógica do pior” como critério de racionalidade, esse novo conceito favorecia, na opinião do Prof. Zylberman, “uma degringolada vertiginosa na ficção (números exagerados, analogias infundadas etc.)”[25].

Há muitos dados comprobatórios de uma “baldeação ideológica” – para empregarmos o termo cunhado pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira[26] – dos ambientes académicos e das autoridades públicas dedicadas à segurança sanitária, fazendo-os passar da prevenção à preparedness. Em outros termos, migrar de procedimentos de eficácia comprovada, baseados em uma avaliação realista do risco, para medidas extremas com efeitos incógnitos em vista de cenários catastróficos, cuja probabilidade não é validada pelos dados concretos disponíveis.

Em 1999, com dinheiro da Fundação Sloanes (nome do ex-presidente da General Motors), a Universidade Johns Hopkins fundou o Centro para Estudos de Biodefesa Civil. Nesse mesmo ano o Centro organizou em Arlington (Virginia) um simpósio com centenas de participantes e representantes de 10 países, para tratar de saúde pública e bioterrorismo[27].

Pela primeira vez um evento desse género incluiu exercícios de simulação – no estilo dos war games militares – de uma epidemia de varíola, na esperança de estabelecer parcerias e uma estrutura global de planejamento estratégico[28]. No ano seguinte se organizou um evento similar, dessa feita simulando uma praga. Com o passar do tempo, o aspecto militar deu primazia às doenças infecciosas emergentes.

Esse novo paradigma infiltrou seus postulados entre os cientistas e as autoridades da saúde pública através da organização de novos e frequentes exercícios de simulação, com financiamento, apoio logístico e orientação científica de diversas instituições públicas e privadas.

É sintomático o facto de a conhecida Universidade de Baltimore ter mudado o nome de seu estabelecimento especializado para “Centro Johns Hopkins para Segurança da Saúde”, tirando a referência ao bioterrorismo. Porém, conservou intacta a nova doutrina da preparedness, de origem militar[29].

Um artigo da respeitada revista científica Nature, de Agosto do ano passado, deu a conhecer detalhes de alguns desses eventos. Redigido principalmente por Amy Maxen, repórter sénior da revista, o artigo revela que:

  • “A Operação Dark Winter, em 2001, e Atlantic Storm, em 2005, foram orquestradas por think tanks em biossegurança nos Estados Unidos e nela participaram líderes influentes, como o ex-chefe da Organização Mundial da Saúde (OMS), Gro Harlem Brundtland, e Madeleine Albright, secretária de Estado do ex-presidente Bill Clinton”;
  • “Em janeiro de 2017, o Banco Mundial e a Fundação Bill & Melinda Gates em Seattle, Washington, apoiaram uma simulação de pandemia no Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça. […] A encenação coincidiu com o lançamento de uma fundação com sede em Oslo para desenvolver e distribuir vacinas para infecções emergentes, chamada Coalition for Epidemic Preparedness Innovations (CEPI). Recebeu financiamento da Fundação Gates, da instituição de caridade biomédica Wellcome Trust, do Reino Unido e de países como Japão e Alemanha”;
  • “Em Maio de 2018, juntamente com líderes da Casa Branca e do Congresso [americano] que nunca tinham lidado com uma grande epidemia, [o Dr. Thomas] Inglesby e seus colegas da Universidade Johns Hopkins realizaram um exercício em Washington DC chamado Clade X. Ele simulava um vírus respiratório desenvolvido em um laboratório. Uma das primeiras lições dessa simulação foi a de que a proibição de viagens não impedia que o vírus ganhasse terreno. As infecções se espalhavam rapidamente abaixo do radar, porque metade das pessoas infectadas apresentava poucos sintomas ou nenhum”;
  • “Em um exercício realizado pelo Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS) dos Estados Unidos no ano passado [2019], apelidado de Crimson Contagion, turistas voltavam da China com um novo vírus da gripe que se espalhava em Chicago, Illinois, e infectava 110 milhões de americanos (o exercício presumia que o patógeno era mais contagioso do que o SARS-CoV-2)”;
  • Um “cenário fictício, apelidado Event 201, desenrolou-se em outubro passado [2019] num centro de conferências da cidade de Nova York diante de um painel de académicos, funcionários do governo e líderes empresariais. Os presentes ficaram abalados — era o que Ryan Morhard queria. Especialista em biossegurança no Fórum Económico Mundial em Genebra, Suíça, Morhard temia que os líderes mundiais não estivessem levando suficientemente a sério a ameaça de uma pandemia. […] Perto do fim do exercício Event 201 […] os participantes assistiram a uma simulação de reportagem prevendo que a turbulência financeira duraria anos, ou mesmo uma década. Mas os impactos sociais – incluindo a perda de fé no governo e nos médias – podiam durar ainda mais” [30].

Num podcast cuja transcrição pode ser lida no site da Nature, a jornalista científica Amy Maxen, principal autora do artigo, fornece outros dados interessantes, como o facto de que “este campo de biossegurança é muito pequeno”: ao preparar a reportagem, “muita gente mencionava as mesmas pessoas com quem eu devia falar”. Segundo a jornalista, esse círculo pequeno é por sua vez influenciado por outro círculo ainda menor: “As pessoas por trás disso, essas pessoas de biossegurança que estão por trás disso, foram meio que lideradas pelo Centro Johns Hopkins para Segurança da Saúde e pelo Fórum Económico Mundial e pela Fundação Gates” [31].

A influência desse pequeno círculo de especialistas e de seus patrocinadores não tardou em se fazer sentir até nas mais altas esferas internacionais.

Em 4 de Maio de 2009, a Organização Mundial da Saúde publicou uma regulamentação intitulada “Preparadness e resposta à pandemia de influenza: documento de orientação da OMS”[32], a qual modificava sua definição de pandemia, eliminando dela a condição de que o surto viral causasse “um número considerável de casos e mortes”, e declarando que, ao invés da postura anterior, “a intensidade de uma pandemia pode ser moderada ou grave em termos de casos e mortes”. A OMS fez essa mudança poucos dias antes de declarar a “gripe suína” (H1N1) pandemia, o que obrigou os governos a tomar uma série de medidas preventivas muito onerosas (incluindo a aquisição de um enorme estoque de máscaras e de vacinas), que se mostraram depois totalmente inúteis pelo caráter moderado da epidemia.

Tal foi o escândalo, que um projecto de resolução a respeito das “falsas pandemias” foi proposto à Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa. Depois de estudar o caso, o relator da proposição de resolução, o deputado trabalhista inglês Paul Flynn, declarou-se “alarmado por algumas medidas excessivas tomadas em resposta ao que acabou por ser uma gripe de gravidade moderada, pela falta de transparência dos processos decisórios em causa e pelos possíveis abusos de influência da indústria farmacêutica em algumas decisões importantes”. O relator mostrou-se igualmente “preocupado com a forma como as autoridades públicas comunicaram sobre questões sensíveis, que depois foram retransmitidas pela comunicação social europeia, alimentando temores entre a população e nem sempre permitindo olhar a situação de maneira objectiva”[33].

Confirmando as fundamentadas preocupações do relator, em 24 de Junho de 2010 foi aprovada a resolução 1749/2010, intitulada “Gestão da pandemia H1N1: necessidade de maior transparência”. Nela, a Assembleia Parlamentar declara-se “alarmada pela maneira como a gripe pandémica H1N1 foi gerida” pela OMS e pelas autoridades sanitárias da União Europeia e dos diversos países. E “aponta para uma grave falta de transparência na tomada de decisões relacionadas com a pandemia, o que levanta preocupações sobre a influência que a indústria farmacêutica pode ter exercido sobre algumas das decisões mais importantes relacionadas com a pandemia”[34]

Apesar desse precedente pouco luzidio, dez anos mais tarde, logo após o aparecimento do Sars-Cov-2 e dos primeiros casos de Covid-19, a OMS e setores influentes da comunidade científica fizeram pressão para que os governos adotassem medidas rigorosas de acordo com a “lógica do pior” contida no novo script da segurança sanitária aprendido nas sessões de simulação promovidas pelo Centro Johns Hopkins para Segurança da Saúde e por seus patrocinadores.

5. A catástrofe sanitária que vai resultar dos lockdowns

Essa “lógica do pior” focalizava exclusivamente os riscos de difusão do vírus de origem chinesa, mas não levava em consideração os danos colaterais decorrentes do confinamento da população, inclusive para a saúde pública.

O manifesto do IPCO evocou apenas um desses danos colaterais: a suspensão das campanhas de vacinação das crianças nos países pobres, por recomendação da OMS (!), para evitar que as aglomerações de adultos nas clínicas espalhassem o vírus, apesar do risco de reaparecimento de epidemias como pneumonia, tuberculose e malária que essa suspensão das vacinações tradicionais acarretaria. De facto, segundo o Prof. Battacharya, “oitenta milhões de crianças em todo o mundo estão agora em risco dessas doenças”[35].

Veja-se, por exemplo, o impacto no combate à malária, 94% de cujas vítimas mortais residem na África. Um estudo publicado em setembro passado na revista Pedriatic Research afirma que “as respostas à pandemia [os lockdowns] podem resultar na redução da distribuição de rede insecticida de longa duração, da pulverização residual interna, das campanhas sazonais de quimioprofilaxia da malária, de acesso a testes de diagnóstico rápido e do tratamento eficaz da malária” [36]. A previsão da OMS, segundo o artigo, é de que haja 102% mais mortes relacionadas com a malária na África subsaariana, 70% das quais estariam entre crianças de menos de cinco anos.

Com o passar do tempo, emergiram outros efeitos negativos dos confinamentos nos países pobres. A desnutrição infantil faz com que as crianças mais novas tenham deficiências imunológicas e dificuldades de aprendizado. Ora, afirma o mesmo estudo da Pediatric Research:“Os lockdowns, com o fechamento simultâneo de escolas, também afectaram o acesso às refeições nas escolas, que para muitas crianças são uma das poucas fontes consistentes de alimentos. Assim, a pandemia expôs ainda mais as crianças à fome, à má nutrição e, consequentemente, aos impactos negativos no desenvolvimento cognitivo”[37].

Uma lacuna do documento do IPCO foi não tratar do impacto catastrófico dos confinamentos na saúde pública nos próprios países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Pelas restrições de movimentos e por pânico do contágio, milhões de pessoas deixaram de fazer primeiras consultas para a detecção precoce do cancro ou de problemas cardiovasculares, ou suspenderam os controles médicos periódicos para tratamento da diabetes, de distúrbios psicológicos e psiquiátricos, bem como de abuso de álcool e estupefacientes.

Um estudo publicado pela Câmara dos Lordes do Reino Unido, intitulado “Lockdown 1.0 e a pandemia um ano depois: o que sabemos sobre os impactos?”, reconhece que “há evidências de que a saúde pública foi afetada negativamente durante a pandemia, devido às doenças não serem identificadas ou não serem tratadas”. Cita como exemplo um relatório de Public Health England, segundo o qual “metade das pessoas com piora das condições de saúde não procuraram aconselhamento médico” em Setembro de 2020, tendo havido previamente “uma queda nas internações hospitalares entre Abril e Junho de 2020” e uma “diminuição da identificação de pessoas com demência e Alzheimer, devido ao não acesso dos pacientes aos serviços de avaliação e diagnóstico”[38].

Por sua vez, “um estudo publicado pelo Institute for Fiscal Studies descobriu que em Abril de 2020, primeiro mês do bloqueio nacional, a saúde mental piorou em média 8,1%”, enquanto outro estudo, da Universidade de Glasgow, publicado em Outubro de 2020, descobriu que “houve um aumento nos níveis de ansiedade e pensamentos suicidas durante o mesmo período”[39].

A revista científica The Lancet difundiu um estudo ainda mais alarmante, concluindo que “os profissionais de saúde devem se preparar para o aumento da morbidade e mortalidade nos próximos meses e anos”. Intitulado “Efeitos agudos indirectos da pandemia COVID-19 na saúde física e mental no Reino Unido: um estudo de base populacional”, a pesquisa calculou – numa base de dados incluindo mais de 10 milhões de pacientes – a queda nas primeiras consultas para casos agudos de saúde mental e física. Com excepção de eventos agudos relacionados ao álcool, houve evidência de uma redução nas consultas para todas as patologias: ansiedade, transtornos alimentares, transtorno obsessivo-compulsivo, automutilação, doença mental grave, ataque isquêmico transitório, insuficiência cardíaca, enfarte do miocárdio, angina instável, tromboembolismo venoso e exacerbação da asma. Quatro meses mais tarde, as consultas para todas as doenças não haviam se recuperado aos níveis pré-bloqueio, excepto aquelas por angina instável e eventos agudos relacionados ao álcool[40].

Essa previsão confirmou-se esta semana, pela publicação dos últimos dados do instituto nacional de estatísticas: as mortes em residências particulares na Inglaterra e no País de Gales aumentaram 30% em 2020 em relação à média dos anos anteriores. Isso representou 41.321 “mortes em excesso”, especialmente por doenças cardíacas (+66%), diabetes (+60%) e Parkinson (+65%), embora a Covid-19 fosse responsável apenas por 8 por cento do total[41].

Mais dramático ainda foi o efeito dos lockdowns sobre a saúde mental das crianças e dos jovens, aos quais foi negada a convivência social, tão necessária nessa etapa da vida, pelo fechamento dos estabelecimentos escolares. O Colégio Real dos Psiquiatras publicou no seu site da internet uma análise intitulada “País nas garras de uma crise de saúde mental com as crianças mais afectadas”, na qual revela que, em relação a 2019, entre Abril e Dezembro do ano passado houve um aumento de 28% no número de crianças e jovens encaminhados aos serviços de saúde mental, de 20% nas sessões de tratamento, e de 18% nos atendimentos de emergência, incluindo a prevenção de abusos contra crianças.

A Dra. Bernadka Dubicka, directora da faculdade da criança e do adolescente no Colégio Real de Psiquiatras, declarou: “Nossas crianças e jovens estão sofrendo o impacto da crise de saúde mental causada pela pandemia e estão em risco de doença mental para o resto da vida. Como psiquiatra de primeira linha, vi o efeito devastador que o fechamento de escolas, o rompimento de amizades e a incerteza causada pela pandemia tiveram na saúde mental de nossas crianças e jovens”[42].

Se até num país económica e culturalmente desenvolvido como o Reino Unido, crianças e adultos pagaram um enorme preço sanitário na fracassada tentativa de diminuir a circulação do coronavírus, imagine-se o custo para a saúde pública nos países menos desenvolvidos!

[1] https://twitter.com/WHO/status/1234870438926278659 & https://www.reuters.com/article/us-coronavirus-health-who-idUSKBN20Q2G6

[2] https://www.imperial.ac.uk/media/imperial-college/medicine/sph/ide/gida-fellowships/Imperial-College-COVID19-NPI-modelling-16-03-2020.pdf

[3] https://www.cnbc.com/2020/03/26/coronavirus-may-be-deadlier-than-1918-flu-heres-how-it-stacks-up-to-other-pandemics.html

[4] https://www.who.int/bulletin/online_first/BLT.20.265892.pdf

[5] https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/eci.13554

[6] É isso que explica o fato de que, apesar do estudo do IPCO ter sugerido uma taxa de mortalidade ligeiramente superior à realidade, tenha previsto, no caso específico da Itália, um número de falecimentos 58% inferior à realidade (74.159 mortes, em vez dos 47 mil previstos). De qualquer maneira, essa subestimação das vítimas esteve bem menos afastada da realidade do que as superestimações mais moderadas da mídia que erraram em mais de 500% (400-450 mil).

[7] https://imprimis.hillsdale.edu/sensible-compassionate-anti-covid-strategy/

[8] https://gbdeclaration.org/

[9] https://friedavizel.com/2021/01/28/1-year-review-hasidim-had-similar-covid-outcomes-despite-opening/

[10] https://www.nytimes.com/2020/04/21/nyregion/coronavirus-jews-hasidic-ny.html

[11] https://eu.azcentral.com/story/news/local/arizona-health/2021/04/18/arizona-covid-19-update-711-new-cases-2-new-deaths/7277181002/

[12] https://www.nytimes.com/interactive/2020/nyregion/new-york-city-coronavirus-cases.html

[13] https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/eci.13484

[14] https://jimmyalfonsolicon.substack.com/p/the-high-costs-of-lockdowns-an-interview

[15] https://www.bbc.com/portuguese/geral-53204453

[16] https://doi.apa.org/fulltext/2020-59192-001.html

[17] https://voxeu.org/article/coronavirus-panic-fuels-surge-cash-demand

[18] https://voxeu.org/article/spending-dynamics-and-panic-buying-during-covid-19-first-wave

[19] https://www.telegraph.co.uk/family/life/long-city-lockdown-created-wave-panic-movers/

[20] https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7532737/

[21] https://www.nationalgeographic.com/history/article/why-we-evolved-to-feel-panic-anxiety

[22] https://www.welt.de/politik/deutschland/plus225868061/Corona-Politik-Wie-das-Innenministerium-Wissenschaftler-einspannte.html

[23] https://assets.publishing.service.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/882722/25-options-for-increasing-adherence-to-social-distancing-measures-22032020.pdf

[24] https://www.dailymail.co.uk/news/article-8300139/Expert-Britons-terrorised-governments-tough-coronavirus-message.html

[25] http://www.gallimard.fr/Catalogue/GALLIMARD/NRF-Essais/Tempetes-microbiennes

[26] https://www.pliniocorreadeoliveira.info/Dialogo_integral.htm#.YIvRBppR02w

[27] https://wwwnc.cdc.gov/eid/article/5/4/99-0401_article

[28] https://stacks.cdc.gov/view/cdc/14868

[29] https://en.wikipedia.org/wiki/Johns_Hopkins_Center_for_Health_Security

[30] https://www.nature.com/articles/d41586-020-02277-6

[31] https://www.nature.com/articles/d41586-020-02020-1

[32] https://www.who.int/influenza/resources/documents/pandemic_guidance_04_2009/en/

[33] http://assembly.coe.int/committeedocs/2010/20100604_h1n1pandemic_f.pdf

[34] https://assembly.coe.int/nw/xml/XRef/Xref-XML2HTML-FR.asp?fileid=17889&lang=FR

[35] Op. cit.

[36] https://www.nature.com/articles/s41390-020-01174-y

[37] Ibid.

[38] https://lordslibrary.parliament.uk/lockdown-1-0-and-the-pandemic-one-year-on-what-do-we-know-about-the-impacts/

[39] Ibid.

[40] https://www.thelancet.com/journals/landig/article/PIIS2589-7500(21)00017-0/fulltext

[41] https://www.thetimes.co.uk/article/deaths-at-home-rise-by-a-third-as-patients-avoid-hospital-v9k3zwgqp

[42] https://www.rcpsych.ac.uk/news-and-features/latest-news/detail/2021/04/08/country-in-the-grip-of-a-mental-health-crisis-with-children-worst-affected-new-analysis-finds

(continua)

Fonte: Instituto Plinio Corrêa de Oliveira

Sem comentários: