Chamamos-lhe Rainha e abraçamo-la como nossa. Nossa, da nossa cidade e do nosso povo, apesar dos milhões de devotos que tem por esse mundo fora. Sentimo-la no peito e transportamo-la no coração, como um bálsamo reconfortante nos momentos difíceis.
Isabel de Aragão não foi apenas uma simples rainha, foi a mais acarinhada das rainhas de Portugal. O legado de bondade e solidariedade que deixou perdura até hoje, numa mística que tem confortado geração após geração e que, indiferente ao tempo, continua bem viva, contagiando novos e mais velhos, como é evidente todos os anos pares, quando um “mar de gente” a espera nas ruas, saudando-a com emoção à sua passagem.
Neste ano de 2020, tão atípico e imprevisível, a Rainha e Santa não sairá à rua mas não deixará por isso de “embalar” todos aqueles que, nestes tempos incertos que o mundo vive, a ela rogarão a pedir ajuda. A força da sua mão, intacta, pairará com certeza sobre os milhares de fiéis que este ano não a acompanharão nas suas duas habituais procissões, envolvendo, aos fiéis e à cidade, num “abraço” invisível e especial, como especiais são os dias que se avizinham – os das Festas da Rainha Santa e da Cidade, a celebração maior da Padroeira da Coimbra.
Celebrações religiosas simbólicas, grandes procissões em 2021
Apesar de sem as grandiosas procissões, adiadas para o próximo ano, Santa Isabel não vai ser esquecida, tendo a Confraria da Rainha Santa Isabel preparado um programa simbólico para assinalar as festividades deste ano que, como recorda o presidente, Joaquim Costa e Nora, era “um ano de expectativas fortes”, uma vez que se celebram também em 2020 os 750 anos do nascimento de Isabel de Aragão. “Não há certeza se Isabel de Aragão nasceu em 1270 ou 1271. Há historiadores a referirem ambos os anos e a Confraria tencionava aproveitar esta circunstância para celebrar o seu nascimento nestes dois anos, em 2020 com as grandiosas procissões e as celebrações habituais e em 2021 era nossa intenção pedir autorização ao sr. Bispo de Coimbra, D. Virgílio Antunes, para que autorizasse a exposição da mão”, explica.
A Covid-19 surpreendeu o mundo e obrigou os países a adaptarem-se a uma nova realidade, que apela ao distanciamento social como a principal forma de conter a propagação do vírus. Assim sendo, a imagem da Rainha Santa Isabel não vai sair à rua este ano e vão ser também restritas as celebrações religiosas, que vão centrar-se, de 1 a 4 de Julho, na Igreja da Rainha Santa. Nos três primeiros dias, às 21h00, é celebrado o tríduo preparatório, tendo sido convidado o Arcebispo de Évora, D. Francisco Serra Coelho, para fazer esta pregação. O ponto alto das celebrações religiosas está marcado para 4 de julho, Dia da Cidade e da sua Padroeira, com a celebração de Eucaristias às 9h00, 11h00 e 17h00, seguindo-se depois a celebração das II Vésperas.
Costa e Nora explica que a Confraria ponderou várias possibilidades para manter o esplendor desta celebração e para permitir que, como tem defendido o Bispo de Coimbra, os fiéis possam regressar à Igreja. Assim, a missa das 11h00 vai ser celebrada na Igreja da Rainha Santa, onde será acautelado o distanciamento social. Este templo, que leva habitualmente 200 a 300 pessoas, deverá ficar restrito a cerca de 100. Mas, para permitir que mais pessoas possam assistir à cerimónia, vão ser colocados ecrãs em alguns locais, como no Coro Baixo e Claustros, onde serão disponibilizados bancos. Haverá também um ecrã no adro, podendo os fiéis levarem bancos ou assistirem à celebração da Eucaristia em pé. A questão da segurança, com a criação de “corredores de emergência”, está a ser acautelada em articulação com o INEM e com a Protecção Civil.
Mesmo mantendo-se a Eucaristia das 17h00, da responsabilidade da Real Ordem da Rainha Santa, este ano não contará com a presença dos Duques de Bragança, por questões prudenciais, esperando que estejam reunidas as condições para retomarem esta tradição no próximo ano.
Rainha Santa Isabel é amada em todo o país
Apesar da sua forte ligação a Coimbra e da profunda devoção que a cidade tem pela sua Padroeira, a Rainha Santa Isabel é venerada em todo o país e em vários pontos do mundo. Costa e Nora dá conta que têm sido muitos os contactos que têm chegado à Confraria, de todo o país, com o intuito de saberem se podem vir ao Mosteiro de Santa Clara-a-Nova. Recorda que, mesmo nos anos sem procissões, centenas de pessoas visitam este monumento por ocasião das Festas da Cidade e prestam homenagem à Rainha Santa. “Este ano temos que recomendar-lhes que não venham a Coimbra”, explica.
Santa Isabel foi – e continua a ser – muito amada pelos conimbricenses, sendo venerada por pessoas de todas as idades e estratos sociais. A cidade continua a retribuir-lhe o profundo amor que teve por Coimbra, com igual sentimento e muita devoção.
Costa e Nora recorda que este afecto não é exclusivo da Igreja, tendo havido sempre uma ligação forte com a cidade e com as autoridades eclesiásticas. “É indiscutível que Santa Isabel tinha um amor devocional muito grande a Coimbra, que sempre correspondeu a esse amor. A própria diocese, apesar de ter Santo Agostinho como padroeiro principal, manteve Santa Isabel como padroeira”, frisa. Recorda que a “devoção popular vem da própria cidade, tendo sido a vereação que fez dela Padroeira de Coimbra depois do terramoto de 1755”, atribuindo à “mão protectora” da sua Santa o facto de a cidade ter sido poupada daquele terramoto que devastou Lisboa.
Certo é que Santa Isabel ficou, indiscutivelmente, conhecida como uma das principais rainhas de Portugal. E para isso muito terá contribuído a sua forma de ser e de estar, o modo como se dedicava à família e lutava pela sua paz e a discrição com que ajudava o próximo. Para Costa e Nora, Santa Isabel “congrega em si dois grandes atributos” – por um lado “o profundo amor pelos pobres e a devoção e vontade de ajudar quem precisa” e, por outro, “a forma como fomentou a paz entre os seus próximos, tendo sido sempre uma pessoa apaziguadora”.
“Penso que estes dois atributos vão ao encontro daquilo que as pessoas anseiam, que é ter paz na sua vida e ajudar quem precisa. Há uma grande solidariedade em relação àqueles que precisam e essa foi uma das grandes mensagens que Santa Isabel nos deixou – a de ajudarmos o próximo, sendo certo que nem sempre a ajuda material é a mais importante”, alerta.
Procissões em 2021
Não há memória de um ano par em que não se tenham realizado as tradicionais procissões da Rainha Santa. Este ano será excepção mas, em tempos longínquos, já terá havido outras situações igualmente imprevistas e incontornáveis que terão motivado a sua não realização.
O presidente da Confraria da Rainha Santa admite que, apesar de terem sido analisadas todas as possibilidades, é impossível assegurar o distanciamento social no caso das procissões. Sendo este um dos momentos mais marcantes na cidade e um dos mais aguardados por tantos milhares de fiéis, ficou decidido o seu adiamento para 2021, medida que contou com a autorização do Bispo de Coimbra, Virgílio Antunes, e dos vários grupos que participam na sua realização e que será também discutida na próxima Assembleia da Confraria.
Este é um momento emblemático para a cidade, que se veste de “gala” para saudar a sua rainha. As colchas regressam às janelas, os estabelecimentos comerciais enfeitam-se e as ruas enchem-se de gente. Muitos são os devotos que, sentados nos seus banquinhos, esperam durante horas, em sítios estratégicos, pela chegada da Santa, num ambiente de profunda fé e muita emoção.
Andor pesa 1.000 quilos e transporta 3.000 rosas
A passagem do andor com a imagem da Rainha Santa é o momento mais aguardado pelos milhares de fiéis. Há, contudo, um grande trabalho de preparação antes, de forma a assegurar que tudo corra bem.
Há que acautelar, em primeiro lugar, as pessoas que vão transportar o andor. Com cerca de 1.000 quilos de peso, é preciso encontrar um grupo de pessoas fortes e idênticas em termos de altura. No total, são sempre 10, cinco de cada lado, havendo sempre dois grupos de 10 homens para cada procissão e sete suplentes, num total de 27 pessoas por procissão.
Ao peso normal da imagem há ainda a juntar o das cerca de 3.000 rosas que o enfeitam, bem como o das esponjas húmidas que permitem que, nestes dias quentes se mantenham sempre bonitas e “vivas”.
Em tempos idos, dizia-se que eram os talhantes que assumiam esta missão de transportar o andor. Costa e Nora, presidente da Confraria da Rainha Santa Isabel, diz que isso se deve “à sua robustez física”, já que eram “pessoas que estavam habituadas a fazer grandes esforços físicos”. Há muitos anos que já assim não é, tendo os Irmãos da Confraria assumido essa responsabilidade, todos eles por “profunda devoção” a Santa Isabel. Fazem, como explica Costa e Nora, “a preparação em ginásio” e são “pessoas de todas as idades, muitos deles rapazes novos”.
Exposição da mão em 2021?
Permitir que os fiéis pudessem venerar a mão, praticamente intacta, da Rainha Santa Isabel era um dos desejos da Confraria da Rainha Santa Isabel para o próximo ano. Previa realizar as grandes procissões neste ano de 2020 e expor a mão em 2021, prolongando assim durante estes dois anos as celebrações do 750.º aniversário do nascimento de Isabel de Aragão.
Costa e Nora espera que este momento repleto de simbolismo possa ocorrer ainda em 2021, dependendo da autorização do Bispo de Coimbra. “É uma questão que vamos colocar no final deste ano, início do próximo, porque até lá temos que ver como é que a pandemia vai evoluir, já que tanto a exposição como as procissões são actos que não se compadecem com o distanciamento social”, explica.
Recorde-se que a mão da Rainha Santa permanece praticamente intacta, decorridos perto de 700 anos após a sua morte. A exposição da mão ocorre apenas em ocasiões muito especiais, como sucedeu em 2016, por ocasião da celebração dos 500 anos da sua beatificação.
Fonte: Jornal O Despertar
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