terça-feira, 2 de agosto de 2022

A evidência racional do sobrenatural

 


É por motivos racionais, embora não seja por razões simples, que adiro ao cristianismo. Consistem esses motivos numa acumulação de factos diversos, que é também aquilo que justifica a atitude do agnóstico comum. Acontece, porém, que o agnóstico percebeu tudo mal. Ele é descrente por uma série de razões - todas elas falsas. 

Ele duvida porque a Idade Média foi uma idade bárbara, quando a verdade é que não foi; porque o darwinismo está provado, quando a verdade é que não está; porque não há milagres, quando a verdade é que há; porque os monges eram preguiçosos, quando a verdade é que eram diligentes; porque as freiras são infelizes, quando a verdade é que são particularmente alegres; porque a arte cristã era triste e apagada, quando a verdade é que era feita de cores berrantes e recoberta a ouro.

Contudo, no meio destes milhões de factos, todos orientados para o mesmo ponto, há naturalmente uma questão que se coloca, uma questão suficientemente sólida e distinta para ser tratada de forma breve, mas independente; refiro-me à ocorrência objectiva do sobrenatural. Dispomos de uma quantidade imensa de testemunhos humanos a favor do sobrenatural. 

Se as pessoas os rejeitam, só pode ser por uma de duas razões: rejeitam a história que o camponês conta acerca do fantasma, ou porque o homem é um camponês, ou porque se trata de uma história de fantasmas; isto é, ou negam o princípio de base da democracia, ou afirmam o princípio de base do materialismo, que consiste na impossibilidade abstracta de haver milagres. Têm todo o direito de o fazer; mas, em ambos os casos, essas pessoas é que estão a ser dogmáticas. Nós, os cristãos, aceitamos os indícios de facto; os racionalistas é que se recusam a aceitar as provas, e são constrangidos a fazê-lo em virtude do credo que professam. 

Por mim, não estou constrangido por credo algum relativo a esta matéria; de maneira que, analisando de forma imparcial determinados milagres dos tempos medievais e modernos, cheguei à conclusão de que eles de facto de se deram. Todos os argumentos contra estes factos são circulares. 

Se eu disser: "Os documentos medievais atestam determinados milagres como atestam determinadas batalhas", respondem-me: "É que os medievais eram supersticiosos"; mas, se eu quiser saber em que medida é que eles eram supersticiosos, a resposta será, em última análise, que o eram porque acreditavam em milagres. Se eu disser: "Um camponês viu um fantasma", respondem-me: "É que os camponeses são muito crédulos"; mas, se eu perguntar: "Mas porque é que eles são crédulos?", a única resposta que recebo é: "Porque vêem fantasmas." 

G.K. Chesterton in Orthodoxia


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