quinta-feira, 28 de julho de 2022

A Missa e os nativos do Brasil

 


E hoje que é Sexta-Feira, primeiro dia de Maio, pela manhã, saímos em terra com nossa bandeira; e fomos desembarcar acima do rio, contra o sul onde nos pareceu que seria melhor arvorar a cruz, para melhor ser vista. 

Ali disse Missa o padre frei Henrique, a qual foi cantada e oficiada por esses já ditos. Ali estiveram connosco, a ela, perto de cinquenta ou sessenta deles [índios], assentados todos de joelhos assim como nós. E quando se veio ao Evangelho, que nos erguemos todos em pé, com as mãos levantadas, eles se levantaram connosco, e alçaram as mãos, estando assim até se chegar ao fim; e então tornaram-se a assentar, como nós. 

E quando levantaram a Deus, que nos pusemos de joelhos, eles se puseram assim como nós estávamos, com as mãos levantadas, e em tal maneira sossegados que certifico a Vossa Alteza que nos fez muita devoção. Estiveram assim connosco até acabada a comunhão; e depois da comunhão, comungaram esses religiosos e sacerdotes; e o Capitão com alguns de nós outros. E alguns deles, por o Sol ser grande, levantaram-se enquanto estávamos comungando, e outros estiveram e ficaram. 

Um deles, homem de cinquenta ou cinquenta e cinco anos, se conservou ali com aqueles que ficaram. Esse, enquanto assim estávamos, juntava aqueles que ali tinham ficado, e ainda chamava outros. E andando assim entre eles, falando-lhes, acenou com o dedo para o altar, e depois mostrou com o dedo para o céu, como se lhes dissesse alguma coisa de bem; e nós assim o tomamos!

Pêro Vaz de Caminha, escrivão da armada de Pedro Álvares Cabral, em carta escrita a El-Rei D.Manuel


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