A 6 de Abril de 1385, D. João, Mestre de Aviz é Alçado e AclamadoRei nas Cortes de Coimbra.
Falecido D. Fernando I de Portugal, iniciou-se a Crise de 1383-85, pois os filhos varões do Rei D. Fernando, o Belo, com D. Leonor Telles de Menezes, Pedro e Afonso haviam morrido respectivamente nos anos de nascença: 1380 e 1386; e D. Beatriz (1372 – 1410), Infanta de Portugal, havia casado com D. João I, Rei de Castela, pelo que, sob pena de anexação de Portugal pelo Reino de Leão e Castela, a fidalguia portuguesa pretendia mantê-la afastada da sucessão. E era fortíssima a ameaça da união – que soava a integração – de Portugal com Castela e Leão, resultado do Tratado de Salvaterra de Magos, de 1383.
Quase ninguém pretendia essa anexação, e a saída era D. João, Mestre de Avis, irmão do falecido rei, uma vez que era filho ilegítimo de D. Pedro I com Teresa Lourenço (1330).
Também, a burguesia mostrava-se desagradada com a regência da Rainha D. Leonor Telles de Menezes e do seu amante, o Conde D’Andeiro e com a ordem da sucessão, uma vez que isso significaria anexação de Portugal por Castela, pelo que a escritura matrimonial provocou levantamentos populares em Lisboa, Santarém, Elvas, onde por exemplo às palavras do Alcaide Álvaro Pereira: “Arraial, arraial, pela rainha D. Beatriz”, Gil Fernandes à frente de toda a Elvas, o prendeu gritando “Arraial, arraial, por Portugal”. Em Lisboa o chanceler-mor de D. Pedro I e D. Fernando, Álvaro Paes, fez soar pela cidade de Lisboa que matavam D. João, Mestre de Avis:“Acorram ao Mestre, amigos! Acorramos ao Mestre, que o matam sem porquê!” e as hostes populares interrogavam-se sobre “quem matou o Mestre?”, outros respondiam-lhes “que o matava o Conde João Fernandes, por mandado da Rainha [D. Leonor Telles]”.
Após a morte de Andeiro, no Mosteiro de São Domingos o povo miúdo aclama o Mestre de Avis como Regedor e Defensor dos reinos e na Câmara de Lisboa outorgaram aquela decisão da arraia-miúda e até a burguesia indecisa aderiu ao partido do Mestre. Dois dos filhos de D. Inês de Castro e do rei D. Pedro I, D. João e D. Dinis, uma vez que haviam sido legitimado com a revelação do casamento em segredo entre os pais, e a ulterior proclamação de D. Inês como rainha de Portugal, coadjuvado pelos seus tios Álvaro (Conde de Arraiolos e de Viana da Foz do Lima) e Fernando, manteve também aspiração ao trono, mas nunca reuniram apoios suficientes. Depois do outorgamento, D. João, Mestre de Avis, formou o seu Conselho do qual fizeram parte: João das Regras (Chanceler-mor), D. Lourenço (Cardeal-Patriarca de Lisboa), o arcebispo de Braga D. Martim Afonso, Lourenço Estevens, o Moço, João Gil e Martins da Maia e ordenou ainda a formação da Casa dos 24. Em dois dias chegou D. Nuno Álvares Pereira, a Lisboa, e logo foi fazer penhor da sua lealdade e apoio ao Mestre de Avis. De acordo com a Crónica d’El-Rei D. João I, Capítulo XXXVIII, Portugália Editora, Lisboa, 1969, D. Nuno ter-lhe-á dito:
“- Senhor, grandes dias há que eu muito desejei e desejo de vos servir, e não foi minha ventura de o até este tempo o poder fazer. E porque ora vós sois em tal ponto e estado que cuido poderei cobrar o que tanto desejava, eu vos ofereço mim e meu prove serviço com mui boa vontade; e vos peço por mercê que daqui em diante me hajais por todo vosso quite servindo-vos de mim em todas as cousas, como de homem que pêra elo serei mui prestes”.
O mestre aceitou a sua lealdade e agradeceu-lhe o préstimo em o servir e à sua causa. Tornou-o um dos seus homens de confiança pelo que o fez membro do seu Conselho, como já tinha feito os acima indicados. Assim, a base de apoio do Mestre não era essencialmente popular, porque apenas uma parte da alta e média nobreza apoiava o partido de Castela, os que intitulavam, jocosamente, o Mestre de “o Messias de Lisboa”. O povo, esse, revoltou-se e tomou os castelos à fidalguia pró-Castela, que se pôs em fuga para as vilas afectas a Castela.
Perante a revolta da população portuguesa em vários pontos e cidades do Reino de Portugal, quem não gostou de ver a mulher e consequentemente a si próprio, preteridos, foi o Rei de Leão e Castela que decidiu invadir Portugal. Assim, o Rei de Castela, em 1384, decide entrar em Portugal. Entre Fevereiro e Outubro deste ano montou um cerco a Lisboa, por terra e por mar. Uma frota portuguesa vinda do Porto enfrentou, a 18 de Julho de 1384, à entrada de Lisboa, a frota castelhana, na batalha do Tejo. Os portugueses perderam três naus e sofreram vários prisioneiros e mortos, no entanto, a frota portuguesa conseguiu furar a frota castelhana, que era muito superior, e descarregar no porto de Lisboa os mantimentos que trazia. Esta ajuda alimentar veio-se a revelar muito importante para a população que defendia Lisboa. O cerco de Lisboa pelas tropas castelhanas acabou por não resultar, devido à determinação das forças portuguesas em resistir ao cerco, ao facto de Lisboa estar bem fortificada e defendida, ao auxílio dos alimentos transportados do Porto e também por causa da epidemia de peste negra que devastou as forças castelhanas estacionadas no exterior das muralhas. D. João I de Castela decidiu então enviar uma flotilha que cercou Lisboa, mas que sofreu tal-qualmente a carestia de bens alimentares, estratégia com a qual pretendia vencer os nacionalistas portugueses. Chegavam a morrer aos 150 castelhanos por dia até que o rei de Castela, instigado pelos seus conselheiros fez a frota retornar a Castela.
Mas houve ainda lugar a batalha em terra e, aí, coube a D. Nuno comandar o exército português e foi por esta altura que D. Nuno Álvares Pereira realizou a sua famosa expedição pelo Alentejo acompanhado de 40 dos melhores escudeiros da altura, e foi engrossando as fileiras com a boa gente dessa região, até que chegou a Atoleiros, a meia légua da fronteira com Castela, que se preparava para acometer. Aí D. Nuno começou por inovar: foi nos Atoleiros que pela primeira vez se combateu a pé em Portugal, e D. Nuno utilizou a famosa técnica da formação do exército em quadrado: distribuiu os seus homens armados e os besteiros pelas alas e o povo no meio. Os castelhanos ao verem os portugueses apeados, e para mais em minoria, acharam que ia ser fácil vencê-los pelo que se lançaram a cavalo sobre o exército lusitano aos gritos de “Castyla! Sant’iago!” ao que os portugueses responderam berrando “Portugal! São Jorge!” e D. Nuno ordenou aos seus soldados que como ele fizessem uma genuflexão com o joelho direito no chão e a outra perna a fazer finca-pé e depois levantar as lanças num ângulo agudo, apoia-las no chão e os cavalos castelhanos se foram espetar nelas. Os Castelhanos feridos e no chão eram então bombardeados por dardos e virotões, e cercados por todos os lados pelos portugueses o que impedia que os primeiros escapassem. Assim os portugueses saíram vitoriosos sobre os castelhanos, na Batalha dos Atoleiros, em 1384. D. Nuno Álvares Pereira foi então nomeado o 2.º Condestável de Portugal – título criado após o fim do Império Romano com a grafia latina deComes stabilis que substituiu o imperium proconsulare maius e o ulterior Dux -, honra com que foi agraciado por D. João, Mestre de Avis, e ainda recompensado com o título de 3.º Conde de Ourém.
Foi então hora de reunir as Cortes em Coimbra, onde, finalmente, após longo debate, ‘esto determinado de todo, e o dia que o alçassem por rei’ e a 06 de Abril de 1385, D. João seria elevado a Rei pelas Cortes. Este ritual de elevação a Rei chamava-se, inicialmente,Alçamento ou Alevantamento, pois os Três Estados ‘alevantavam’ o Rei entronizado. Depois passou a chamar-se Aclamação, pois no caso particular de Portugal, e sempre tal aconteceu desde o próprio Rei Fundador Dom Afonso Henriques, o Rei é Aclamado e nunca imposto! Ou seja, mesmo quando um Príncipe herdeiro sucede ao Rei falecido existe uma participação dos Barões e do Povo do Reino que ratifica essa sucessão sendo que esse passo é o acto jurídico que verdadeiramente faz o Novo Rei. Nos 771 anos da Monarquia Portuguesa o Rei sempre reinou por delegação da comunidade portuguesa, que reunida em Cortes que o Aclama e faz Rex Portucalensis.
Dom João I foi Alçado Rei mas, também, Aclamado, até porque não se tratava de uma sucessão hereditária, mas de uma eleição por Cortes e iniciava-se ali uma nova Dinastia, a de Aviz.
Também, diante das Cortes o novo Rei jurou manter, respeitar, e fazer cumprir os tradicionais foros, liberdades e garantias dos Portugueses, violados pelo seu antecessor estrangeiro, diante dos Três Estados: Nobreza, Clero e Povo de Portugal.
Miguel Villas-Boas
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