“A tolerância e a apatia são as últimas virtudes de uma sociedade moribunda”.
Aristóteles (tutor de Alexandre “O Grande”)
A propósito das polémicas que medram nos tempos que correm, o cronista João Miguel Tavares (JMT) escreveu no “Público” do passado dia 20 de Fevereiro, um texto com o título “Em defesa de Mamadou Ba e João Pedro Caupers”, em que traça um paralelo entre os ataques que têm sido desferidos contra o “paraquedista da nacionalidade” Mamadou Ba e o actual Presidente do Tribunal Constitucional, Juiz Conselheiro João Caupers, face a declarações públicas por eles feitas e que designa por “opiniões”.
Dado o eco que os escritos do nosso cronista já atingiram no panorama mediático, e por entender ser merecedor de um comentário, vou sobre o escrito, alinhavar uma prosa.
Em síntese, JMT defende que, tanto Mamadou Ba ao ofender a memória de Marcelino da Mata, depois do seu paramento, está no seu pleno direito, pois se trata apenas de uma opinião – o que o torna o acto legítimo – criticando quem o quer expulsar do país, por isso; ao mesmo tempo que defende não haver razão para o Presidente do Tribunal Constitucional dever ser prejudicado por aquilo que disse sobre o “lobby gay” (no fundo que não está para os aturar…).
E disse ainda, que quando alguém afirma algo que possa incorrer no crime de difamação (isto é, afirmar algo que não seja verdade configurando uma ofensa) – que é claramente o caso das afirmações do senhor Ba, e não só, sobre o herói nacional Marcelino da Mata - deve ser julgado nos Tribunais.
Tudo cabendo afinal (por serem “opiniões e não actos”), no sacrossanto princípio da liberdade de expressão, devendo por isso, ser tolerado.
Mais um pouco, estaria a defender a libertação do anarca (?) catalão que há pouco foi condenado em Espanha por dizer barbaridades e fazer ataques soezes (à revelia da lei) o que desencadeou violentas manifestações em Barcelona, e não só…
Afinal há opiniões que degeneram em actos…
E não quero deixar passar em claro, que condeno a intenção do actual Primeiro - Ministro espanhol que, algo absurda e covardemente, veio defender a mudança da lei no sentido de que acções que levaram à condenação do cantor de intervenção, feitos no âmbito artístico deixassem de caber na moldura penal! Serão “os artistas” diferentes dos restantes cidadãos?
Ora a questão é que, nem tudo o que se diz, pode (deve) ser tolerado, nem na liberdade de expressão pode (deve) caber tudo. Pois nem tudo o que se diz é respeitável e não se pode (deve), ser tolerante com disparates inomináveis, ofensas da Moral, da Ética, da Verdade, do respeito por símbolos ou valores sagrados, etc. …
Para já não falar, no que toca ao princípio básico de que a minha liberdade acaba onde começa a liberdade do outro.
Pelos vistos, na perspectiva do JMT, não há diferença entre o Bem e o Mal, tudo é relativo e tudo se resume a opiniões…
Ora, quem emite uma opinião, pode revelar uma intenção.
Se o senhor Ba vier dizer (já se viu que tudo é possível), que se deve queimar a bandeira nacional, tal não é um acto, mas uma opinião, mas esta opinião estará tão longe assim do acto? E será que as opiniões não poderão incitar o ato? E tal afirmação, a haver – o que não deve estar longe – é tolerável?
A verborreia dos extremistas islâmicos na sua pregação a tudo aquilo que consideram infiel será admissível? Devemos tolerá-las? Combater tais ditos, com palavras ou ideias vai mudar alguma coisa?
Neste âmbito da tolerância também tem que haver reciprocidade. Por exemplo se alguém chamasse ao Ba de “besta - quadrada”, tal seria aceite como opinião, ou seria, prestes, rotulado de “racismo”? Ou se disserem que esta moda de adular os invertidos é inqualificável, tal vai logo ser apelidado de homofobismo?
Considera ainda JMT, que as atitudes de Ba como uma “distorção de uma luta justa”. Qual? A de inventar problemas onde não há? Por que é que não o manda pregar para a ilha de Goré? Sempre se entretinha com problemas da sua terra, porque da nossa, já vimos que ele jamais será. É certo que lhe deram o título de português, mas apenas “de jure” e unicamente, porque a legislação portuguesa sobre nacionalidade, por absolutamente inadequada, o permitiu (aquilo é mais um articulado roto, atentatório da dignidade portuguesa…).
Por isso a expulsão não faz sentido nem interessa (presumo que a petição, que visava expulsar o Ba, que aparentemente incomodou JMT, apenas teve a intenção de “chatear e protestar”). A única coisa, que pelos vistos, que pode resolver as enormidades discursivas de Ba – que pressurosamente muitos meios de comunicação social ampliam – é ele ter a fatalidade, de escorregar por uma escada abaixo, e partir alguns ossos do corpo, que incluam os maxilares. De um modo metafórico, já se vê…
Quanto a recorrer à justiça, como alude JMT, para obter reparações quanto a opiniões que sejam caluniosas, quem o fizer arrisca-se a esperar tanto tempo, que uma tal reparação não lhe seja útil; tem que ter uma soma considerável de dinheiro disponível para o fazer e ficar sujeito a todas as demais contingências da vida e dos homens, onde as ratoeiras dos formalismos não são partes despiciendas. Para já não falar das “subjectividades” de “avental”; do foro ideológico/partidário; ou de eventuais interesses económicos/financeiros, que maculam, continuadamente, a suposta independência entre os poderes judicial, executivo e legislativo.
Conheço até, um caso recente, em que um político proeminente de longa data, conseguiu uma avultada indemnização por ter movido um processo a quem supostamente o ofendeu (não por calúnia, mas por dizer a verdade), depois de ter perdido a causa, graças a um volte face de contornos menos claros, protagonizados por um magistrado, que passou a vida a fazer fretes (ou favores) às cúpulas de um partido político (por acaso o mesmo do queixoso), e pouco depois veio a ser Secretário de Estado. Neste caso, a liberdade de expressão e de opinião, não contou para nada…
Acresce ainda, para finalizar o ponto, que Marcelino da Mata (ou qualquer outro cidadão) só pode ser defendido em termo do crime de ofensa à memória de pessoa falecida, por descendentes seus, até a geração dos netos, no prazo de três anos, o que a partida encolhe muito a possibilidade de se fazer justiça.
A Comunicação Social dá entretanto, relevo aquilo que entende fazer na altura; não necessariamente, ao que deve. A censura é agora muito maior do que a tão propalada existente no “Estado Novo” - mas sobre isto raramente algum jornalista fala – embora quase todos rejeitem a sua existência. Trata-se, outrossim, e apenas, de “escolhas editoriais…
Está JMT admirado por haver gente “de esquerda” (?) a querer despedi-lo do jornal onde escreve? Olhe a mim, já me aconteceu e não foi só com pessoas de esquerda. E das intenções, passam amiúde aos actos. Até no Jornal em que escreve. Como vê, todos muito democráticos e tolerantes com opiniões alheias…
O mesmo se passando com quem concebeu as leis de proscrição e banimento a que aludiu (aqui há a acrescentar outras, tais como as expulsões dos jesuítas e a extinção das ordens religiosas, por exemplo) e cujos autores estão muito bem vistos hoje em dia, sendo que, curiosamente, quem está mal visto é o Professor Salazar, que num único parágrafo (Lei 2040, de 27 Maio de 1950) as revogou…
Pela minha parte, pode ficar descansado que estarei bem atento, aos três passos que Aristóteles fixou para a extinção de qualquer cultura: exagerada idealização da tolerância, instalação da apatia e desinteresse geral; perda da razão de existência e, por isso, não darei tréguas a bípedes como o Ba, ou a quem ataca o conselheiro Cauters, no âmbito citado. Conselheiro que está cheio de razão, mas que para mal dos seus pecados e seguramente, pela pressão já havida, começou a dar o dito, pelo não dito.
Descartes, como defende, não estava só enganado ao dizer que “o bom senso era a coisa mais bem distribuída do mundo”. É que a mais célebre das suas tiradas “penso, logo existo”, não pode ser lida ao contrário: “existo, logo penso”.
É a minha opinião.
João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador (Ref.)