quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Taberna Lusitana

A Taberna Lusitana é um lugar de encontro e cavaqueira do Povo português. Aqui, as conversas são sentidas e não há “papas na língua”, pois quem lá vai é gente simples, com uma raiz profunda na terra onde nasceu e sentimentos fortes que nenhuma mensagem estrangeirada ainda conseguiu abalar.
Naquele dia entrou um senhor respeitável, bem vestido, de fato cinzento escuro e com um avental.
Logo todo o povo que enchia a Taberna, reparou nele, pois não era cliente habitual.

O sr. do Avental, dirigiu-se ao balcão e perguntou decididamente ao dono da Taberna, o Zé da Tasca…dizem-me que andam para aí, nesta Taberna umas ideias a pairar no ar, de que o Povo, tem intenção de Não Votar, nas próximas eleições presidenciais.

Zé da Tasca: Já para aí ouvi umas conversas dessas, sim senhor. Mas desculpe-me lá a interrogação…o que é que o sr. tem a ver com isso? São conversas do Povo e o Povo também tem direito a pensar.

Sr. do Avental: Sem dúvida que sim. Tem todo o direito de pensar e de agir, mas deve estar bem informado.

Taberneiro: Há então o senhor vem cá para nos informar !!! Seja bem-vindo, porque aqui a malta gosta muito de estar bem informada. Sabe a gente vê muita televisão e até lê jornais e cada vez está mais confusa com tudo isto.

Sr. do Avental: Ora é isso mesmo, se estão confusos, eu estou aqui para ajudar…e nunca se esqueçam que o voto é a arma do povo.

Lá de uma mesa do fundo, ouviu-se a voz do Zé Indignado…
A gente tem ido sempre nessa lenga lenga, mas somos sempre enganados. Agora vai haver eleições para Presidente da República…a gente sabe que o Homem na manda nada…porque raio havemos de votar…são todos a mesma coisa…na nos conhecem, na querem saber da gente p’ra nada, quem manda são os partidos e esses só olham p’ro seu umbigo.

Sr. do Avental: Bom, vamos por partes, a ver se nos entendemos. Agora estamos a falar de eleições presidenciais e não de partidos. O que temos de escolher é um Presidente da República, que está acima dos partidos e tem de ser independente e autónomo dos partidos.

O Zé Politizado: Devia, mas nunca é, nem sequer pode ser. São os partidos que o propõem, são os partidos que o dominam. Veja lá o que se passa agora…o Presidente quer ser eleito, precisa dos votos do partido de Governo e só por isso o mantém…quem se lixa?

Sr. do Avental: Mas ninguém diz que é este Presidente que vai ser eleito…é por isso que o Voto é importante, têm muito por onde escolher, vários candidatos, a democracia é isto, a liberdade de escolher.

O Zé Patriota: Não me diga que está a propor q’a gente vote no Poeta? Olhe que eu estive na guerra colonial e sei bem o que ouvi desse senhor quando era locutor da rádio Argel. Sinto vergonha de ter no meu país um candidato desse calibre.

Sr. do Avental: Não, não estou a propor o voto em ninguém em particular, apenas a tentar explicar que o importante é o cumprimento do dever de votar
.
O Zé Real: Para mim Não Votar, também é um dever, ou vocemecê não me dá esse direito.

Sr. do Avental: Sim votar é um dever de cidadão, participar na escolha do nosso Chefe de Estado.
O Zé Real: Olhe lá ó sr. da cidade, cá nós na somos cidadãos, somos desta aldeia e o senhor é que veio lá da cidade, até cá falar ca gente. Essa coisa de ser cidadão, tem muito que se lhe diga…aqui é melhor na falar disso. Cá eu penso assim…vivemos num país sem Rei nem Roque…o que precisamos é dum Rei que nos una e nos motive, já que nesta Republica nem o Presidente manda e só obedece, mais vale dizer Não e Não Votar em nenhum.

Sr. do Avental: Dever de cidadania é uma expressão, que quer dizer que cada um de nós tem o dever e o direito de escolher os nossos representantes. O que ganha você em não votar?

O Zé da Mercearia: Cá eu votei e fui votando e nunca escolhi. Muito menos a invasão chinesa e dos supermercados, que me levou à falência.

O Zé dos Anzois: E eu também, para me retirarem o peixe e entregarem aos espanhóis.

O Zé Fazendeiro: Pois e a mim impuseram-me cotas de produção e pagam para não produzir…para venderem cá, o que os outros produzem.

O Zé Viajante: Mas temos excelentes auto-estradas, um pouco caras é verdade, cada vez menos utilizadas é verdade, mas onde alguns podem circular com o ultimo modelo topo de gama alemão, pagando a gasolina muito cara mas muito boa e imposto de circulação que a maioria não pode utilizar.

O Zé Politizado: Não Votar é um direito, igual ao de Votar. Democracia é o respeito das minorias pela vontade da maioria…se uma maioria Não votar, é porque Não quer isto e é isto é que é democracia.

Sr. do Avental: Mas não é isso que está na Lei e na Constituição. Será sempre eleito aquele que nas eleições presidenciais, obtiver a maioria dos votos válidos.

O Zé Indignado: Pois é, isso só prova que a Lei d’agora na respeita a democracia…Leis há muitas e podem ser mudadas, mas todas têm de ser legítimas e se a maioria do povo não as quiser elas na são legítimas.

Sr. do Avental: Então o sr, está a dizer que a actual Constituição não é legítima, quando foi votada pela esmagadora maioria dos representantes do povo português?

O Zé Indignado: Estou sim senhor, nem a Constituição, nem a Adesão à Europa, nem o Euro, nem este ultimo tratado de Lisboa, que quer roubar o direito do povo mandar no seu próprio país. Tiveram sempre medo do povo e nunca o deixaram dizer o que pensa. Pensam que somos uma carneirada, que p’ra qui anda. Mas estão bem enganados…porque a gente aqui nesta Taberna, conversa e pensa.

Sr. do Avental: Mais uma vez temos de ir por partes. Primeiro, vivemos numa Republica e temos de escolher o seu Presidente, é um facto.

O Zé Revoltado: Não na vivemos em Republica nenhuma…vivemos numa ditadura de partidos…só dois partidos é que têm o poder de escolher…a nós, só é dado o direito de validar essas escolhas. A Republica, que o senhor bem-falante nos fala, não existe…quem escolhe é quem tem o domínio total…imprensa, dinheiro, influencia, poder…somos todos uns “mandaretes“ nas mãos do compadrio, de políticos corruptos, empresários e banqueiros oportunistas, que nos domina. É nisto que o sr. quer que vamos votar? Votar em quem nos iludiu e condenou?

Sr. do Avental: Então teremos de Votar na Mudança das coisas e com isso lutar pela democracia.

Zé Sabedoria: Ora aí está. Defendamos então como deve ser a democracia. O que temos para nos servirem à mesa, são os restos do banquete de uma elite miserável e desrespeitadora de um nobre povo. Votar em quem nos quer impor uma solução desta natureza, é apenas e somente mater a distribuição das mordomias e a condenação à pobreza. Não Votar é pelo menos uma atitude consistente do povo dizer Basta, queremos e exigimos a Mudança. É tanto assim que o ilustre senhor do Avental, finalmente ao ouvir esta mensagem se dignou em visitar-nos…para nos informar. Há 35 anos também tivemos a visita de uns senhores da tropa, cabeludos e mal fardados, que nos quiseram fazer uma Campanha de Informação, a que chamaram de Dinamização Cultural… ouvimos com atenção e tiramos de imediato a nossa conclusão, e…mandamo-los embora.

Depois desta intervenção, o sr. do Avental desculpou-se com afazeres urgentes e despediu-se de todos, saindo da Taberna. Pelo caminho até ao Mercedes, onde o aguardava o Motorista bem fardado, foi meditando…este povo ainda está muito atrasado, temos de incentivar uma campanha pois a que temos feito tem sido manifestamente insuficiente.

Na Taberna o Zé da Tasca disse em voz alta…Não bebeu e Não Pagou.

Em uníssono os outros…que volte sempre, pois o Povo precisa de Informação e Viva o Vinho Carrascão.
…a alegria e descontracção voltou à Taberna Lusitana.

José J. Lima Monteiro Andrade

Fonte: Desafio de Mudança

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