segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

O JOGO ‘DEMOCRÁTICO ‘

Como sempre vêm a lume as críticas e notícias picantes sobre as listas de candidatos pelos partidos, onde a escolha recai, não na bondade e competência, mas nos que sobressaem na bajulação do chefe do partido.


Perante este argumento, a resposta desses chefes é quase sempre a mesma, que quem escolhe é um conselho, aparentemente independente do chefe, mas que curiosamente resulta invariavelmente da sua eleição.

Se tivermos em conta que este Conselho é fruto da votação de uns escassos milhares de militantes, depressa se conclui que a escolha dos futuros representantes do povo, está à partida inquinada e à mercê do absolutismo da direcção do partido.

Assim, quando passamos para o nível seguinte do jogo democrático, denominado de sufrágio universal, o tutorial anuncia que o povo vai escolher os seus representantes, vai ter voz, vai decidir, que o voto é um acto de cidadania… mas só os mais distraídos, ou viciados no jogo, conseguem acreditar nos poucos argumentos apresentados.

Na realidade, de democrático só tem o nome, pois se a democracia é na sua génese uma forma de governo, ao transformar-se em fundamento de governo, passou a aceitar e a justificar todas as suas formas. A mais feroz ditadura, ou a oligarquia que nos governa, são democráticas, isto se respeitarem os princípios do sistema: - Uma constituição, um estado, os seus três poderes, o incontornável “sufrágio universal”…

Um dos momentos mais animados do jogo é a campanha eleitoral. Os partidos de esquerda e direita acusam-se e insultam-se, num cómico corrupio a que Juan de Prada compara, numa feliz frase, a dois bêbados que andam à pancada à saída do bordel, tentando um convencer o outro que dormiu primeiro com a meretriz. E tal corresponde à pura realidade, se os progressistas querem mudar as cores de fundo para o jogo parecer mais bonito, os conservadores respondem que não, como estão já são suficientemente lindas…

Já depois do sufrágio universal, há a vertigem da noite eleitoral onde se conhecerão os ganhadores, quem chorou mais ou menos, quem ia mais bonito no desfile fotográfico da “hollywoodesca” passadeira vermelha da noite eleitoral.

Os níveis seguintes passam a ser entediantes, pois o jogo entra em modo automático e é necessário esperar uns anos, para voltar a sentir a ansiedade do divertimento deste viciado jogo e cair exactamente no mesmo modo automático de sempre. Talvez por isso haja cada vez mais gente a deixar de jogar, mas esse não é o único motivo.

Se notarmos bem, as propostas que irão ser apresentadas pouco dizem aos eleitores. Andarão à volta do eterno combate ao desemprego, aumento de salários, aumento das pensões, crescimento económico, salvação do SNS, mais e melhor educação, mais ou menos deputados e o incontornável ambiente.

Na verdade, elas constam na estratosfera do inatingível para o simples e mortal eleitor, que preferia saber quando o hospital a que recorre, pequena peça no monstro que é o SNS, terá as condições necessárias a um célere e bom atendimento. Mas tal é impossível, pois o centralismo do Estado é tão esmagador, que ninguém se atreve a dizer quando, como, ou se ocorrerá. São contudo factos que transformam qualquer voto neste sistema, em algo inorgânico, pois é incapaz de responder em concreto a uma necessidade pontual e cruamente objectiva sentida por um comunidade real.

Outro aspecto interessante prende-se com a Soberania. A empresa implantadora do jogo, a revolução & cia., tem algo excitante nas regras, a Soberania pertence aos jogadores e cada vez que jogam, depois de uma montanha de anúncios, podem exercem esse poder fantástico, carregando no botão virtual do raiozinho, de quatro em quatro anos. Mais tarde ou mais cedo a esmagadora maioria percebe que no fundo o botão para nada serve, pois na verdade essa supremacia relativa está na mão dos partidos, que a usam a seu bel-prazer, não para governarem bem, mas para garantirem o seu quinhão nas próximas eleições.

Devemos por isso ir a jogo? Obviamente não.

Uma das formas de um jogo desaparecer é cair em desuso, por puro desinteresse dos potenciais jogadores, até porque há realidades bem mais interessantes.

Deus, Pátria, Foros e Rei

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