Muitas das personalidades da cultura e da política contemporâneas da época em que viveu Sua Majestade, o Rei Dom Carlos I de Portugal, foram unânimes em reconhecer os seus enormes méritos e talentos fosse como Rei, fosse como homem ou mesmo como artista, não raras vezes se empenhando como enaltecedores do prodigioso monarca supliciado juntamente com o seu augusto filho primogénito no Regicídio de 1 de Fevereiro de 1908.
Dr. Luís Vieira de Castro, in “D. Carlos I”, p. 287: «D. Carlos rejeitou desde o início do seu governo todas as sugestões ambíguas que pudessem vir a comprometer a Nação e propôs-se, sem detença, restaurar a amizade entre Portugal e Inglaterra. (…) D. Carlos viu restabelecidas as antigas relações com a Grã-Bretanha e ocupados, na sua maior parte, os territórios ultramarinos e conquistou, além disso, pelas suas qualidades pessoais, uma posição de verdadeiro prestígio na Europa do seu tempo, em cujo equilíbrio cooperou com talento e êxito.»
João Franco Castello-Branco, in Cartas D’El-Rei Dom Carlos I a João Franco Castello-Branco, Seu Último Presidente do Conselho, Lisboa, 1924: «Com uma instrução geral que o não deixava encontrar hóspede em qualquer assunto de conversação; conhecedor e possuidor de línguas, especialmente do francês e do inglês, por forma que delas se servia como de sua própria; dado ao gosto e cultura das Belas-Artes, em uma das quais, a Pintura, foi distintíssimo; habituado nos sports e, como atirador, excepcionalmente forte – reunia a tudo isso ser o homem mais bem-criado do seu País, dotado de um humor sempre igual, sem descair nunca na vulgaridade, nem deixar perceber de si, em qualquer circunstância, sinal de contrariedade, despeito ou irritação.»
Raul Brandão, in “Memórias”, 1.º Volume, Renascença Portuguesa, Porto, 1919, p. 289: «Porque foi, por exemplo, morto D. Carlos? (…) E no entanto já hoje se pode afirmar sem erro que D. Carlos não foi morto pelos seus defeitos, mas pelas suas qualidades. Respirou-se! Respirou-se! – o que não impede que, a cada ano que passa, esta figura cresça, a ponto de me parecer um dos maiores reis da sua dinastia. Já redobra de proporções e não se tira do horizonte da nossa consciência. (…) Não foram os seus defeitos que o mataram, foram as suas qualidades. Só o assassinaram quando ele tomou a sério o seu papel de reinar, e quando, João Franco, quis realizar dentro da monarquia o sonho de Portugal Maior. Foi esse o momento em que, talvez pela primeira vez na história, os monárquicos aplaudiram um crime que os deixava sem chefe, e se abriram de para em par as portas das prisões, congraçando-se todos os políticos sobre os corpos ainda mornos dos dois desventurados.»
Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão, in “As Farpas”, 1872: «… Nós temos por el-rei a mais sincera simpatia, e consagramos a sua majestade a rainha o respeito mais profundo. Se a nossa palavra não basta, e se a esta homenagem dos nossos sentimentos é preciso acrescentar o sacrifício das nossas vidas – tenham a bondade de as mandar buscar. Desculpem o incómodo que vão ter, mas enfim, por mais acrisolado que seja o nosso amor aos príncipes, não parecerá certamente estranho que tratando-se das nossas vidas – hesitemos um momento em as mandar pela posta!»; e «É El-Rei a única força que no País ainda vive e opera.»
Júlio de Sousa e Costa, republicano, “O Rei Dom Carlos I (1863/1908) in “Factos Inéditos do Seu Tempo, Lisboa, 1943, p.8: «Tratar do Rei D. Carlos I e dos casos do seu infeliz reinado tão cheio de amarguras, e deixar no silêncio os chefes das facções políticas, não faria sentido. Ao narrador sincero compete, dentro do quadro da maior correcção e imparcialidade, analisar e comentar factos em que tiveram responsabilidades Rei e Ministros, analisando, sem paixão, a sua mística governativa.
D. Carlos I teve culpas, e algumas muito graves, na verdade!... Todavia as maiores recaem sobre alguns dos seus Ministros que o aconselhavam muito mal, o que tornou possível o advento da República, em 1910. E tão infeliz foi o Monarca, que no próprio Paço Real foi traído por indivíduos que ele sentava à sua mesa…
Acabou por ser a primeira vítima dos “erros que de longe vinham”, como ele próprio escreveu na carta histórica, dirigida ao Conselheiro Hintze Ribeiro, datada de 16 de Maio do ano de 1906, erros que depois foram continuados».
Homem Cristo escreveu in “Monarchicos e Republicanos”, Porto, ed. Livraria Escolar Progrédior, 1928, p. 274: «Mas no meio dos seus defeitos foi o político mais inteligente do seu tempo e o único, de todos, que tinha carácter».
F.A. Oliveira Martins, “El-Rei D. Carlos I” in “Semana de Lisboa”, 1/1/1893: «Foi uma coroa de espinhos a que o moço rei teve para colocar sobre a cabeça, e nem o brio da juventude lhe permitiu um instante o gozo da vaidade, a que se chama fortuna. (…) E antes, depois e sempre, em todo o decurso deste já longo terramoto, cujo fim não vimos ainda, o moço rei, sozinho, desajudado de homens prestigiosos que lhe amparassem o trono, com partidos desconjunturados que na hora do perigo se demitem, confessando meritoriamente a sua impotência, ouvia estalar os tiros sediciosos do Porto e crescer a vozearia, confundindo os erros da sociedade com a responsabilidade da Coroa, esperando a salvação da queda da monarquia.
Como se, no jogo mais ou menos imperfeito das instituições vigentes, houvesse alguma espécie de tirania! Como se o homem, que ontem se sentou no trono, pudesse ser responsável pelos erros acumulados em dezenas, em centenas de anos! Como se a desesperança, a apatia, o abandono com que a sociedade portuguesa se submete à oligarquia das clientelas e cabalas que a exploram, fossem filhas da acção perniciosa da Coroa! Como se, pelo contrário, não pudesse o rei queixar-se de tantos que desertam o seu posto…»
Recolha por Miguel Villas-Boas
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