terça-feira, 20 de novembro de 2012

Não à Constituição, pela revolução




Há dois anos, preparando um dos capítulos da minha dissertação, ao consultar a tratadística birmanesa sobre cosmologia e filosofia do Estado e da política - sobretudo os textos de Maung Maung Tin, académico de envergadura intelectual agigantada - deparei com surpreendentes analogias entre o pensamento tradicional budista theravada e a teoria da história europeia pré-revolucionária. Para os budistas, o progresso não existe nem pode existir, dado haver uma ordem sócio-cósmica que se aplica à natureza e ao homem - daí a existência de conhecimento - e, como tal. inalterável. Os europeus têm, desde o século XVIII, exorbitado a importância das rupturas e das perturbações, tomando-as como nucleares. Ora, as perturbações são, sempre, conjunturais. No pensamento pré-moderno, as convulsões indicavam doença no organismo, pelo que exigiam reformas, o que quer dizer cura, recuperação do equilíbrio, retorno à normalidade.
 
Em Portugal, esse retorno (essa "revolução" / revolutio, acto de re-volver) chamava pelo nome de Regeneração. Foi em nome da Regeneração que os homens de 1640 sacudiram a monarquia dual, foi em nome da Regeneração que os vintistas exigiram no preâmbulo à Constituição de 1822 o restabelecimento das leis fundamentais da monarquia, foi em nome da Regeneração que Dom Miguel voltou de Viena para devolver aos portugueses a Lusitana antiga liberdade.
 
Depois, caiu sobre Portugal o progressismo. Há uma clara distinção entre ser-se progressivo e progressista. O progressivo exprime continuidade, ajustamento ao tempo, recuperação da vitalidade perdida. O progressismo, por seu turno, implica alienação, criação ex-nihilo (a partir do nada), perigo, ruptura, engenharia, experimentalismo. Onde antes, na monarquia, havia empirismo da Constituição histórica fundada em leis produzidas pela necessidade, passou a haver essa coisa programática, normativa, limitadora, imobilista e cronofóbica que dá pelo nome de Constituição (de 1822, de 1826, de 1838, de 1911, de 1933, de 1976).
 
Por alguma razão, o único país europeu que não tombou no progressismo - o Reino Unido, que não tem outra Constituição que a Constituição histórica - é o mais estável, adaptável e bem sucedido regime numa Europa assolada por revoluções, pela cultura da "indignação" e pela rabugice inconsequente. É tempo de, nós portugueses, voltarmos à tradição da revolução e das leis históricas. É tempo de voltarmos à monarquia.
 
Miguel Castelo-Branco
 
Fonte: Combustões

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