sexta-feira, 16 de agosto de 2013

El-Rei



El-Rei. Um homem. Aquele que no mais alto cargo é o servo de todos porque não depende de ninguém. O único que não tem direito de voto. Ele é o escolhido que nunca escolhe. Dá-nos um Rei, pediam os judeus ao profeta Samuel, conscientes já das dificuldades de teocracia e a braços com a divisão infalível do poder religioso e do poder civil. Dá-nos um Rei. Um Rei para que evite a idolatria do chefe religioso, a tentação suprema da encarnação de Deus ou dos deuses no poder civil. Um homem cuja legitimidade no cargo é indiscutível como descendente e representante do fundador da Pátria. E como tal é digno, respeitável, natural, sem o agir, desastrado ou despótico, do “parvenu”, a violência do usurpador, a consciência tacanha do funcionário…

O Rei é a garantia de justiça e liberdade porque é o elo necessário, o selo de contrato entre as várias repúblicas, as múltiplas independências e autonomias que nele confiam o entrelaçar das suas relações de portugueses com portugueses.
 
O Rei é o homem no mais alto lugar, apenas um homem, carregado com todas as limitações humanas, a sua vulnerabilidade e a sua dignidade. É o contrário do tirano, o oposto desses demagógicos salvadores da Pátria que se erguem por cima do povo à força de pulso e de golpes.

Quem não se lembra quando nos visitou o tiranete socialista de um dos países do Leste¹, foi hospedado no Palácio Real de Queluz e o insólito (insólito?) aconteceu? Esse salvador da Pátria exigiu que os criados andassem de meias para não lhe perturbarem o sono… El-Rei D. Carlos (esse mesmo que um punhado de portugueses assassinou…) certa vez, ao entrar no Palácio à noite, descalçou as botas para passar sem ruído diante da porta do quarto do criado que estava doente, para não o acordar…

O Rei também é uma família. Com as suas alegrias e as suas tristezas, comuns a todas as famílias. Uma família que o envolve e o humaniza, salvando-o de ser uma imagem ou um super-homem...

O Rei não desilude porque não é nenhuma terna ilusão romântica nem aparece com o trunfo político desta ou daquela facção, desta ou daquela ocasião. Não precisa de velar ciosamente pela sua imagem, bem polida e engraxada, receoso das nódoas e do pó que sempre levanta o desvendar das imagens fabricadas…

A força do Rei só reside na fidelidade dos seus súbditos. É uma pessoa, não é o resultado de um escrutínio. Para que serve ser-se fiel à maioria? Pode ser aceite e acatada mas ser-lhe fiel?... Volúvel e inconstante, ela não vive de fidelidade mas de traições… O Rei é sereno e igual. A perduridade da Pátria.

Dizia-me alguém que eu era monárquica porque a monarquia apelava para o meu sentido estético. Não o nego. Também o sou por isso. Porque é mais bonito… Mas ser monárquico é, antes de mais, um acto de inteligência.

¹ Trata-se do então presidente da Roménia, Nicolae Ceaușescu

in "D. Sebastião e Eu" (págs. 23 e 24)

* Nota: o texto publicado é da exclusiva responsabilidade do autor.


Teresa Maria Martins de Carvalho

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