domingo, 30 de dezembro de 2012

Lições da Restauração para a crise actual



Para os mais experimentados leitores da história portuguesa, torna-se evidente que a actual crise será, talvez, a segunda maior aflição colectiva que o país experimenta desde a Guerra da Restauração. Infelizmente, persiste o mito [anti-histórico] segundo o qual as crises não se repetem. Não se repetem na forma e nos factos, mas repetem-se nas circunstâncias que concorrem para os acontecimentos. Se as manifestações são sempre distintas de época para época, devia ser estudado o modus faciendi para lhes pôr um fim. Ora, havendo entre nós um desconhecimento quase generalizado das coisas do passado, não é de estranhar que governantes e governados se sintam impotentes perante a magnitude dos desastres que nos assaltam.

O estudo da polemologia e dos acidentes militares da Restauração é coisa apaixonante. Portugal venceu então grandes desafios e a longa guerra revelou uma sociedade capaz de levar a extremos de heroísmo a defesa da sua liberdade. Contudo, a Restauração foi, sobretudo, um continuado esforço no exercício da boa diplomacia - captando simpatias externas para o reforço dos direitos portugueses - e do bom comércio. Para o sucesso da diplomacia concorreu o preparo das embaixadas, a escolha dos parceiros, a selecção do escol que representou o país. Para o sucesso da política económica, foi relevante aquilo que hoje dá pelo nome de "maximização" dos recursos, mercê da facilitação do acesso e fixação de estrangeiros no país, do baixo preço da tributação nos portos e no trato, da segurança garantida e da formação de agentes comerciais que permitiram abrir novos mercados aos produtos portugueses. Em terceiro lugar, a Restauração foi possível graças ao aprofundamento da dimensão ultramarina: Angola e Brasil assumiram lugar destacado.

Fazendo a possível conversão para o quadro hodierno, todas as políticas que favoreçam a fixação de interesses estrangeiros em Portugal - corresponsabilizando-as pelo sucesso da nossa economia - todas as políticas que visem diversificar os parceiros diplomáticos e comerciais, assim como o esforço legislador que torne atractivo investir com segurança, levarão à repetição do bom sucesso da crise 1640-1667. Isto quer dizer: uma diplomacia moderna e de elite, abatimento da má legislação, promoção dos nossos produtos, reforço prioritário das relações com o Brasil e Angola. Tudo o mais virá por acrescento.
 
 
Miguel Castelo-Branco
 
Fonte: Combustões

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