segunda-feira, 10 de setembro de 2012
O Problema é outro
Cada vez que morre uma grande figura das letras e das artes, da história e da política — ou seja, alguém que num país pequeno como Portugal alcançou ser um humano único e exemplar — a quem por cá fica é automaticamente criada uma dívida de respeito e gratidão também póstuma que as mais das vezes nunca chega a ser paga como deveria.
Este é dos maiores problemas da nossa sociedade: o esquecimento, a ideia, verdadeiramente perigosa, de que tudo começa e acaba no limite do nosso horizonte pessoal ou do nosso século, sem que seja ponto de honra conhecer razoavelmente os altos e baixos, as glórias e as insânias da história pátria, no torrão e na diáspora, bem entendidos. O facto de ter sido dada larga primazia, nas últimas décadas, à criação em detrimento da conservação, pulverizou ainda mais a debilidade deste cenário identitário ancestral, que precisa de ser reinterpretado à luz de novos conceitos e de novas abordagens pois será sempre o húmus em que nascemos e nos erguemos.
Não há dúvida de que o trabalho de Rui Ramos veio abalar o registo historiográfico estabelecido, afinal um pastel de preconceitos e de mitificações politicamente vinculadas, e a clareza, ousadia e sucesso da sua releitura ofenderam todos aqueles que na universidade se julgavam consolidados por décadas de domínio marxista.
A birra de Manuel Loff (figura menor, que ninguém lembra o que terá feito), além de tardia e desajeitada, é só a ponta dum icebergue. A questão não é como Ramos considerou Salazar, mas como desmascarou Cunhal, não vos parece?
Numa crise destas, de que o económico-financeiro é apenas um espelho negro, o país precisa dum pacto patriótico com um rijo instinto de salvaguarda, que a esquerda, fixada no aqui e agora tudo, não consegue de interpretar devidamente, porque lhe falta o sentido nacional de uma comunidade muito antiga que não pode acabar. O que precisamos é de conversar e de criar uma base de entendimento em que todos «trabalham» para defender o país, como se vivéssemos um pós-guerra de que é preciso renascer. Temos ao lado a Espanha que nos dá um exemplo já secular disso mas nem sequer esse vemos. Vai ser duro, vai ser feroz, vai ser demorado, mas sem esse sentido nacional nada se alcançará. A esquerda que entenda isso, se puder!!
Uma coisa é certa, porém: não serão presidentes como Cavaco ou Marcelo (nem Soares ou Sampaio, nem Costa) que vão criar esse vínculo patriótico, que só o carisma da Coroa pode fermentar. Sejamos realistas, pois.
Vasco Rosa
Fonte: Real Associação de Lisboa
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