O genocídio dos cristãos no Médio Oriente requer uma resposta internacional.
A Igreja cristã copta é antiquíssima, porque nasce de uma cisão primitiva da Igreja católica, por razões doutrinárias que se prendem com o concílio de Calcedónia, no ano 451, e tem, curiosamente, um papa a presidi-la. Apesar de alguma expressão no médio Oriente, não tem dimensão, nem influência política capaz de fazer frente às pretensões hegemónicas dos grupos islamistas radicais, de que o Daash, no seguimento da Al Quaeda é, na actualidade, o mais temível expoente. Mas foi o alvo escolhido por aquela milícia fundamentalista que, aproveitando-se da guerra civil na Líbia e da existência, em simultâneo, de dois governos nacionais, já domina grandes zonas desse país. Não terá sido em vão que as imagens da decapitação, numa praia mediterrânea, dos 21 cristãos egípcios, foram filmadas na Líbia, precisamente para provar que a sua implantação neste país não é fictícia.
É verdade que esta guerra não é um enfrentamento entre religiões, mas é inegável o propósito do Daash em criar uma região internacional interdita a todos os crentes que o não sejam da sua fé islâmica, mesmo que se afirmem também devotos de Alá e do seu profeta. Os 21 egípcios, imolados no altar da intolerância religiosa e do fundamentalismo bárbaro dos seus assassinos, eram cristãos. Na declaração que acompanha as horríveis imagens desse múltiplo homicídio, percebem-se referências a Alá, mas também ameaças contra os cristãos em geral e, mais em particular, os católicos. Com efeito, o cabecilha dessa funesta expedição punitiva afirma o seu propósito de "conquistar Roma, com a bênção de Alá". Se são eles que o dizem, quem se atreveria a negá-lo?!
De facto, foi a fé cristã das vítimas desta chacina, em terras líbias, a razão principal da sua morte. Se morreram por ódio à religião cristã, como de facto consta, nada obsta que a igreja copta os considere como mártires da fé. Segundo o Avvenire, são perceptíveis, nas terríveis imagens que registaram o seu sacrifício, palavras de fé pronunciadas pelas vítimas, na iminência da sua morte violenta.
De algum modo, não só o Daash mas todas as forças políticas que apostam na expulsão dos cristãos radicados no Médio Oriente, são, talvez de forma encapotada, cúmplices do fundamentalismo islamita na sua cruzada contra a liberdade religiosa e os direitos humanos. Há que reconhecer, a todos os cidadãos e comunidades religiosas naturais da Ásia menor, o indeclinável direito à terra que é a sua pátria e à prática da religião, seja ela qual for, que professam. Esta tem sido a reiterada posição da Igreja católica que, sobretudo através do patriarcado latino de Jerusalém e da Ordem pontifícia do Santo Sepulcro, luta desesperadamente por defender a presença cristã e de outras minorias na Terra Santa, não obstante a hostilidade de sectores israelitas mais radicais e dos extremistas muçulmanos.
Portugal e a comunidade europeia, que felizmente reagiu com tanta determinação frente aos ataques em Paris, não podem cruzar os braços ante esta tragédia humanitária, que está a ocorrer às suas portas, no seu próprio mar. São as costas espanholas, francesas, italianas e gregas que as águas do Mediterrâneo banham, agora tingidas pelo sangue destes 21 mártires. É o nosso sangue que está a ser derramado e, por isso, é também nossa a dor deste terrível luto. Por desgraça, volta a ser verdade o triste vaticínio do poeta: "Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal!"
P. Gonçalo Portocarrero de Almada
Fonte: Povo
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