Segundo Mário Saraiva, estas duas características privativas da monarquia, estes dons inestimáveis e que afinal definem a superioridade monárquica, não devem, não podem ser prejudicadas ou inutilizadas para se fazer do Rei um governante:
“O Rei não pode descer ao lugar que compete a um primeiro-ministro. A sua missão é mais alta e transcendente.
“A realeza não é propriamente uma chefatura: é uma magistratura.”
E foi assim que Mário Saraiva, situando-se no desenvolvimento da Media via entre Liberalismo e Absolutismo aberta pelo Integralismo Lusitano, apresentou em «Razões Reais» um contributo inovador que é de justiça reconhecer como uma doutrina neo-integralista dos poderes do Rei: enquanto na teoria monárquica do constitucionalismo liberal-cartista se dizia que “o rei reina mas não governa” e o Integralismo Lusitano havia inicialmente retomado a fórmula de Gama e Castro segundo a qual o “o rei governa, mas não administra”, Mário Saraiva vai adiante afirmar que o Rei não deve governar nem administrar, mas deve chefiar tudo o que não seja discutível no plano nacional – a Diplomacia, as Forças Armadas, a Justiça.
Ao atribuir ao Rei a Suprema Magistratura da República, Mário Saraiva realizou a destrinça entre governo e administração, rectificando, melhor dizendo actualizando, a primitiva proposta integralista, e no mesmo passo recuperando essa antiga e sempre nova fórmula da Monarquia Portuguesa na qual se definia o Rei como «o procurador dos descaminhos do Reino».
…Tendo sido escrita por um discípulo reconhecido do Integralismo Lusitano, esta é na verdade uma obra da qual emerge naturalmente o filão mais profundo dessa escola de pensamento, esse que afirma que INTEGRAR quer dizer, rigorosamente, INTEGRAR A NAÇÃO TRANSVIADA NA DIRECTRIZ HISTÓRICA QUE A FORMOU E ENGRANDECEU. Retirando lição da experiência e da realidade em constante transformação, Mário Saraiva revelou-se aqui como um RENOVADOR que sabe que as fórmulas envelhecem como os homens, sendo preciso renová-las para que conservem frescura e vitalidade. Sem se deter na defesa de fórmulas vigentes ou passadas, rejeitando o conservadorismo político, assumiu-se plenamente como um TRADICIONALISTA, um pensador consciente de que a Tradição é um veio que liga acções humanas em tempos sucessivos, e que a desejada integração da Nação Portuguesa na directriz histórica que a formou e engrandeceu, não poderá realizar-se senão por intermédio de uma actualizada Solução Nacional:
"Rei – personificação da Pátria;
Rei – procurador dos descaminhos do Reino;
Rei – defensor da Nação perante o Estado.
Eis-nos diante de três posições basilares que necessariamente marcam, orientam e definem a jurisdição da magistratura real."
Creio que não é demais concluir insistindo, com Mário Saraiva: a República é a «Res publica», Coisa Pública, Coisa do Povo; durante séculos a República em Portugal teve um Monarca por regedor e defensor; e a República existia dentro da Monarquia.
Eis porque não é demais insistir retomando também aqui o convite que Mário Saraiva lançava aos monárquicos para que repudiassem a questão política nos termos fratricidas monárquicos contra republicanos tal como tem sido posta desde o século XIX:
“A diferença entre um «soi-disant» republicano e um de nós é fundamentalmente esta: ele quer para a República um Presidente periodicamente eleito; nós queremos que a República remate pela chefatura dinástica de um Rei”.
Tal como os mestres fundadores do Integralismo Lusitano, Mário Saraiva convidava, afinal, os monárquicos a assumirem a sua «Alma Republicana», e a reconhece-la naqueles que, embora presidentistas, tenham “o mesmo acrisolado interesse pela Coisa Pública”, “a consciência de que praticam um dever cívico na primazia que concordam em dar à Pátria”.
José Manuel Quintas
Palavras de apresentação da 3ª edição da obra «Razões Reais» de Mário Saraiva, em 2 de Abril de 2003, no Salão Nobre do Palácio da Independência, em Lisboa
Fonte: Resistência Popular Realista
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