sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

O Ideal da Cavalaria e a Necessidade de ser Monárquico

 


Entre as recordações mais vivas que tenho da infância, a sala do meu tio bisavô José é uma das mais recorrentes. O fascínio não era dedicado à sala em si, mas a duas pequenas e curiosas esculturas de ferro colocadas em cima da mesa, duas figuras de cavaleiros medievais, em posição de ataque, como se se confrontassem numa justa. A alma da casa e do seu velho dono revolviam no mesmo espírito desta cena – as imagens, tal como o meu tio bisavô, enchiam a casa de uma dureza, de um rigor frio e velho, uma espécie de inverno branco que, em conjunto com a luz que entrava pelos cortinados da janela, enchem-me as recordações daqueles dias com uma cor que cega.

Os corredores gelados da casa velha, especialmente para a mente de uma criança, criaram em mim uma impressão muito forte, que acompanhou na pele os ensinamentos que a minha família, os meus pais, tios e avós, partilharam comigo. 

Lições de dever, de coragem, de generosidade, de caridade.

Levei comigo essas palavras e agucei as minhas conclusões ao longo dos anos. Questionei durante muito tempo os valores familiares. Um deles, o mais pitoresco, a tradição monárquica, foi talvez o que mais abalos sofreu. 

Enfrentei a dúvida que tantos jovens monárquicos enfrentam: porque razão nos devemos bater por uma ideia que mais não é do que uma afirmação estética, uma diferenciação social que, para os que não sofrem do pedantismo snob da suposta velha aristocracia, é mais prejudicial do que proveitoso?

A verdade é que a Monarquia não é palco para as vaidades da consanguinidade de sangue azul. A Monarquia não é também, ao contrário de tantos cientista políticos, um “atenuador” das lutas partidárias das democracias modernas. Isto não são monarquias, são “situações”.

A Monarquia é a conclusão do Pensamento, é a Árvore, e a flor desta Árvore é o ideal da Cavalaria.

Ao promover a lealdade a uma dinastia que se confunde com os destinos da comunidade nacional, em vez de deixar a mesma comunidade entregue aos jogos políticos dos partidos e dos seus barões, a Monarquia controla a paixão pelo poder dos poderosos. Mas fá-lo porque substitui essa paixão pelo amor ao serviço da Pátria, pelo amor aos feitos corajosos, pelo amor aos mais fracos e desprotegidos.

Numa coisa os snobs hemofílicos da falsa aristocracia têm razão: a Monarquia enobrece. Mas a Monarquia não enobrece os inúteis e os pedantes, os covardes e irresponsáveis, os que assumem as benesses da sua casta como direitos adquiridos. A monarquia enobrece os que vivem à lei da nobreza. A decadência de uma monarquia é fácil de identificar: quando é a aristocracia do dinheiro, e não a aristocracia da virtude, quem domina, os dias dessa monarquia estão contados. No mínimo, fica votada a bibelot decorativo. 

Sem nobreza não há virtude, sem virtude não há monarquia. Que ideia de nobreza será esta?

O ideal da nobreza merece ser aperfeiçoado. A nobreza não depende de um canudo universitário ou de um salário milionário – encontra-se em todas as camadas sociais, pertence a todos os grupos profissionais e a todas as actividades que garantem o bem comum na sociedade portuguesa. Encontra-se no estudante que luta por uma bolsa ou por conseguir o dinheiro das propinas, no empregado fabril ameaçado pelo fecho da sua fábrica, no desempregado que todos os dias navega anúncios atrás de anúncios de emprego na Internet.

Quando tantos e tantos destes homens e mulheres, na sua luta diária, encontram tempo e disponibilidade para dar de si aos outros, é que nos apercebemos que o ideal de cavalaria, aquela dura rigidez do dever, naquela alma de ferro que se demonstra nos mais calorosos actos de amor, de facto existe, mais forte do que nunca, somente à espera de alguém ou algo que lhe dê significado. Esse alguém é, sem dúvida, a monarquia e esse algo é a necessidade de ser monárquico.


Manuel Rezende


Fonte: Notícias Viriato

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