A propósito do lançamento do concurso para a primeira fase da linha de alta velocidade, que unirá, de novo, Lisboa ao Porto, o novo aprendiz de secretário geral do partido socialista proclamou com uma certa solenidade, tratar-se de “um investimento estruturante”.
Não nos cabe manifestar qualquer emoção relativamente a tal, pois ao tratar-se de tecnologia, ela em si é neutra ao não contribuir nem para o Bem, nem para o Mal. Talvez devêssemos demonstrar a nossa inquietação, pela pressa no lançamento do dito concurso para conseguir angariar as centenas de milhões generosamente oferecidos pela EU, como se alguma vez não constituíssem mais um penhor da Pátria perante Bruxelas, esquecendo o colossal montante de valor indeterminado que será gasto pelo erário público, muito para além do final da obra.
A questão é verificar se um investimento deste tipo, que une as duas principais cidades do litoral, competindo com um comboio pendular, duas autoestradas e os inúmeros voos diários que percorrem a costa, consegue ser estruturante para Portugal.
Até na visão progressista e relativista, habitual no liberalismo e no seu governo de eleição a partidocracia e pela dificuldade em perceber qual o impacto que tal investimento terá na vida dos cidadãos de cidades que não se constituam com satélites de Lisboa ou Porto, torna-se incompreensível o epíteto de “estruturante”, salvo se o pensamento rebolar para um novo potencial desastre financeiro, onde todos seremos chamados a pagar por via tributária e por este efeito virmos, de novo, a “estrutura” do nosso rendimento afectada pelos dislates irresponsáveis de uma qualquer “maioria” de 20% dos votantes.
Como bons arúspices que são, dir-nos-ão agora, como o ecoam há dezenas de anos, que se trata de um “investimento rentável, que se paga a si próprio”.
As sociedades são um corpo, elas nascem, crescem, multiplicam-se e envelhecem, num processo natural que não depende de investimentos, nem de candidatos bem parecidos e bem-falantes, (aqui, com umas enormes reticências a que a baixeza da discussão partidária obriga…). Nas palavras do Professor José Miguel Gambra, que tivemos o prazer de ouvir em Barcelona, a propósito de uma meritosa iniciativa do Círculo Tradicionalista Ramon Parés y Vilasau e depois de ler avidamente a sua obra “A Sociedade Tradicional e os seus inimigos”, torna-se claro que qualquer sociedade tem três factores que lhe são inerentes e que a diferenciam de um grupo, ou de uma máquina: - o homem é por natureza sociável; tem uma hierarquia social; tem um fim último.
São estes factores que permitem distinguir uma sociedade de um grupo, que até poderá ter um objectivo comum a todos os seus membros, mas onde a falta de uma hierarquia, ou da sociabilidade natural levam inexoravelmente ao seu fim, atingido que fôr esse objectivo, ou o desânimo pela dificuldade em o atingir. O mesmo se passa com um comboio, ele é composto por um conjunto enorme de peças, as quais, fruto da engenharia, lhe permitem atingir velocidades fantásticas, mas que o desgaste e a falta de uma intervenção humana contante que o mantenha, levará à sua destruição, na impossibilidade de se autorreproduzir, ou de se autorregenerar.
Apesar de vivermos em sociedades artificiais, pela amputação deliberada de Deus como o seu Fim último e Unidade Transcendente, o que leva à indiferença e apatia dos homens que a constituem, especialmente evidente nestes tempos transbordantes de progresso, tecnologia e de inteligência artificial, o certo é que a estrutura milenar criada naturalmente, constituída pela propriedade de pequena dimensão, as freguesias, os Municípios e apesar das constantes tentativas de destruição praticadas pelo liberalismo durante os últimos duzentos anos, continua a ser visível numa indiferença intemporal a sorridentes ministros, ou a candidatos de barba bem aparada, como se tal fosse sinónimo de alguma capacidade de um pensamento estruturado, ou virado para a condução da sociedade para um Bem Comum a todos.
Nenhum “investimento estruturante”, alterou ou alterará este facto e nem todas as desamortizações, nacionalizações, privatizações tão peculiares na avidez destrutiva do liberalismo, apesar de lhe tirarem o seu brilho natural, não conseguiram até á data destrui-lo, apesar da centralização obsessiva, apesar do completo afogamento das liberdades comunitárias, que sempre vincaram a nossa Pátria.
Verdadeiramente estruturante seria a devolução dos governos comunitários às freguesias e municípios, a dignificação das esquecidas e distantes regiões do eixo Lisboa-Porto, o retomar Cristo Rei como único Soberano e Unidade última da nossa Pátria. Mas nesse momento que falta nos fariam novos secretários-gerais bem trajados e de barba aparada? Que falta nos fariam os partidos, ou este Estado cinzento e opressor a que nos sujeitamos?
Por Deus, Pátria e Rei legitimo
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